Wálter Maierovitch

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Opinião

Toffoli destapou o esgoto da 13ª Vara de Curitiba e do TRF-4

Narinas tapadas. Até a leitura dos fatos causam náuseas. Por partes.

O juiz Eduardo Fernando Appio atacava, em programas de grande audiência do respeitado jornalista Luís Nassif, o então juiz Sergio Moro, o procurador Deltan Dallagnol e a força tarefa da Lava Jato. Nas redes sociais, repetia os ataques. Era um notório antilavajatista.

A propósito, a Lei Orgânica da Magistratura incorporou uma regra ética fundamental: impedir ao magistrado de criticar, em público ou em privado, a decisão ou os posicionamentos de colega togado. Autor de "lectio magistralis" sobre ética, o filósofo holandês Baruch Spinoza, deve, imagina-se, haver desejado sair da sepultura para encontrar a lecionar noções elementares de ética ao juiz Appio.

Appio, no sistema informatizado do Tribunal Federal da 4ª Região, escolheu, para acesso, a identificação 'Lul 2022', quando a mesma legislação e a nossa Lei Maior, ambas, proíbem aos juízes filiações e manifestações político-partidárias. Só para lembrar, juízes atuam na Justiça Eleitoral, que integra o Poder Judiciário nacional. As preferências devem ser mantidas sob reserva.

Logo que aberta uma vaga para a 13ª Vara do foro federal de Curitiba, o juiz Appio inscreveu-se para dela ser titular. Uma tragédia anunciada, mas o Tribunal Federal da 4ª Região não percebeu que a mudança não atenderia ao interesse público. E para lá foi o referido Appio.

Atenção. Nos propinoduto da corruptora organização criminosa de razão social Odebrecht, cuja chefão era Marcelo Odebrecht constava, como corrompido, um deputado apelidado de "Abelha".

Segundo apurações, o deputado de codinome Abelha era o pai do magistrado, Eduardo Fernando Appio. E o magistrado não se importou em assumir a 13ª Vara e nunca se deu por impedido de parcialidade nos casos da Lava Jato.

Antes de assumir a titularidade da 13ª Vara de Curitiba, o juiz Appio era uma espécie de militante antilavajatista. Sempre esteve pronto a atacar o seu colega Sergio Moro, o procurador Dallagnol e os da equipe ministerial reunidos na força tarefa denominada Lava Jato.

Foragido da Justiça e com duas ações penais com acusações na 13ª Vara por lavagem de dinheiro, corrupção e associação delinquencial, o lavador e reciclador de capitais da Odebrecht, Tacla Duran, teve a prisão preventiva revogada pelo juiz Appio.

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As ações estavam suspensas por decisão do STF, mas Appio revogou a prisão preventiva, colocou Duran em programa de proteção de testemunhas e designou audiência para ouvi-lo por videoconferência uma vez que residia na Espanha. E Duran acusou Moro e Dallagnol de extorsão.

Tacla Duran, de credibilidade duvidosa, passou a ser atacado por Moro e Dallagnol. Num Brasil polarizado, com Moro e Dallagnol eleitos senador e deputado federal, Duran virou o lavador de dinheiro mais conhecido do Brasil.

O desembargador federal Marcelo Malucelli representou contra Appio. Teria ameaçado seu filho, advogado João Eduardo Barreto Malucelli, por telefone. O desembargador atuava, em grau de reexame, nos casos da Lava Jato.

Nessa ocorrência criminal dada como ameaçadora e de ousadia incomum, até perícia de voz foi realizada, pois o advogado gravou as ameaças, A perícia realizada aponta como sendo altíssima a probabilidade de tratar-se da voz de Appio. E Appio entrou, antes, no sistema do Tribunal para obter o telefone do desembargador Malucelli.

Moro, já senador, aproveitou e foi para a revanche. E nunca se ouviu tanto, pela boca de Moro, o informe de fato inédito na história da magistratura brasileira.

Para se aproximar ao odor fétido, comparável ao exalado na capital paulista pelo rio Tietê, na estação do verão, outros fatos aconteceram. Graças ao esgoto destapado pelo ministro Dias Toffoli, conforme demostra a sua feliz decisão, que já agita os redutos políticos e jurídicos.

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O advogado João Eduardo Malucelli é sócio de escritório do senador e ex-juiz Sergio Moro, já titular, como sabido, da mencionada 13ª Vara de Curitiba.

