Covas e Boulos pregam prevenção à covid, mas promovem aglomerações
Caçambas de veículos foram cercadas com paredes de acrílico para que Marta Suplicy e Luiza Erundina (PSOL) façam campanha nas ruas sem correr o risco de pegar covid-19. As adaptações fazem a eleição à Prefeitura de São Paulo parecer a casa de vidro do BBB, mas o cuidado dispensado às apoiadoras ilustres não é estendido aos cabos eleitorais dos candidatos.
Pessoas segurando bandeiras se espremem ao redor do Martamóvel e do Erundinamóvel para tirar uma foto ou receber um aceno. Tudo o que não deveria acontecer em tempos de alta de casos e internações é repetido no dia a dia das campanhas de Bruno Covas (PSDB) e Guilherme Boulos (PSOL).
Mas a ousadia de viver como na época anterior ao coronavírus cobrou seu preço no PSOL. A deputada federal Sâmia Bomfim (PSOL-SP) foi diagnosticada com covid-19. A primeira reação de Boulos foi manter as atividades de rua, mas depois elas foram suspensas por precaução. O candidato fez o teste e aguarda o resultado.
Esta rotina de aglomerações ocorre no segundo turno mesmo com os dois candidatos afirmando que, em caso de vitória na eleição, seguirão as recomendações da ciência para enfrentar a crise sanitária. Pela ciência, evitar aglomerações é uma das principais medidas para tentar brecar a disseminação da doença.
O coordenador do Centro de Contingência ao Coronavírus, José Medina, afirmou na última quinta-feira que a campanha eleitoral tem relação com o aumento de casos no país. Nesta semana, ele repetiu a declaração.
"O fator que foi único e disseminado no Brasil todo que podia amplificar o número de casos foi a campanha eleitoral. No hemisfério Norte, foi o outono e o inverno e a redução da temperatura. Aqui no Brasil, se você observar, todos os estados estão tendo um aumento. Isso decore das aglomerações das festas e do corpo da campanha eleitoral."
Média acima de mil novos casos
Desde o início da campanha eleitoral, em 27 de setembro, a taxa de isolamento na capital paulista tem oscilado entre 38% e 48%, em um cenário parecido ao de meados de março, quando a doença levou à quarentena na cidade.
De acordo com a Secretaria Estadual de Saúde de São Paulo, até ontem a capital paulista havia registrado mais de 342,8 mil casos de infectados. O número de mortes chega a 14,2 mil pessoas. A média móvel aponta que seriam cerca de 1.400 casos novos por dia na cidade.
A cidade de São Paulo não é um caso isolado. Municípios da região metropolitana como Guarulhos, São Bernardo do Campo, São Caetano do Sul e Santo André também têm números em alta.
Evitar aglomeração?
No horário eleitoral, Covas diz que a pandemia trouxe desafios, mas que "a população fez a sua parte". "Utilizou máscara, álcool em gel, evitou aglomeração." Este último ponto não é visto nas campanhas de rua do tucano. Mesmo dizendo que a pandemia está estabilizada, Covas anunciou a abertura de 220 leitos para tratamento de covid-19.
Ele falou do assunto em uma agenda de rua no bairro Valo Velho, que teve aglomeração. O mesmo ocorreu no final de semana em outros eventos na zona sul. Parte da equipe do candidato tenta impedir a concentração de pessoas, mas os pedidos são esporádicos e não obedecidos.
Brigada do álcool, mas sem distanciamento
Na campanha de Boulos, organizadores das agendas criaram uma "brigada". São apoiadores do candidato que, usando jaleco branco, aplicam álcool em gel nas mãos dos eleitores que acompanham o ato.
"Brigada de álcool em gel é uma boa intenção sem nenhum resultado prático", diz Evaldo Stanislau, infectologista do Hospital das Clínicas da FMUSP (Faculdade de Medicina da Universidade de São Paulo) e diretor da SPI (Sociedade Paulista de Infectologia). "Seria melhor uma brigada do distanciamento e de máscara."
Mesmo ao ar livre, a proximidade favorece a transmissão do vírus. Portanto, distanciamento é essencial.
Evaldo Stanislau, infectologista
Antes da chegada de Boulos às agendas, é comum que os organizadores peçam para que os apoiadores mantenham o distanciamento social. Mas essa orientação é esquecida assim que o candidato chega. Boulos passa a ser cercado por eles e também pela imprensa. Foi o que aconteceu, por exemplo, no último sábado, em que a concentração foi feita em uma rua estreita de Heliópolis, na zona sul.
O que seria uma campanha segura?
"Uma campanha segura seria sem nenhuma atividade pública", diz o infectologista. Para ele, ao menos deveria haver "um roteiro prévio que previsse controle do número de pessoas, distanciamento, renovação do ar e barreiras".
Para o cientista político e professor da USP Glauco Peres, o esforço de Covas e Boulos para conseguir votos nesta reta final de campanha é válido, considerando que cerca de 4,6 milhões de eleitores não foram às urnas ou não escolheram candidato no primeiro turno. Os adversários no segundo turno somaram cerca de 2,8 milhões de votos.
"Acho que eles estão arriscando. Está na reta final. Eles estão tentando aproveitar esse pouquinho que falta e tentar virar esses votos", diz Peres. "Isso [buscar os indecisos] é válido. Por outro lado, é evidente que provocar aglomerações, não", disse.
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