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'E o decreto?': após anúncio, bloqueio ainda não chegou a bairros do RJ

12.mai.2020 - Cones e placa sobre calçada do Méier; ampliação de bloqueio no bairro foi anunciada ontem - Caio Blois/UOL
12.mai.2020 - Cones e placa sobre calçada do Méier; ampliação de bloqueio no bairro foi anunciada ontem Imagem: Caio Blois/UOL

Caio Blois e Herculano Barreto Filho

Do UOL, no Rio

12/05/2020 14h17

O bloqueio anunciado ontem pelo prefeito Marcelo Crivella (Republicanos) para restringir a circulação de pessoas e carros a fim de conter o coronavírus ainda não foi implementado em bairros como o Méier e Tijuca, na zona norte, e em Realengo, na zona oeste, conforme verificou nos locais a reportagem do UOL. Já no Grajaú, também na região norte, houve ações pontuais, mas sem grande efeito prático no movimento de pessoas.

No Méier, às 10h, placas e cones que impedem a passagem de carros estavam sobre a calçada, sem sinal da Guarda Municipal. Em ruas do bairro, a circulação de pessoas e ambulantes permanecia intensa. Conversa presenciada pelo UOL evidenciou falha de comunicação: a Guarda Municipal, que manteve a barreira dos últimos dias e liberou o trânsito no meio da manhã, foi informada pela coordenação da base da Polícia Militar no local de que precisaria voltar.

"A Guarda foi embora? E o decreto?", questionou o sargento Davis no rádio para um policial que estava próximo ao local onde deveria estar o bloqueio. "Juntaram as coisas e saíram sem avisar", informou outro policial.

O UOL esteve na rua Dias da Cruz, principal via do bairro onde haveria bloqueio dos agentes da prefeitura em ação conjunta com a CET-Rio conforme anunciado ontem. Das 10h até 12h, quando a reportagem deixou o Méier, o fluxo do trânsito e o comércio não tiveram mudanças.

Prefeitura do Rio fala em fechamento gradual

Por meio de nota, a prefeitura informou que a ampliação das restrições será implementada até amanhã.

"A Secretaria Municipal de Ordem Pública informa que os bloqueios foram iniciados nesta terça-feria, dia 12, em centros comerciais de três bairros (Santa Cruz, Madureira e Grajaú) e a previsão é efetuar o fechamento nas sete áreas restantes ao longo do dia de hoje até quarta-feira (13)."

Segundo a pasta, "a implantação dos bloqueios ocorre gradativamente para reduzir o impacto causado pela mudança no trânsito e no transporte público de cada região, além de planificar as operações conjuntas com a Polícia Militar".

A Prefeitura do Rio anunciou ontem a edição de decreto em que ampliava a partir de hoje a restrição de circulação de pessoas e carros em mais dez bairros —Santa Cruz, Freguesia, Taquara, Realengo e Guaratiba, na zona oeste, e Tijuca (Praça Saens Peña), Grajaú (Praça Verdun), Madureira (Calçadão), Pavuna e Méier (rua Dias da Cruz), na zona norte.

12.mai.2020 - Fila de banco no Méier, na zona norte do Rio - Caio Blois/UOL - Caio Blois/UOL
12.mai.2020 - Fila de banco no Méier, na zona norte do Rio
Imagem: Caio Blois/UOL

Moradores e comerciantes do Méier afirmaram não ter havido qualquer ação educativa ou fiscalização de agentes da prefeitura durante toda a manhã.

"Alguns poucos guardas ficaram na esquina, bloqueando o trânsito, mas nós nem fomos procurados. Em tese, estaríamos aqui também para dar suporte a eles. Sozinhos, não temos como controlar essa quantidade de gente, nem é nossa incumbência", afirmou um PM que preferiu não se identificar.

"O bloqueio de trânsito foi feito, mas nada além disso. A Guarda Municipal e os outros carros da prefeitura só deixaram a esquina da Dias da Cruz para tomar café na padaria e voltaram. Você pode ver que pelos ambulantes, que estão agindo normalmente. Eles só falaram com moradores de rua, nem foram à cabine do Méier Presente", disse a professora Bianca Andrade, 45.

Movimento intenso e longas filas

Nas ruas do entorno, a circulação de pessoas era intensa. Em uma mesma calçada, onde há dois bancos, cerca de 150 pessoas se dividiam em filas que sobravam as duas esquinas.

"Infelizmente estou aqui para pagar contas pois o sistema não funciona. Estou ciente dos perigos, mas já está tudo atrasado em um dia", afirmou o estudante Maxwell Castro.

Do outro lado da rua, muita gente se aglomerava em mais duas agências bancárias e alguns comércios ambulantes, que circulavam livremente. A reportagem do UOL contou 28 barraquinhas de camelôs no trecho entre a avenida 24 de Maio e a rua Magalhães Couto, que compreende quatro quarteirões.

Por volta das 11h, a PM pediu para que ambulantes juntassem suas mercadorias e deixassem o local. Os policiais também pediram o fechamento de bancas de jornal e outros comércios não essenciais.

A base Méier Presente fazia o possível para garantir o distanciamento recomendado pela OMS (Organização Mundial de Saúde) em filas de serviços essenciais como bancos, farmácias, padarias e mercados, sem a ajuda da Guarda Municipal. Outros comércios respeitaram o decreto da prefeitura e não abriram suas lojas.

Tijuca, Grajaú e Realengo

Na Tijuca, apenas dois guardas municipais estavam no local e só a partir de 11h30. Sem efetivo para qualquer tipo de bloqueio na Saens Peña, a ação se resumia a uma mensagem de som de conscientização.

Na calçada em frente à praça, o UOL observou 20 camelôs trabalhando normalmente, além de uma loja de roupas aberta sob a prerrogativa de vender álcool em gel. Comerciantes, policiais e moradores afirmaram que a circulação de pessoas não diminuiu.

Já o Grajaú registrou uma ação mais efetiva, com mais agentes e gradeados. As filas estavam mais organizadas, não era permitido estacionar na rua Barão de Mesquita e uma loja de doces foi impedida de abrir pela Guarda Municipal. Por outro lado, estabelecimento de venda de esmaltes e outra loja de doces funcionavam livremente na esquina do Largo do Verdun.

Até as 13h50, não haviam sido enviadas equipes da Guarda Municipal para Realengo. Com 37 mortes e 152 casos de pessoas com covid-19, o bairro está entre aqueles com maior incidência do vírus na capital fluminense.

O UOL esteve na Praça Bom Conselho, onde foi flagrada aglomeração de cerca de 300 pessoas na semana passada para empinar pipas.

Segundo os moradores, a ação foi organizada por jovens que moram em comunidades vizinhas. Um homem, que não quis se identificar, disse que a Guarda Municipal não veio ao local depois do episódio. Ainda segundo ele, a PM só chegou ao local para atender à ocorrência por volta das 22h, quando os jovens já tinham ido embora.

"A Guarda nunca veio aqui para coibir essa baderna. Estamos abandonados", disse um dos moradores. "Eles sobem em cima dos telhados dos moradores para pegar pipa. Não respeitam ninguém. E ainda tem a aglomeração, que pode causar transmissão de coronavírus", argumenta outro.

Na rua Piraquara, uma das principais vias de Realengo, um restaurante funcionava com clientes na parte interna. A reportagem também verificou que havia outros comércios abertos, como lojas de vestuário. Segundo moradores, há até bares abertos à noite. "É errado, o pessoal não pode abrir. Eu não aceito isso", revolta-se o operador de máquinas Luiz Antônio da Silveira, que mora no bairro.