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Bolsonaro testa pose de perseguido para a eleição; ser vítima não colou
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Posar na foto como vítima, em cama de hospital, para mobilizar o público, não funcionou para o ex-capitão. O pré-candidato à reeleição troca o figurino e agora treina o discurso da campanha eleitoral, se apresentando como perseguido, potencial alvo de adversários violentos que tentarão destruí-lo. Quer ser visto como um mártir em autoimolação pela pátria. Uma fantasia de ocasião.
O camarão fez a parte dele quando foi engolido às pressas nas férias de Santa Catarina, entre passeios de jet ski e no parque de diversões. A natureza também fez o que cabia a ela, e os médicos contribuíram para a felizmente rápida recuperação. Portanto, não houve tempo para muita comiseração, já que a foto dele deitado na cama, com sonda nasogástrica, teve pouco tempo para comover.
A desconfiança paranoica, ao gosto do eleitor desavisado de 2018, para quem a facada sofrida foi um atentado político, feito por "esquerdistas", se repete agora, com investigações reabertas na Polícia Federal, em busca de reforço à tese, para que se mantenha a fantasia do mito ameaçado. Uma esperança para aumentar a mobilização nas redes sociais e polarizar o debate.
A lembrança da cena da facada, que apresentou o ex-capitão aos olhos dos incautos como uma vítima de conspiração política, vai se tornando o mais importante argumento da campanha eleitoral, carente de realizações de governo e abundante em promessas - felizmente, muitas delas não atendidas. A lembrança do acontecimento - por si só lamentável - é a busca de reedição de uma posição de herói que luta contra tudo e contra todos e se vê atacado pelas forças do mal, que não querem ver o fim da corrupção e querem a destruição dos valores da família, da pátria...
A investigação sobre Adélio Bispo e os motivos e condições que levaram ao ataque serve para manter acesa a chama da conversa sobre o comportamento irracional de adversários do ex-capitão. Tem como objetivo mobilizar os seus defensores para a tese de que inimigos armados atentariam contra a vida do candidato à reeleição. Nem o Centrão acredita nisso.
Está claro que a condição física do ex-capitão não é igual àquela que ele desfrutava antes de receber a facada na barriga. Os seus intestinos foram perfurados, houve cirurgia para controle de sangramento e para restabelecimento das funções gastrointestinais. Justamente por ter essa limitação, as prescrições novamente repetidas a ele exigem o que é cobrado normalmente de pessoas adultas: que tenham autocontrole, que sejam responsáveis e que se comportem segundo as instruções da ciência, para evitar complicações previsíveis.
Mas, em lugar de se autocontrolar - uma exigência que não pode ser feita ao ex-capitão - que age impulsivamente, admite, não mastigar - "eu engulo" - revela aquilo que a cena política já se acostumou a registrar como fator desencadeante de crises igualmente desnecessárias: a incontinência verbal e comportamental. Ele confessa: "Eu não consigo me controlar".
Negando que estivesse em férias quando foi internado, disse, ao sair do hospital, que já lamentava ter de renunciar ao lazer programado. Na agenda estava assistir a um jogo de futebol do Marrone e do Gusttavo Lima, e fazer um salto de paraquedas no Rio... Uma programação que registra a sua alegria de viver e mostra a absoluta falta de compreensão de quais são as suas obrigações como Presidente da República.
Parece entender que governa é assinar papéis, liberar uns dinheiros e assim as coisas se resolvem. E não interromper o descanso quando milhares de pessoas sofrem com a maior inundação da sua história, na Bahia. Nada incomum para quem disse que a Covid-19 era apenas "uma gripezinha", e que "não é coveiro", porque, como repetiu na sua alta hospitalar, "todo mundo vai embora (morre) um dia". Sim, aqui testemunhamos quase 620 mil que se foram, vítimas da pandemia e da má gestão da saúde no Brasil.
A incompreensão do que são qualidades humanas que exigem além da empatia, compaixão e responsabilidade, desencadeia, na linha de comando liderada pelo ex-capitão, a mesma ausência de sentimentos e entendimento.
Instrui - e é obedecido pelo quase ministro da Saúde - o Pazuello-de-jaleco, o tal Queiroga. Este, sem qualquer resistência à vontade do chefe, adia ao máximo a imunização das crianças de 5 a 11 anos, criando barreiras para a liberação das vacinas e a entrega delas aos estados e municípios. A invenção de procedimentos burocráticos, como audiências e consultas públicas, provoca incredulidade entre as autoridades sanitárias e faz questionar sobre a sanidade de quem defende o adiamento da vacinação das crianças.
Com o diversionismo quase esgotado sobre as vacinas para as crianças, o ex-capitão precisava de uma nova pauta para que também se esquecessem do descaso com as inundações. A Polícia Federal vai investigar a facada. Dois inquéritos foram feitos e encerrados, com a mesma conclusão. O atentado foi obra de uma pessoa descontrolada. Um outro inquérito, porém, continua aberto e sem conclusão: quem mandou matar Marielle Franco e Anderson Gomes?
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