O advogado João Eduardo Malucelli é sócio da esposa de Moro, advogada e deputada federal eleita por São Paulo, onde nunca residiu, apesar de declaração em sentido contrário prestada à Justiça Eleitoral. Parêntese: apenas o domicílio eleitoral paulista de Moro recebeu impugnação, aceita pela Justiça eleitoral.

Mais ainda, a filha de Moro namora com o filho do sócio João Eduardo Malucelli. O desembargador Malucelli, imediatamente após o escândalo das ameaças, afastou-se voluntariamente dos processos da Lava Jato, que antes não se dava como suspeito ou impedido. O desembargador nega ter cancelado a decisão de Appio que revogou a preventiva do foragido Tacla Duran.

Na 8ª Turma do Tribunal e para o lugar de Malucelli assumiu o desembargador Loraci Flores de Lima, outro a não se dar por suspeito ou impedido apesar de o irmão, delegado de polícia, ter atuado em investigações da Lava Jato. Supracitado delegado de polícia federal esteve até em diligências da Lava Jato em Portugal.

Conforme destacado na monocrática decisão do ministro Toffoli, e isto está comprovado, o Tribunal Federal da 4ª Região relutou, até a ocorrência de uma reclamação ao STF, em cumprir decisão do então ministro Ricardo Lewandowski, referente à Lava Jato.

Prova provada mostra ainda, neste cenário dantesco onde o barqueiro do inferno, Creonte, certamente gritaria várias vezes o "Guai a voi anime prave" (problemas a vocês almas amaldiçoadas), os delírios da dupla Moro-Dallagnol, o primeiro com suspeição por falta de imparcialidade bem reconhecida pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

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A dupla Moro e Dallagnol, mediante dinheiro de multas da Petrobrás, desenvolveram plano para a constituição de uma fundação, com aporte de R$ 2,5 bilhões. Seria uma fundação privada, anticorrupção, com apoio. Tudo, pela natureza privada, à revelia do órgão de governo do Ministério Público.

Nesse quadro de esgoto a céu aberto, o ministro Toffoli decidiu acertadamente pela nulidade da exceção de suspeição, a envolver interesse de Raul Schimit Filippe Júnior. Ao analisar 28 casos de suspeições de Appio, todos arguidos pelo Ministério Público, o tribunal deu pela suspeição e anulação de todas as decisões da Appio na Lava Jato.

Não havia arguição de suspeição nos processos acusatórios contra Raul, absolvido em uma das três ações penais e com prisão preventiva revogada por Appio.

Por tal razão, Raul sofreu prejuízo com a decisão ampliada da 8ª Turma do Tribunal Regional da 4ª Região. E não teve esse réu oportunidade de se manifestar a apresentar defesa. Como frisou Toffoli, verificou-se violação ao devido processo legal. De se acrescentar, ignorou-se interessado que ficou sem a garantia do contraditório.

No caso do processo administrativo disciplinar de Appio, onde deu-se o seu afastamento cautelar da 13ª Vara, o ministro Toffoli suspendeu a tramitação processual. Atenção: não determinou Toffoli a volta de Appio, cuja falta de parcialidade de se manter à frente da Lava Jato é de clareza solar.

Um dado importante. A canhestra decisão de Toffoli na reclamação 43.007 que anulou provas apresentadas no acordo de leniência da Odebrecht, já deu seus primeiros dois frutos.

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Duas outras sub-reclamações, por descumprimento das deliberações da 43.007, foram apresentadas pelo juiz Appio e pelo réu Raul Schimidt.

O réu Raul Schimidt entrou com sub-reclamação baseada na decisão de Toffoli. Frise-se: reclamação 43.007, apresentada pelos advogados de Lula.

Pela decisão da terça feira 19, do ministro Toffoli, o réu Raul obteve a anulação da decisão da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal (4ª Região).

Nas mesmas águas, também apresentando sub-reclamação com fundamento no caso Lula, o juiz Appio, cujo pai ficou suspeito por integrar com o apelido de Abelha as duas bases de dados do propinoduto da Odebrecht, teve o processo disciplinar, em face de irrogada ameaça telefônica, suspenso.

Toffoli não é santo da devoção deste articulista do UOL, para usar uma expressão popular. Mas dessa vez acertou em cheio e a podridão foi sentida.

Pano rápido. Falta a Toffoli, ainda como se diz no popular, tomar uma dose de "simancol" e reconhecer a própria suspeição, pelas notórias amizades com Lula, José Dirceu e dirigentes do Partido dos Trabalhadores. Também com relação ao ex-presidente Bolsonaro e família, pois Toffoli já foi filobolsonarista.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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