Acho uma arrogância alguém pensar que é influenciador, diz Alexandre Garcia
Alexandre Garcia experimenta uma popularidade que não sentiu nem nos tempos de Globo. Gasta sorrisos e poses atendendo a pedidos de fotos no shopping, supermercado e aeroporto. No trânsito, motoristas abrem o vidro do carro para saudar o jornalista. Em geral pessoas que se identificam com as posições dele, alçado a porta-voz da direita.
Só faltou combinar com o próprio Alexandre Garcia.
Ele não se considera de direita. Vai mais longe. Acha uma bobagem enquadrar as pessoas em posições políticas.
O jornalista de 79 anos diz que defende seus ideais, apenas. Suas convicções ficaram mais visíveis por causa de um movimento profissional que alavancou o nome dele. Em dezembro do ano passado, Garcia deixou a Rede Globo após 30 anos de casa e investiu nas redes sociais.
Traçou como objetivo chegar a esta época do ano com 1 milhão de seguidores no Twitter. Está perto de dobrar a meta. São 1,9 milhão de seguidores. O canal do Youtube está perto de 900 mil inscritos e Garcia está construindo um estúdio.
Ousadia de um jornalista que quando criança subia no telhado de casa com um megafone para espalhar notícias da Guerra da Coreia. Ele também esteve em guerras.
Da Argentina, saiu fugido e neurótico por conviver com a violência.
Estrela agora na internet, Garcia diz que não vai virar "escravo da opinião alheia". Personalidade de quem aceitou tirar uma foto na cama quando era porta-voz do último presidente militar do Brasil e concordou em conceder a entrevista abaixo, que você lê no UOL.
UOL: Você é considerado uma das vozes da direita. Qual sua opinião sobre esta reputação?
Alexandre Garcia: Eu acho uma bobagem classificar as pessoas de esquerda e direita. Virou moda aqui no Brasil, a pessoa fala de bipolaridade. O que eu sigo é a ética, o que é bom para o país.
Então você não se considera de direita apesar de muitos assim falarem?
Porque muitos falam isto, não faz a menor diferença para mim. O que faz diferença para mim é o que eu penso a respeito do país, das pessoas, das boas relações, do progresso, a ética, o cumprimento das leis. Foi isso que aprendi com meu avô.
Mesmo assim você se tornou referência no YouTube e Twitter para muitos brasileiros com pensamento de direita. A aposta de trocar a TV aberta por redes sociais se provou correta?
Acho que fiz isso na hora certa. As redes sociais são a forma moderna de se comunicar. No YouTube e no Twitter eu tenho o retorno. Significa uma pesquisa permanente.
Você voltaria para televisão ou as redes sociais te seduziram?
Eu receio um pouco antes de falar porque eu não quero fechar portas. Neste momento, eu diria não porque estou gostando muito de onde estou. Dono do meu nariz, gravando na minha casa. Eu pretendo inaugurar em breve um estúdio que eu fiz no subsolo da minha casa.
Um estúdio bem profissional. Eu até fico meio receoso porque vou sair da biblioteca da minha casa e vou para um estúdio. Vou ter que explicar que é na minha casa, não é em nenhuma estação de televisão.
Você está tão convencido do acerto da decisão que está tirando dinheiro do bolso para investir na carreira solo?
Estou e não tem nenhum arrependimento. A carreira solo eu tinha previsto enquanto eu fui, durante décadas, crescendo no número de emissoras de rádios.
Eu pensava assim, os comentários nas emissoras de rádio me garantem a aposentadoria. Hoje, são 320 emissoras. Mas minha filha e pessoas mais jovens falaram 'tem que entrar no YouTube'. Lá fui eu e estou adorando.
Você se sente mais popular agora que quando estava na TV aberta?
Não vou fazer nenhuma tese, mas tenho sentido isto o ano inteiro. Circulo em shopping, supermercado e a reação tem sido muito maior do que eu recebi em tempos de televisão. Eu nunca recebi tanto cumprimento. E olha que eu passei quase 40 anos na televisão, na Manchete e na Globo.
O que você acha das pessoas com muitos seguidores nas redes sociais que se consideram influenciadores?
