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SP tira das ruas PMs envolvidos em ação de Paraisópolis que deixou 9 mortos

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

02/12/2019 19h02Atualizada em 02/12/2019 19h32

A Polícia Militar de São Paulo retirou hoje das ruas seis homens do 16º Batalhão da Polícia Militar (BPM) que atuaram na operação que resultou em nove mortes em Paraisópolis, na zona sul da capital paulista, na madrugada do sábado para o domingo (1º).

"Os policiais foram afastados para o serviço administrativo. Uma prática que ocorre normalmente. Por exemplo: quando há morte decorrente de intervenção policial, é quase automático que o PM seja afastado das ruas até a finalização da investigação", afirmou ao UOL Benedito Mariano, ouvidor das polícias de São Paulo.

Os policiais envolvidos na ocorrência são:

  • João Paulo Vecchi Alves Batista
  • Rodrigo Cardoso da Silva
  • Antonio Marcos Cruz da Silva
  • Vinicius José Nahool Lima
  • Thiago Roger de Lima Martins de Oliveira
  • Renan Cesar Angelo

Eles afirmaram em depoimento que fizeram "uso moderado da força". A ouvidoria havia pedido, mais cedo, que os policiais fossem afastados do serviço operacional das ruas. Um ofício foi enviado à Corregedoria da PM, instância da corporação que está investigando o caso.

Governo fala em "preservação"

Mais cedo, o comandante geral da Polícia Militar, coronel Marcelo Vieira Salles, afirmou, ao lado do governador, João Doria (PSDB), que os policiais não estão afastados, mas, sim, "preservados". Doria negou que as mortes tenham sido causadas pela ação da PM.

"Os policiais não estão afastados, estão preservados. Temos que concluir o inquérito. Não haverá como condená-los antes do devido processo legal. Seguirão em serviços administrativos, no horário deles, fazendo outras coisas", disse Salles.

"É uma área complexa de trabalhar e, havendo outro evento parecido, eles poderão ser prejudicados. Estão sendo preservados. Eventos onde há morte, eles são submetidos a um trabalho de preservação, com psicólogos, análise médica. Inclusive para dar tranquilidade para apurar com inquérito, não haja ameaças a testemunhas. Eles são retirados, preservados no batalhão. Não usaria o termo afastado", complementou o comandante.

O que dizem os policiais?

A reportagem teve acesso aos depoimentos dos policiais militares envolvidos. Todos são da Força Tática (agrupamento especial). Neles, uma mesma versão: estavam na operação, denominada pelo governo de São Paulo como "Pancadão" e que, ao se aproximarem de Paraisópolis, foram recebidos a tiros por um dos dois ocupantes de uma moto.

"Eles [criminosos] adentraram em um pancadão, que é um baile funk clandestino, que ocorria na via pública, e mesmo se misturando entre os frequentadores do pancadão, o indivíduo continuava efetuando disparos de arma de fogo a esmo, o que causou grande confusão entre os frequentadores do pancadão", disse o policial Cruz da Silva.

Ainda segundo ele, essa confusão ocasionou o pisoteamento das pessoas. Ele afirmou que na tentativa de sair da favela, chamou reforço via rádio. E que, depois, retornou ao local onde viram viaturas apedrejadas.

"Havia um grande número de pessoas descontroladas, sendo necessário uso moderado da força com emprego de cassetete e munição química". Os demais policiais disseram o mesmo.

Frequentadores dão outra versão

No entanto, a versão de testemunhas é dissonante. Frequentadores do baile negam que tenha ocorrido tiroteio e afirmam que os policiais militares entraram na favela com o objetivo de fazer a dispersão pelo barulho, não porque havia criminosos fugindo em meio aos jovens.

Frequentadores disseram, também, que os PMs afunilaram os jovens em vielas e que houve espancamentos a esmo provocados por policiais. As informações são investigadas pela Corregedoria da PM e pela Polícia Civil.

Comando precisa ser responsabilizado, diz professor

Rafael Alcadipani, professor de Gestão Pública na FGV (Fundação Getúlio Vargas) e pesquisador de ações da polícia paulista, afirma que as gravações que vieram a público "mostram um uso desproporcional de força, com policiais não seguindo procedimentos e protocolos que deveriam ser seguidos nesse tipo de situação".

"Não só os policiais, mas os comandos também precisam ser responsabilizados por essa ação, para que esse tipo de atitude não volte a ocorrer", complementou.

Política de segurança não vai mudar, diz governador

Em entrevista coletiva concedida hoje, o tucano disse que as mortes não foram provocadas pela PM e que não houve invasão ao baile funk. Ele, no entanto, destacou que pode reavaliar e rever pontos específicos e penalizar quem cometeu erros, mas que manterá a política de segurança pública de São Paulo.

A versão apresentada por Doria é a mesma da polícia: PMs reagiram a um ataque de dois criminosos que estavam em uma moto atirando. No entanto, frequentadores do baile negam que tenha ocorrido tiroteio e afirmam que os policiais militares entraram na favela com o objetivo de fazer a dispersão em virtude do barulho, não porque havia criminosos fugindo em meio aos jovens.

"A letalidade não foi provocada pela PM, e sim por bandidos que invadiram a área onde estava acontecendo baile funk. É preciso ter muito cuidado para não inverter o processo", disse Doria.

Doria declarou ainda que o estado São Paulo "tem o melhor sistema de segurança preventiva", mas "isso não significa que não seja infalível".

A ação em Paraisópolis ocorre menos de uma semana após o governo do Estado ter divulgado as metas de segurança pública da gestão Doria. As metas não determinam objetivos para reduzir a letalidade policial.

A política de segurança pública do Estado de SP não vai mudar.
João Doria (PSDB), governador de São Paulo