Conteúdo publicado há 1 mês

Eleição americana para perdidos: um guia de como funciona o pleito nos EUA

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Esta é uma edição da newsletter para os perdidos, como eu.

Escrever essas cartas tem sido a grande descoberta de que a gente entende é nada mesmo. Quer ver? Ganha uma eleição quem tiver mais voto. Certo? Óbvio, né, Tixa? Eu também pensava assim, darling, mas quando se trata de eleição americana a resposta é: Sim e Não.

Aff. Nos Estados Unidos, vence quem tiver mais votos dos delegados que formam o colégio eleitoral. Mas então não é o povo que escolhe o presidente, Tixa? É o povo que escolhe os delegados. Mas são os delegados que escolhem o presidente. É uma eleição indireta. Sim, BRASEW, durma com essa.

Nas últimas oito eleições, desde 1992, os democratas tiveram mais votos populares que os republicanos em sete delas (Bill Clinton, Al Gore, Barack Obama, Hillary Clinton e Joe Biden). A única vez em que os democratas perderam no voto popular neste período foi na reeleição de George Bush, na esteira da guerra contra o terror. Mas das sete vezes que venceram no voto popular, em apenas cinco venceram também no colégio eleitoral.

Al Gore, que perdeu para o Bush, e Hillary Clinton, que perdeu para o Trump, não chegaram ao Salão Oval porque não convenceram os delegados, apesar do voto popular.

E por que isso acontece?

Porque os democratas em geral têm muito mais votos nos estados mais populosos (Califórnia, Nova York), e os republicanos saem melhor nos estados menos povoados, como Montana, Idaho, Kansas. No fim, como a representação no colégio eleitoral não é tão fiel à população americana, fica mais fácil para os republicanos conquistarem delegados do que o voto popular.

E é por isso que a campanha acontece mesmo nos chamados "estados-pêndulo" (uma hora pende para democratas outra hora pende para republicanos), mas também podem ser chamados de estados campos de batalha. (Gosto mais dos campos de batalha). No fundo, em um bom português, são os estados "nem nem". Nem democratas, nem republicanos. Também podemos simplificar para "estados indecisos."

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Na prática, a campanha eleitoral para valer, essa de estilo street fight, vale-tudo, MMA, acontece mesmo em apenas poucos estados. E, claro, os estrategistas traçam o perfil dos eleitores desses estados indecisos para conquistar votos. Afinal, é esse povo que precisa ser conquistado.

O Trump mesmo soltou ontem a primeira leva de comerciais chamando a Kamala de "czar da fronteira" (ela aparece dançando junto com imagens de imigrantes). O slogan é: "Fracassada. Fraca. Perigosamente liberal."

E onde ele torrou o dinheiro? De acordo com dados do AdImpact, um serviço de rastreamento de anúncios (americano tem dado pra tudo), são de US$ 2,7 milhões na Pensilvânia, US$ 2,3 milhões na Geórgia, US$ 2,3 milhões em Michigan, US$ 1,9 milhão no Arizona, US$ 1,8 milhão em Nevada e US$ 1,3 milhão em Wisconsin. Tome nota onde o comercial está rodando.

Geolocalização é tudo, darling

Hoje, são sete estados considerados indecisos. Antes do Trump, eram 8. A Flórida também era considerada indecisa, mas virou um estado de tendência republicana.

Quando o Biden venceu as eleições em 2020, ele ganhou seis dos sete estados indecisos e a margem de vitória foi assim:

-- Michigan: 2,8%
-- Nevada: 2,4%
-- Pensilvânia: 1,2%
-- Wisconsin: 0,6% (este foi o "estado decisivo" que o colocou acima dos 270 votos eleitorais de que precisava para vencer)
-- Arizona: 0,3%
-- Geórgia: 0,2

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Trump venceu em apenas um dos estados mais disputados:

-- Carolina do Norte: 1,4%

E agora as pesquisas mostram que Kamala e Trump estão meio que empatados nesses campos de batalha.

Os cinturões

Dado todo esse contexto, vamos ao que os analistas achavam. Se o Biden ainda fosse candidato, a ideia seria fazer campanha para manter os votos dos estados conhecidos como Rust Belt (cinturão da ferrugem) uma área considerada de trabalhadores. Michigan, Wisconsin e Pensilvânia. Vocês lembram do Biden com o Lula falando em defender sindicatos e trabalhadores? Então, já era pensando nesse eleitorado.

Mas como a Kamala tende a ter um desempenho melhor entre eleitores não-brancos, tem um pessoal que acha que ela devia focar em estados indecisos com populações negras grandes (Geórgia e Carolina do Norte) ou populações hispânicas (Arizona e Nevada). Arizona, Geórgia e Nevada formam o Cinturão do Sol.

E por que todo essa longa explicação. Porque agora você pode entender melhor a escolha dos vices.

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Trump escolheu um vice que teoricamente fala com os trabalhadores. JD Vance tem origem nos trabalhadores rurais de Ohio. Mas hoje em dia é financiado pelos bilionários do Vale do Silício. (E já tem uma certa campanha para o Trump trocar seu vice. Vai vendo)

Já na campanha de Kamala, o pessoal está apostando em três possíveis governadores na shortlist: Josh Shapiro, da Pensilvânia, Mark Kelly, do Arizona e correndo por fora, chegando como azarão, Tim Walz de Minnesota.

Sim, todos homens brancos

Até se fala na governadora do Michigan, Gretchen Whitmer, mas o pessoal acha que seria arriscado demais duas mulheres de uma vez só.

Há quem defenda que Kamala deixe Shapiro e Kelly fazendo campanha para ela nos seus estados (que são da lista dos indecisos) e leve Walz para a chapa.

É que o candidato a vice não pode ficar concentrado em um estado pra fazer campanha. Além disso, Walz foi o inventor da história de chamar Trump e Vance de estranhos (o Thomas Friedman, do New York Times, achou o Ó e escreveu que eles só perdem votos desse povo dos estados indecisos com essa palavra).

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Mas Walz também é dono de um currículo que tem charme para os eleitores do Centro-Oeste (o tal cinturão da ferrugem). Foi criado em cidade de 400 habitantes, foi professor de geografia, suboficial da Guarda Nacional, deputado em um estado republicano (Minnesota), se conecta com a América rural.

Falei tanto que até perdi a hora. Vou encerrar assim, abruptamente. Chega, amanhã tem mais.

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