Acho um horror, uma bobagem, uma arrogância alguém achar que é influenciador. Eu quero ser informador. Dar informações para as pessoas tomarem decisões. Não sou dono da cabeça de ninguém, não tenho esta arrogância de achar que eu sou um influenciador.
Algumas posições suas geram críticas nas redes sociais como comentários sobre cotas universitárias e feminicídio. Você se incomoda com esta repercussão negativa?
Não incomoda. Se eu for ficar escravo de palpite alheio eu estou perdido. Eu tenho que ter fidelidade aos princípios e às minhas ideias.
Você está nas redes sociais, foi da televisão, mas antes trabalhou como porta-voz do presidente Figueiredo, o último militar no poder. Como avalia os 18 meses neste cargo?
Quando eu saí fui chamado de porta-voz da abertura. Promovi encontros de Brizola, Freitas Nobre, o líder da oposição, de Alceu Collares, líder do PDT com o presidente. Encontros secretos para fazer a abertura tranquila. Eu acho que prestei um bom trabalho nestes 18 meses que fiquei lá.
E também aprendi como funciona para o outro lado e isto sempre me ajudou a tirar conclusões porque a engrenagem do poder funciona sempre igual, seja quem for que estiver lá. Mas mantenho distância sanitária do poder. São 40 e tantos anos de Brasília e eu não me envolvo, não tenho intimidade, não aceito convites. Fico na minha.
Você já recebeu convites para ser candidato?
Já. Deus me livre. E já recebi [convites] desde o PT até o PFL [atual DEM]. Aqui em Brasília, inclusive a governador. Jamais entraria.
Também é deste período como porta-voz do presidente Figueiredo uma foto em que você aparece deitado na cama atendendo o telefone. Criou-se a história que você estava nu. A história é verdadeira?
Não, é errada. Eu tirei várias fotos de bermuda e naquela foto eu fui atender o telefone e fotógrafo botou um lençol para cima de mim e tirou a foto. Não causou problemas. Causou problemas quando inventam histórias e eu processo. Quando inventam diálogos que não estão na reportagem, quando inventam coisas que não estão na reportagem.
Alguns jornalistas tiveram que mostrar a foto onde eu estou com toalha, com isso ou aquilo e não encontraram. E não vão encontrar. Se olhar a reportagem original vai ver que não tem nada disto.
Seu pai era do rádio e seu avô desejava que você tivesse uma banca de advocacia. Como foi decidir a carreira a seguir?
Eu cheguei a pensar nesta banca de advocacia. Mas sempre acompanhei meu pai como redator de notícias, como repórter de rádio. Então foi genético. Quando eu era menino, subia no telhado da minha casa com um megafone para dar notícia da Guerra da Coreia. Eu ouvia no Repórter Esso e ia repetir no telhado. E eu sempre sonhei em estar envolvido numa grande aventura. Quando eu era menino, queria ser explorador na África.
E você encontrou estas aventuras no jornalismo?
Eu gostei muito das coberturas no Líbano, a guerra em Angola, a Guerra das Malvinas, ou Falkland, porque teve risco de vida e me deu uma grande emoção.
Cheguei a pilotar um avião sobre baterias [antiaéreas] cubanas em Angola porque o piloto apagou [desmaiou] e estávamos só eu e ele. Sobrevivi a uma descarga de um fuzil Kalashnikov [AK-47]. Foi no Líbano quando o sujeito descarregou o fuzil em minha direção. Sobrevivi a perseguição da polícia argentina.
Como você foi parar no comando de um avião no meio da África sob risco de ser abatido por mísseis cubanos?
Eu trabalhava na Manchete e precisava ir para o território do Jonas Savimbi, no território independente no Leste de Angola. Contratei um piloto escocês para me levar para lá. O voo foi clandestino e nós decolamos do deserto da Namíbia às quatro e meia da manhã. Só que ele, como bom escocês, chegou cheirando a uísque. E lá pelas tantas ele perguntou: 'sabe pilotar?' Respondi que tinha a mínima noção e ele falou 'então você vai pilotar porque eu não aguento mais e vou dormir'. Ele me deu o rumo e caiu.
