Caso Queiroz: "Decisão foi técnica e imparcial", diz defesa de F. Bolsonaro
Resumo da notícia
- Defesa classificou como "descabida" uma possível reclamação do MP-RJ
- O MP pede anulação de acórdão e quer que investigações voltem à primeira instância
- TJ determinou que investigação de suposta rachadinha vá para Órgão Especial
- Investigação resultou na prisão do ex-assessor Fabrício Queiroz
A defesa do senador Flávio Bolsonaro (Republicanos-RJ) se posicionou hoje à noite após o Ministério Público entrar com reclamação no STF (Supremo Tribunal Federal) para reverter a decisão da 3ª Câmara Criminal do Tribunal de Justiça do Rio. "Decisão foi técnica e imparcial", rebateu, em nota enviada pela advogada Luciana Pires. A defensora classificou como "descabida" uma possível reclamação do MP-RJ (Ministério Público do Rio).
O TJ-RJ (Tribunal de Justiça do Rio) aceitou na última quinta-feira (25) o pedido do político para que o suposto esquema de rachadinha na Alerj (Assembleia Legislativa do Rio) deixe a 1ª instância e vá para o Órgão Especial do TJ-RJ. O MP, que também pede a anulação do acórdão, quer que as investigações voltem à supervisão do juiz Flávio Itabaiana, da 27ª Vara Criminal, que determinou a prisão de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio.
Segundo o MP-RJ, político é investigado por crimes como peculato (apropriação ou desvio de dinheiro público), lavagem de dinheiro e organização criminosa por suposto envolvimento em esquema de rachadinha, quando servidores devolvem parte dos seus salários.
Em nota, a advogada Luciana Pires negou que o político tenha sido privilegiado com a mudança de competência do processo. "Ao invés de ser avaliada por um único juiz ele será analisado por 25 (...). Qualquer possível reclamação do Ministério Público é descabida", diz um dos trechos do texto.
"A decisão (...) foi técnica e imparcial. A Justiça apenas fez cumprir um direito que havia sido negado ao parlamentar", explica, no texto.
A expectativa da defesa, segundo a nota, é que a demanda seja "estancada liminarmente".
Abaixo, a nota na íntegra:
"A decisão que levou o caso do senador Flávio Bolsonaro para o órgão especial foi técnica e imparcial. A Justiça apenas fez cumprir um direito que havia sido negado ao parlamentar. Com a mudança de foro, ele não obteve qualquer tipo de privilégio. Ao invés de ser avaliado por um único juiz, ele será analisado por 25. Neste caso, qualquer possível reclamação do Ministério Público é descabida. A expectativa da defesa é de que a demanda seja estancada liminarmente. Somente as decisões com efeito erga omnes [expressão no meio jurídico para indicar efeitos de ato ou lei que atinge todos os indivíduos] proferidas pelo Plenário ou em casos de controle concentrado de constitucionalidade possuem a força pretendida pelo MP".
Vitória de Flávio desrespeita STF, diz MP
Segundo o MP-RJ, o julgamento que concedeu foro especial ao político, "desrespeitou decisões monocráticas e colegiadas da Corte Suprema". O pedido de liminar, encaminhado ao ministro Dias Toffoli, presidente do STF, enfatiza decisão de 2018 do próprio Supremo que restringe o foro privilegiado a políticos que estejam no exercício do mandato —no caso do hoje senador Flávio Bolsonaro, a suposta rachadinha em seu gabinete na Alerj teria ocorrido enquanto ele era deputado estadual.
O MP-RJ requer a autorização para a continuidade das investigações contra Flávio Bolsonaro pelos fatos ocorridos enquanto deputado estadual, em primeiro grau, com a atribuição do Grupo de Atuação Especializada no Combate à Corrupção e sob a supervisão das medidas do Juízo da 27ª Vara Criminal da Capital
Um dos trechos de nota do MP-RJ
O MP-RJ defende que a decisão do TJ-RJ usurpou a competência da Suprema Corte e estendeu o foro para "ex-ocupante do cargo de deputado estadual".
"O MP-RJ busca garantir a autoridade e a eficácia da decisão proferida pelo ministro Marco Aurélio Mello (...) que estipulou que o senador Flávio Bolsonaro não possui foro por prerrogativa de função concernente a fatos investigados pelo MP-RJ", diz o documento.
