"Fui ameaçado de prisão se não cooperasse", diz brasileiro detido em aeroporto de Londres
Em sua primeira entrevista desde que voltou ao Rio de Janeiro, no início desta segunda-feira (19), David Miranda, acusou o Reino Unido de "total abuso de poder" por interrogá-lo por quase nove horas no aeroporto de Heathrow, com base na Lei anti-terrorismo em voga no país desde o ano 2000.
"Eles estavam me ameaçando o tempo todo e dizendo que eu iria ser preso se eu não cooperasse", disse Miranda. O brasileiro conta que os oficiais tentaram intimidá-lo e o forçaram a repassar as senhas de seu laptop e de seu telefone celular, dizendo que ele era obrigado a responder todas as perguntas.
"Eles me trataram como se eu fosse um criminoso ou alguém prestes a atacar o Reino Unido. Foi cansativo e frustrante, mas eu sabia que não estava fazendo nada de errado", disse ao jornal britânico "The Guardian".
"Eu estava em um país diferente, com leis diferentes, em uma sala com sete agentes que faziam perguntas ininterruptas. Pensei que tudo pudesse acontecer. Pensei que poderia ser detido por um longo tempo", completou.
Em nota divulgada na tarde de hoje, a Scotland Yard, a polícia britânica, afirmou que a detenção foi um processo legal e negou que impediu a Miranda o acesso a um advogado.
"Ao contrário de alguns relatos, foi oferecido uma representação legal enquanto havia o interrogatório", diz a nota. A nota diz ainda que "o uso do poder nesse caso é legítimo" e que nenhuma queixa foi recebida no Serviço de Polícia Metropolitana (MPS, na sigla em inglês) até então.
Polícia questiona sobre protestos no Brasil
Miranda disse que as autoridades britânicas ainda o questionaram sobre a onda de protestos que acontece no Brasil desde junho.
"Eles até me perguntaram sobre os protestos no Brasil, porque as pessoas estavam descontentes e quem eu conhecia no governo", disse Miranda.
No domingo (18), David Miranda, parceiro do jornalista Glenn Greenwald, que publicou dados sobre esquema de espionagem do governo americano para o jornal, vazados por Edward Snowden, foi parado pela polícia britânica e interrogado por nove horas, quando voltava de Berlim para o Rio de Janeiro, onde moram ele e o jornalista.
Miranda fazia escala no aeroporto de Heathrow em seu voo procedente de Berlim com destino ao Rio de Janeiro, onde vive com Greenwald. O brasileiro foi liberado mas seus equipamentos eletrônicos, entre eles o computador, telefone celular, pen-drives, DVDS e jogos eletrônicos foram apreendidos.
Em Berlim, o brasileiro passou uma semana na casa da documentarista americana Laura Poitras, que foi selecionada por Snowden, junto a Glenn Greenwald, para publicar os documentos que trouxeram à tona os programas de espionagem realizados pela Agência de Segurança Nacional americana.
Brasil e Reino Unido cobram explicações
Na manhã de hoje, o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Antonio Patriota, disse que a detenção de Miranda, durante nove horas, não se justifica. Patriota conversou por telefone com o ministro das Relações Exteriores do Reino Unido, William Hague, que justificou a detenção do brasileiro como uma questão operacional.
As autoridades britânicas estão sendo criticadas por parlamentares pela detenção do companheiro brasileiro do jornalista. A detenção é "extraordinária", disse o presidente da Comissão Parlamentar Britânica do Interior, o trabalhista Keith Vaz, que exigirá explicações da polícia.
"Eles sabiam que se tratava do parceiro de Greenwald e, portanto, fica claro que não somente as pessoas envolvidas estão sendo visadas, como também pessoas ligadas aos envolvidos", disse à "BBC".
"Vou escrever à polícia e pedir explicações, porque deter alguém sob essas circunstâncias e, além disso, confiscar seus pertences mostra um uso diferente da legislação", afirmou. "Eles podem ter uma explicação razoável para isso e, se esse for o caso, então pelo menos saberemos e ficaremos preparados", acrescentou Vaz.
Outro deputado da oposição trabalhista, Tom Watson, considerou indispensável conhecer o eventual envolvimento do governo nesta detenção. "Devemos saber se os ministros estavam cientes da decisão de deter David Miranda e quem tomou concretamente a decisão", disse Watson.
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