Eu fui ganhando confiança. Fui subindo o nariz do avião, dando uma mexida na cauda, depois ia para um lado, ia para o outro. Tinha vento também, e eu sai do rumo. Quando ele acordou, a gente estava em cima de baterias [antiaéreas] de mísseis cubanos. Ele imediatamente passou a voar [na altura] da copa das árvores para que o radar não conseguisse nos detectar. Não fosse assim, não estaria aqui. Mas foi uma belíssima aventura.
Precisava coragem para entrar num avião com um piloto bêbado
Eu, na época, não estava casado, não tinha filho pequeno. Então estava valendo tudo.
Você também saiu fugido da Argentina por denunciar cobrança de propina da polícia, não foi?
Foi no tempo de correspondente em Buenos Aires pelo Jornal do Brasil. Me pediram uma reportagem sobre Mar del Plata para o caderno de turismo e eu fui para lá com meu carro de placa brasileira. O sujeito viu a placa brasileira, me pediu propina, inventou infrações que não existiam. Eu acabei pagando a propina. Aí eu denunciei numa parte da reportagem.
Me convocaram para depor em uma delegacia. O embaixador [brasileiro] disse 'não vá porque você vai para lá e vai sumir, há este risco.' O embaixador falou com um amigo dele, ministro da Economia, para tentar tirar este processo e o negócio aumentou. Ele me disse 'vem para cá, fica hospedado na Embaixada. Vamos ver se vai baixar a temperatura'.
Isto foi em 1976, eu sei porque foi de lá que eu fui para Brasília. Lá pelas tantas, o embaixador falou que eu não podia me manter na Embaixada porque eu não era refugiado político nem nada.
A saída de Buenos Aires foi tranquila?
Foi na ponte aérea para Montevidéu. A gente ia a pé [pela pista] até o avião naquela época. E eu olhando com medo que alguém atirasse em mim. Cheguei em Montevidéu e não tinha nada para fazer no resto do dia e fui ver o Woody Allen. Cinema quase vazio e um sujeito sentou do meu lado. Ficou cinco minutos e saiu. Fiquei o resto do filme procurando o explosivo gelatinoso com temporizador para explodir embaixo do banco ao meu lado.
Eu estava neurótico de Argentina. Eu estava lá havia três anos e via os ataques de guerrilheiros, de terroristas. No bar abaixo do escritório do Jornal do Brasil na [rua] Florida botaram uma bomba igual a esta. Gruda a bomba embaixo da mesa de uma lanchonete e explode. Vem o bombeiro para lavar o sangue que escorre no meio fio.
Isto eu via todo dia na Argentina. Cheguei a Brasília neurótico. Eu estava numa churrascaria e um sujeito se aproximou de mim com uma bolsa de lona, tênis, calça jeans e botou a mão na bolsa. Óbvio que para mim era uma granada. Eu empurrei a mesa para cima do sujeito. O coitado queria me vender uma garrafa de mel.
Demorei a retomar o prumo.
Você viveu suas aventuras, esteve 30 anos na maior emissora do país e está indo bem nas redes sociais. Quais os planos para os próximos anos?
Espero que eu termine o ano chegando bem pertinho de 1 milhão de seguidores no YouTube e 2 milhões no Twitter. E continuar fazendo o que estou fazendo. Eu não tenho nenhuma vontade de contar que estou feliz ou não estou feliz. Eu estou normal e estou vivendo a vida.
ID: {{comments.info.id}}
URL: {{comments.info.url}}
Ocorreu um erro ao carregar os comentários.
Por favor, tente novamente mais tarde.
{{comments.total}} Comentário
{{comments.total}} Comentários
Seja o primeiro a comentar
Essa discussão está encerrada
Não é possivel enviar novos comentários.
Essa área é exclusiva para você, assinante, ler e comentar.
Só assinantes do UOL podem comentar
Ainda não é assinante? Assine já.
Se você já é assinante do UOL, faça seu login.
O autor da mensagem, e não o UOL, é o responsável pelo comentário. Reserve um tempo para ler as Regras de Uso para comentários.