Veterano, 'herói' e modelo: quem eram os brasileiros mortos na Ucrânia
Aliados das tropas ucranianas, os três brasileiros mortos na guerra deixaram para trás histórias de um passado relembrado por colegas de farda e lembranças de atividades fora do "front" contadas pelas famílias. Os três integravam o mesmo pelotão, comandado por outro brasileiro, também composto por combatentes colombianos e espanhóis.
O Itamaraty (Ministério das Relações Exteriores) confirmou oficialmente ontem à noite as mortes de Douglas Búrigo e Thalita do Valle, atingidos por um bombardeio russo na cidade de Kharkiv há seis dias. Baleado há um mês, André Hack foi o primeiro brasileiro morto em combate na Ucrânia.
Herói voltou por colega
Douglas Búrigo, 40, atingido por uma explosão no alojamento na quinta-feira (30) na cidade de Kharkiv ao tentar salvar Thalita do Valle, que também morreu em meio ao ataque, é tratado como "herói" no pelotão.
"O Douglas decidiu voltar. Ele acabou arriscando a própria vida para salvar a colega. Morreu como um herói", relatou o tenente Sandro Carvalho da Silva, brasileiro comandante do pelotão e sobrevivente do ataque.
A pacata São José dos Ausentes, cidade no interior do Rio Grande do Sul com apenas 3.500 moradores onde Douglas morava, decretou três dias de luto por causa da morte. O prefeito e o vice-prefeito inclusive visitaram os pais dele.
Em um áudio enviado a um amigo, Douglas já havia revelado medo de morrer ao presenciar a realidade no "front" de batalha. E revelou apenas um desejo: queria ser enterrado com a bandeira do Brasil.
"Tô apavorado. Abateram um colega nosso. Não sei se eu volto vivo pro Brasil. Mas, se eu não voltar vivo, eu quero que vá a bandeira pra mim".
Modelo e atiradora de elite contra o Estado Islâmico
Thalita do Valle, 39, que morreu asfixiada no bunker onde buscava proteção dentro de um sobrado em chamas após o bombardeio de um morteiro com carga incendiária, era ex-atriz mirim, modelo e ativista da causa animal.
Há três anos, se alistou como socorrista junto ao exército curdo no Iraque para enfrentar o Estado Islâmico, onde se tornou atiradora de elite. A experiência estava sendo registrada em livro redigido por Thalita em parceria com um escritor, segundo a família.
"A Thalita era do exército feminino [no Iraque] e integrava uma linha de frente com atiradoras de elite. A função primária dela era fazer o resgate, como socorrista. Mas também fazia a cobertura para quem estava avançando. Era uma heroína, e a vocação dela era salvar vidas, correndo atrás de missões humanitárias", disse Théo Rodrigo Vieira, 36, irmão de Thalita.
Natural de Ribeirão Preto (SP), Thalita morava em São Paulo desde a infância. Vinda de uma família ligada ao teatro, estrelava peças mirins na infância. Aos 18, começou a atuar como modelo fotográfica. Mas logo começou a se dedicar ao ativismo ligado à causa animal.
Esteve em ações de buscas na tragédia de Brumadinho (MG), que deixou 270 mortos em janeiro de 2019.
Veterano de conflito na Costa do Marfim
Primeiro brasileiro morto na guerra da Ucrânia, o combatente André Hack Bahi, 43, foi abatido no dia 5 de junho em confronto contra os russos em Sieverodonetsk, principal campo de batalha no leste do país. O corpo dele só foi cremado no último sábado (2). As cinzas serão levadas para o Ceará, onde morava com a esposa e a filha de 2 anos.
Ele carregava cicatrizes no corpo de conflitos anteriores quando atuava pela legião estrangeira francesa. Há seis anos, só escapou da morte em uma missão na Costa do Marfim porque estava com colete à prova de balas quando foi atingido por quatro tiros no peito —a área em que ele estava havia sido alvo de bombardeios e mísseis, segundo a família.
Resgatado às pressas de helicóptero, precisou ficar dois meses hospitalizado para se recuperar de um traumatismo craniano e de fraturas na mandíbula e tórax. Mas isso não o impediu de se alistar junto às tropas ucranianas há quatro meses.
"Ele falou: 'Mana, eu quero ajudar as pessoas. Se precisar morrer, eu vou morrer'. E foi o que aconteceu, ele morreu em combate. O meu irmão tinha essa força de salvar vidas e de lutar por um país que nem era dele. Ele vai permanecer vivo para sempre no meu coração", disse Letícia Hack, irmã de André.
A bandeira do Brasil que costumava carregar na sua mochila apareceu nas mãos de um suposto combatente checheno, que atua ao lado das tropas russas. Em um vídeo publicado no Twitter, é possível ver a assinatura dele e de outros voluntários do seu pelotão. A bandeira é a mesma exibida por André com outros combatentes brasileiros em foto que viralizou há meses.
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