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PCC matricula membros em faculdade no Paraguai como disfarce, diz polícia

Carteira de identificação de faculdade usada por Bebezão - Divulgação/Senad
Carteira de identificação de faculdade usada por Bebezão Imagem: Divulgação/Senad

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

24/03/2021 12h54

Com o intuito de circular com mais facilidade no Paraguai para cometer crimes, integrantes do PCC (Primeiro Comando da Capital) têm se matriculado em uma faculdade de medicina de Pedro Juan Caballero, cidade que faz fronteira com a brasileira de Ponta Porã (MS), de acordo com investigadores do país vizinho, que atuam na Senad (Secretaria Nacional Antidrogas), entrevistados pelo UOL.

Brasileiros, normalmente brancos, recém estabelecidos em casas confortáveis naquela região e com carros importados na garagem, costumam procurar faculdades de medicina no Paraguai pelos preços e facilidade de ingresso. Mas, segundo os investigadores paraguaios, o mesmo perfil está sendo utilizado pelas organizações criminosas que traficam drogas e armas na região.

Ontem, o homem apontado como o principal chefe do PCC na cidade foi detido em uma operação conjunta entre a Senad paraguaia e a PF (Polícia Federal) brasileira. Trata-se de Weslley Neres dos Santos, 34, conhecido como Bebezão. Além dele, a ação deteve outros 13 suspeitos. Desses, outros cinco eram brasileiros. Com Bebezão, foi apreendida uma carteirinha de estudante de medicina. A polícia diz que outros detidos também circulavam pela instituição de ensino.

De acordo com a Senad, os 14 homens detidos ontem estavam em uma "assembleia", num lava-rápido, que discutia os próximos crimes que o grupo faria na região. No local, foram apreendidos 11 carros, cinco fuzis, além de dezenas de carregadores e munições. Também foram apreendidos coletes à prova de bala, dinheiro em espécie e celulares, que devem ser periciados e podem ajudar em futuras investigações.

Os brasileiros detidos devem ficar em presídios federais do Brasil. Policiais paraguaios tiveram que reforçar a segurança onde os traficantes estavam detidos pelo risco de haver tentativa de resgate.

Pela carteirinha apreendida com Bebezão, ele estudava medicina na Universidad Central Del Paraguay, na filial de Ciudad del Este, distante 420 km de onde foi detido. De acordo com os agentes paraguaios, ele se passava por estudante de medicina no Paraguai para poder circular livremente no país e negociar remessas de drogas na fronteira para o PCC.

O advogado da universidade, Alfredo Duarte, confirmou que Bebezão se matriculou na universidade no ano passado e que, pela pandemia, cancelou sua matrícula. "Neste ano, ele mesmo apresentou os documentos e se matriculou novamente na sede de Ciudad del Este. É um aluno ativo e participa das aulas online", afirmou.

Sobre a carteirinha de identificação apreendida com Bebezão, o advogado da universidade afirmou que, assim como em qualquer instituição de ensino, assim que se matriculam, todos os alunos recebem um documento igual. "Se ele é membro de um grupo criminoso, que está além da universidade determinar, cabe às autoridades investigar", acrescentou Duarte.

Poder sem vácuo

Policiais federais brasileiros apontavam Bebezão como o então número 1 na chefia da facção paulista no Paraguai. Ele assumiu o comando desde que Giovanni Barbosa da Silva, conhecido como Bonitão, foi detido, em 9 de janeiro deste ano, também em Pedro Juan Caballero.

De acordo com os policiais brasileiros, um outro integrante do PCC já foi escalado para chefiar os negócios da facção na região a partir de hoje. O novo nome, já identificado, está sob sigilo.

A advogada Zylly Rolón, secretária-executiva da Senad, afirmou na manhã de hoje, para rádios paraguaias, que, dos 14 detidos, apenas um não tinha antecedentes criminais ou ordem de captura. Esse suspeito será colocado à disposição do MP (Ministério Público).

A secretária afirmou que que o grupo tinha histórico de participar de roubos a bancos no Brasil e de atacar transportadoras no Paraguai. "Estavam muito interessados em assalto a bancos", disse.

Ligação com Rafaat

O centro tecnológico da instituição de ensino, na unidade de Pedro Juan Caballero, tem uma curiosidade que chamou a atenção dos policiais paraguaios após a detenção de Bebezão. Lá, onde hoje estudam futuros médicos, poucos anos atrás era a sede do principal escritório do traficante Jorge Rafaat Toumani, assassinado em 2016, aos 56 anos.

Na noite que foi executado a tiros de fuzil, Rafaat deixou o escritório, onde hoje funciona a faculdade, e foi interceptado e morto a tiros na esquina onde funciona uma farmácia. Até hoje, as marcas dos tiros podem ser vistas naquela localidade. De acordo com investigadores, Bebezão era o substituto de Bonitão, que, por sua vez, substituiu Sérgio de Arruda Quintiliano Neto, o Minotauro, que havia assumido o controle da fronteira após a morte de Rafaat.