"Primeira medida foi alegar que possuiria foro", diz MP
O MP-RJ se refere à decisão do ministro Marco Aurélio de fevereiro de 2019, que negou seguimento a uma reclamação apresentada pela defesa de Flávio Bolsonaro. Na época, o político alegou ter foro privilegiado após ser notificado para prestar depoimento ao MP-RJ.
Com isso, a investigação prosseguiu sob a supervisão da 27ª Vara Criminal do Rio. Contudo, o MP-RJ aponta que os advogados do político impetraram o HC mesmo sabendo da decisão do STF.
Em 28 de agosto de 2019, os advogados do senador, apesar de cientes da decisão do STF sobre a inaplicabilidade da prerrogativa de foro, impetraram o HC perante o TJ-RJ alegando que caberia ao Órgão Especial do TJ-RJ julgar o atual senador da República, pois os fatos investigados foram praticados durante o exercício do mandato de deputado estadual, apesar do mandado já findado
MP-RJ, em comunicado sobre a reclamação
A reclamação é um tipo de ação apresentada diretamente ao STF sob o argumento de que outro tribunal teria desrespeitado decisão do Supremo. Com isso, o MP-RJ tenta fazer com que a questão seja definida pela última instância do Judiciário, evitando recursos a instâncias intermediárias da Justiça.
O julgamento de Flávio Bolsonaro também motivou a Rede Sustentabilidade a formalizar na sexta (26) uma ação direta de inconstitucionalidade no STF para que o caso volte à 1ª instância.
No habeas corpus aceito pela 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ, a advogada Luciana Pires, que representa Flávio Bolsonaro, argumentou que o político não perdeu o foro especial, já que deixou de ser deputado estadual para assumir o cargo como senador, em Brasília.
Vitória de Flávio Bolsonaro gera debate
A questão ainda gera discussões entre juristas ouvidos pelo UOL.
Há precedente no Supremo. Acredito que será relativamente fácil que consigam justificar o recurso e reverter a decisão. Se tivesse que apostar apostaria nisso, embora saiba que decisão judicial sempre possa ser surpreendente
Thiago Bottino, advogado
Bottino, professor da FGV Direito Rio, discorda da tese apresentada pela defesa. "Se [o suposto crime] não está relacionado com o mandato, quem julga é o juiz de primeiro grau. Pela lógica da defesa, quem seria competente para julgar seria o Supremo, e não o Órgão Especial do TJ", argumenta.
Fotos de Queiroz em Atibaia (SP)
O criminalista Ary Bergher, entretanto, acredita que a tese sustentada pela defesa de Flávio Bolsonaro pode fazer com que a própria jurisprudência seja reavaliada.
A tese é interessante e pode ser acolhida do ponto de vista técnico. É correto ele permanecer com o foro porque o suposto crime foi praticado em razão da função. E ele [Flávio Bolsonaro] foi eleito para um mandato de maior relevância. Então, não houve interrupção entre os mandatos. Por isso, ele não pode perder aquele benefício. Jurisprudência também é feita para ser revista
Ary Bergher, advogado
O advogado Pedro Serrano, professor de Direito Constitucional da PUC-SP, discordou da decisão dos desembargadores da 3ª Câmara Criminal do TJ-RJ. "Com todo o respeito, divirjo do mérito da decisão. A jurisprudência do Supremo não deixa dúvida. Como não ocupa mais o cargo de deputado, ele [Flávio Bolsonaro] tem que ser julgado como cidadão comum, em primeira instância. Mesmo que hoje seja senador", argumenta.
Serrano também criticou um problema que entende ser recorrente na Justiça brasileira: o excesso de interpretação na hora de julgar.
Não temos coerência. O Supremo decide como norma, mas os tribunais não cumprem. Isso cria um problema para a jurisprudência brasileira, que acaba tendo casos iguais julgados de maneira diferente. Isso ocorre porque o juiz decide como ele acha justo, e não como o sistema jurídico determina
Pedro Serrano, advogado
Para o criminalista Luiz Flávio D'Urso, ex-presidente da OAB-SP, o resultado do recurso é imprevisível. "A decisão poderá ser revogada. Mas isso vai depender dos argumentos e de quem vai julgar".
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