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Fotos denunciam violência contra animais exportados vivos do Brasil

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

14/12/2019 04h00

Resumo da notícia

  • Congresso tem projeto que barra venda de animais vivos para análise
  • Animais são tratados com crueldade em países do Oriente Médio, diz entidade

Imagens captadas entre 2018 e 2019 revelam o sofrimento extremo a que animais exportados vivos do Brasil são submetidos em países do Oriente Médio antes de serem abatidos sem qualquer método atenuante de dor. A investigação foi feita pela entidade Mercy for Animals (Misericórdia pelos animais, em tradução livre) para pressionar o Congresso a aprovar um projeto que barre a venda de animais vivos para abates em outros países.

As filmagens revelam como os animais são brutalmente tratados em alguns países que são os maiores importadores. Nas imagens, é comum animais aparecerem sendo içados pela pata. Também há vídeos que mostram animais tendo seus pescoços e tendões cortados enquanto ainda estão conscientes, sendo esfaqueados, recebendo chutes e tendo seus rabos violentamente torcidos.

Projeto para vetar exportação

Com as imagens repassadas ao UOL, a Mercy For Animals pede que o Senado aprove o projeto le Lei 357/2018, do senador Rudson Leite (PV-RR), que proibiria a exportação de animais vivos para abate em outros países. A proposta está na Comissão de Meio Ambiente da casa à espera do relatório do senador Omar Aziz (PSD-AM).

A aprovação, entretanto, pode encontrar dificuldades na casa. Em dezembro, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária opinou pela rejeição do projeto. A bancada do boi, como é chamada, já sinalizou ser contra a medida.

O parecer da comissão de Agricultura alega que a proibição da exportação "não é a melhor solução para a questão." "Proibir a exportação de animais vivos para o abate acarretaria um prejuízo anual superior a um bilhão de reais para a agropecuária nacional, que, conforme dados preliminares do Censo Agropecuário 2017, garante ocupação a mais de 15 milhões de pessoas em todo o Brasil. Isso, em um momento em que o País enfrenta uma grave crise econômica, com elevado índice de desemprego", alega.

Ainda segundo o texto, deve haver fiscalização e denúncias sobre maus tratos com animais, mas diz que "o desrespeito às normas de bem-estar animal não é, de forma nenhuma, a regra." "O produtor é o maior interessado no bem-estar dos animais comercializados. Permitir que os animais fiquem estressados, feridos ou mal alimentados é sinônimo de prejuízo econômico para o pecuarista e para os demais integrantes da cadeia produtiva", alega.

Procurada, a assessoria de Omar Aziz informou à reportagem que não conseguiu contato com os assessores que acompanham o projeto e que não saberia informar qual a posição do senador sobre o caso.

MPF defende que é ilegal

No ano passado, a exportação de animais vivos foi alvo de questionamento pelo MPF (Ministério Público Federal), que considerou a prática inconstitucional.

Em um parecer de maio de 2018, o procurador da República Sérgio Medeiros disse ser "simplesmente a vergonhosa desconsideração de toda e qualquer norma de proteção animal, tanto nacionais como internacionais, em troca de lucro, à custa da dor, sofrimento e crueldade", ao falar sobre exportação de bovinos.

Comércio

Segundo o Departamento de Agricultura dos EUA, 5,7 milhões de animais vivos devem ser exportados em todo o planeta.

Em 2018, o Brasil foi o terceiro maior exportador de animais vivos do mundo. Foram 810 mil bovinos, um recorde de acordo com a Mercy for Animals.

No mesmo ano, o país com maior aquisição de animais vivos foi a Turquia, com 70% dos bovinos exportados. Egito (13%) e Líbano (7%) vêm na sequência. Ainda em 2018, o principal estado de origem dos animais exportados foi o Pará, com 57% do total. Rio Grande do Sul (21%) e São Paulo (16%) aparecem na sequência.

Foi do Pará que, em outubro de 2015, o navio cargueiro "Haidar", de bandeira libanesa e que transportava 5.000 bois, afundou no cais do porto de Vila do Conde, município de Barcarena. A carga seria levada para a Venezuela.

Após ser encurralado, animal é esfaqueado em abatedouro no Oriente Médio - Divulgação/Mercy For Animals - Divulgação/Mercy For Animals
Após ser encurralado, animal é esfaqueado em abatedouro no Oriente Médio
Imagem: Divulgação/Mercy For Animals

Práticas aqui seriam ilegais

Segundo Sandra Lopes, diretora executiva da Mercy For Animals no Brasil, alguns países já adotaram a proibição. Ela explica que a forma como os animais brasileiros são tratados nesses países fere a lei nacional.

"Essas imagens mostram como os animais chegam de forma cruel nesses portos. No Oriente Médio, essa prática é comum, e eles são países de destino dos nosso animais. São práticas que, se fossem realizadas aqui, seriam consideradas ilegais", diz.

Lopes explica que não há como transportar animais vivos em condições minimamente dignas. "Quando a gente exporta, está permitindo um abate extremamente brutal. Isso é inaceitável. Mas mais que isso: não há uma maneira de fazer esse transporte com respeito ao mínimo de condições de bem-estar. A gente está pedindo, com essa investigação, que o Congresso aprove uma lei e proíba essa exportação independente de qual seja o país desses animais", afirma. "Eles ficam confinados, imersos nos próprios excrementos porque não tem como fazer higienização correta dentro do navio."

Além disso, ela critica a forma como é feita o abate nesses países. "Eles são mortos de forma consciente, sentem todas as dores. Mas importante dizer que eles sentem as dores também na viagem, em locais que não conseguem se mexer. Chegam lá extremamente sujos, em condições muito debilitantes, doentes. O sofrimento é extremo", complementa.

O UOL tentou contato e enviou e-mails, sem retorno, para a Associação Brasileira de Exportadores de Animais Vivos para que se pronunciasse sobre os argumentos da Mercy for Animals.

Em seu site, a entidade disponibiliza uma cartilha de bem-estar animal aos exportadores em que defendem que "nas fazendas onde ocorrem as compras dos animais e nos estabelecimentos de pré-embarque, a ciência do bem-estar animal determina que as mesmas devam garantir o acesso dos animais a comida e água fresca, manejo adequado, estruturas físicas adequadas, cuidados veterinários, programas sanitários, profissionais capacitados e comprometidos com o propósito do bem-estar, socialização e, mais recentemente, ao enriquecimento ambiental".

Durante o transporte —terrestre ou marítimo—, diz a cartilha, "deve-se garantir que o mesmo tenha acesso a um ambiente que tenha segurança, acesso a iluminação, ventilação, conforto, entre outros e que minimizem qualquer fator de stress de acordo com a peculiaridade de cada um."