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Com Cabral, advogado de Flávio negou propina até o fim e saiu após delação

Advogado Rodrigo Roca - Divulgação
Advogado Rodrigo Roca Imagem: Divulgação

Hanrrikson de Andrade

Do UOL, em Brasília

23/06/2020 18h59Atualizada em 23/06/2020 19h03

Ex-defensor de Sergio Cabral (MDB) nos processos da operação Lava Jato no Rio de Janeiro, o advogado Rodrigo Roca, recém-contratado pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) para substituir Frederick Wassef em sua defesa, era contra o acerto de delação por parte do ex-governador fluminense. A colaboração premiada foi firmada em dezembro de 2018.

A estratégia montada por Roca era negar até o fim o recebimento de propina, isto é, crime de corrupção passiva contra Cabral. Ele orientou o emedebista a agir com frieza e se limitar aos aspectos técnicos de cada processo, sustentando a tese de que as dezenas de acusações contra o ex-governador derivavam dos mesmos fatos.

A expectativa era que que bastaria vencer em uma das ações para, por extensão lógica, reivindicar a falta de legitimidade dos argumentos do MPF (Ministério Público Federal) nas outras acusações.

Durante pouco mais de um ano em que Roca esteve com Cabral (entre 2017 e 2018), o ex-governador seguiu as recomendações do defensor e, a cada audiência na 7ª Vara, negava ter sido beneficiário de propina. Por outro lado, por orientação do advogado, assumiu ter feito caixa dois — crime eleitoral, de menor gravidade, com punição limitada a cinco anos de prisão. Já a corrupção passiva pode render até 12 anos de cadeia.

Advogados que atuaram junto aos processos da 7ª Vara relatam que a estratégia era colocar Cabral na condição de um político que, tal como muitos outros no país, teria utilizado parte dos recursos de campanha para fins pessoais.

Cabral se manteve firme durante o ano de 2018, sempre repetindo que a tese de recebimento de propina era uma invenção do MPF (Ministério Público Federal). Porém, pouco a pouco, o acúmulo de condenações decididas pelo juiz Marcelo Bretas mexeu com o lado emocional de Cabral, segundo o relato de pessoas do convívio do ex-governador à época.

Quando Cabral aceitou fazer delação, as penas do político já ultrapassavam os 197 anos de prisão. Naquele momento, Roca julgou que a decisão do ex-governador não era coerente com a estratégia que ele havia desenhado e optou pela destituição.

O ex-governador do Rio Sérgio Cabral  - Reprodução de vídeo - Reprodução de vídeo
27.abr.2017 - O ex-governador do Rio Sérgio Cabral
Imagem: Reprodução de vídeo

Interlocutores do advogado afirmam que, mesmo fora do caso, ele ainda acreditava ser possível provar a inocência de Cabral em relação a recebimento de propina e que o emedebista só teria topado a colaboração por desespero.

"Vou deixar a defesa, sim. Não compactuo e não atuo em delações, premiadas ou não. Mas não houve desentendimento e sim, um consenso sobre a necessidade da minha saída para ingresso de outro colega", afirmou Roca em dezembro de 2018.

A reportagem do UOL tentou entrar em contato com o advogado, mas não obteve resposta dele até o momento. Auxiliares de Flávio Bolsonaro dizem que Roca foi orientado a não falar com a imprensa até segunda ordem.

Temperamento oposto ao de Wassef

O advogado Frederick Wassef - Bruno Santos/Folhapress - Bruno Santos/Folhapress
O advogado Frederick Wassef
Imagem: Bruno Santos/Folhapress

Se antes Flávio Bolsonaro tinha um defensor, Frederick Wassef, afeito a declarações polêmicas à imprensa e temperamento forte e reativo, hoje o senador é defendido por um profissional tido como mais "paz e amor", segundo definiu um advogado ouvido pela reportagem.

Roca é visto como uma profissional calmo, atento e respeitoso no trato com magistrados e colegas. No momento de maior tensão entre Cabral e o juiz Marcelo Bretas, Roca advertiu o cliente de que ele não poderia fazer acusações infundadas contra o titular da 7ª Vara Federal, tampouco se referir à família do magistrado para formular qualquer argumento em sua defesa.

Em interrogatório realizado no âmbito de uma ação penal que apurava crime de lavagem de dinheiro a partir de compra de joias da H.Stern, Cabral declarou que a família de Bretas teria entrosamento com o assunto porque "vendia bijuterias".

O juiz Marcelo Bretas - UOL - UOL
O juiz Marcelo Bretas
Imagem: UOL

O juiz repreendeu a defesa de Cabral, dizendo que se sentia ameaçado pela afirmação. Findada a discussão, o magistrado autorizou a transferência de Cabral para um presídio federal, atendendo a pedido do MPF (Ministério Público Federal). O pedido foi feito porque Cabral mencionou informações pessoais a respeito de Bretas, sobre as quais ele supostamente não deveria ter tido acesso.

Na ocasião, Roca disse que aquela não era uma forma adequada de falar com um juiz e orientou o ex-governador a rever sua postura. Posteriormente, Cabral pediu desculpas a Bretas.