Depoimentos de ministros confirmam resistência de Moro para troca na PF
O chefe do Gabinete de Segurança Institucional, general Augusto Heleno, disse ontem, em depoimento à Polícia Federal, que sabia do impasse entre Jair Bolsonaro (sem partido) e Sergio Moro em relação ao comando da PF. O militar afirmou que "nunca entendeu" o motivo da insatisfação do ex-ministro da Justiça e Segurança Pública.
"Ressaltando que nunca entendeu o motivo da rejeição obstinada do então ministro Moro à troca do diretor-geral", disse Heleno, segundo a transcrição de seu depoimento, ao qual o UOL teve acesso.
Também ministro palaciano, Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) disse aos investigadores considerar "evidente" o aborrecimento de Moro com o interesse de Bolsonaro em substituir a chefia da Polícia Federal. Ele afirmou ainda que, por iniciativa própria, tentou contornar a situação e chegou a ligar para o ex-ministro da Justiça em busca de uma solução. O telefonema teria ocorrido sem o conhecimento do presidente.
Segundo Ramos, o ex-juiz da Lava Jato "deixou de forma contundente e clara que indicaria apenas o nome do delegado de polícia Disney Rosseti, e que além disso não aceitaria mais ouvir falar da troca de superintendentes ou de diretor-geral".
Moro acusa Bolsonaro de tentar intervir no trabalho da PF por interesse pessoal. Diante da resistência do ex-ministro, segundo relatou ele ao pedir demissão, o mandatário teria feito ameaça de demiti-lo caso a troca na direção-geral não fosse efetivada.
A insatisfação de Bolsonaro com a gestão da Polícia Federal teria começado um ano antes, quando ele tornou pública a sua vontade de trocar a chefia da superintendência da instituição no Rio de Janeiro — reduto político da família do presidente. A mudança esbarrou no ex-diretor-geral, o delegado Maurício Valeixo, um dos homens de confiança de Moro.
A PF fluminense conduz casos que são sensíveis para Bolsonaro e que podem eventualmente gerar problemas para ele. Um deles envolvia um dos filhos, o senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) e seu ex-assessor Fabricio Queiroz — trata-se de suposto esquema de rachadinha (desvio de salários de funcionários) na Assembleia Legislativa do Rio, onde o parlamentar exerceu mandato de deputado estadual.
Ao deixar o governo, Moro disse que o momento no qual foi ameaçado de demissão por Bolsonaro ocorreu em uma reunião ministerial realizada no dia 22 de abril. Como o encontro foi filmado à época, a defesa do ex-ministro solicitou que as imagens fossem divulgadas à sociedade. O STF (Supremo Tribunal Federal) abriu inquérito para apurar o caso. Ramos, Heleno e o também ministro Walter de Souza Braga Netto (Casa Civil) prestaram depoimento ontem no âmbito dessa investigação.
"Vão cair do cavalo", diz Bolsonaro
Bolsonaro voltou a negar hoje ter feito qualquer referência literal à Polícia Federal no vídeo da reunião ministerial de 22 de abril.
A declaração do presidente diverge do depoimento de Ramos, que disse aos investigadores ter ouvido o presidente se manifestar "de forma contundente sobre a qualidade dos relatórios de inteligência produzidos pela Abin [Agência Brasileira de Inteligência], Forças Armadas, Polícia Federal, entre outros".
Na avaliação de Bolsonaro, o subordinado se enganou ao depor ontem na PF. "Ramos se equivocou. Mas como é reunião, eu tenho o vídeo", disse ao deixar o Palácio da Alvorada na manhã de hoje.
Ainda de acordo com o mandatário, quem o acusar de mentir vai "cair do cavalo".
"Vão cair do cavalo sobre o vídeo. Eu não falo 'Polícia Federal', não existe a palavra 'federal' em todo o vídeo", alegou. "Não existe a palavra superintendência. Não existe a palavra investigação sobre filhos."
Segundo apurou o UOL, o apego à literalidade é uma das estratégias que Bolsonaro utilizará para se defender das acusações de Moro. Ontem, pessoas que viram o vídeo da reunião relataram que o presidente citou suposta perseguição à sua família para justificar a necessidade de promover mudanças em unidades regionais da PF.
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