Após sucessivos desgastes, Fux inicia 2021 sob oposição de colegas no STF
Sob a presidência do ministro Luiz Fux, o Supremo Tribunal Federal (STF) vai retomar as atividades em fevereiro depois de um movimento atípico, em que parte dos ministros decidiu continuar trabalhando durante o período de férias.
A decisão de Marco Aurélio, Ricardo Lewandowski, Alexandre de Moraes e Gilmar Mendes é um sintoma de desgaste de Fux entre os colegas, mas não é o único. Foi interpretada como uma tentativa de esvaziar o poder de Fux de tomar decisões sozinho durante o período, apesar dos argumentos apresentados por eles publicamente.
Durante o recesso, cabe ao plantonista julgar demandas urgentes que cheguem à corte. A primeira metade do plantão é feita pelo presidente do Supremo e a outra, pela vice-presidente, a ministra Rosa Weber.
No ano passado, quando ainda era vice-presidente da corte, Fux aproveitou o plantão do recesso para dar um prazo indefinido a uma suspensão que o então presidente do STF, Dias Toffoli, tinha fixado valer por apenas seis meses. Tratava da implementação do juiz de garantias, criado no pacote anticrime aprovado pelo Congresso.
A insatisfação com Fux é mais perceptível entre ministros da ala garantista do STF, como Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio.
Para o advogado criminalista Augusto Botelho, há uma tendência no STF de que as divergências migrem para o campo pessoal, o que é ruim para a imagem da corte. Segundo Botelho, divergências durante as votações são normais, até certo ponto.
"O que eu venho percebendo no Supremo de uns anos para cá é, de certa forma, um acirramento dessa divergência saindo do campo do julgamento para o campo pessoal. Aí um problema começa", avalia.
Para o criminalista, o perfil do presidente do STF alimenta esse tipo de acirramento. "Eu vejo que a presidência do ministro Luiz Fux já vem começando como presidência pouco conciliadora, isso é preocupante", diz Botelho. "Cabe ao presidente contribuir com o clima ameno no Supremo, a figura do presidente do STF deve ter essa postura de conciliação, para o bem do país", diz.
Exoneração de médico é mais um fator de desgaste
O fator mais recente de desgaste do presidente do Supremo foi a exoneração do médico Marco Polo Freitas, servidor da corte que pediu a reserva de vacinas para servidores do STF. Após defender publicamente o pedido feito para a reserva das doses, Fux mudou o discurso, disse estar "em choque" com o ocorrido e demitiu o servidor.
Integrantes do Supremo enxergaram na demissão do médico uma tentativa de achar um "bode expiatório" para acalmar a opinião pública. Freitas, por sua vez, disse que nunca realizou "nenhum ato administrativo sem ciência e anuência" dos seus superiores hierárquicos.
Pelo menos três ministros saíram em defesa do servidor publicamente: Gilmar Mendes, Marco Aurélio e Ricardo Lewandowski. "Fica no ar a pergunta: a corda estourou no lado mais fraco?", questionou Marco Aurélio em entrevista ao jornal O Estado de S. Paulo.
Marco Aurélio também enviou um ofício a Fux no dia 31 de dezembro dizendo estranhar que que duas reportagens sobre o assunto não tenham sido incluídas no clipping diário produzido pelo STF.
Desgaste desde a posse
Fux assumiu a presidência do STF em setembro do ano passado e acumula desgastes entre os colegas desde a posse. A cerimônia foi realizada de forma presencial, em meio à pandemia de coronavírus, e acabou com um saldo de nove autoridades diagnosticadas com a doença após o evento.
Um mês depois, Fux derrubou uma liminar do ministro Marco Aurélio, que determinou a soltura do traficante "André do Rap". O presidente do Supremo foi chamado de "autoritário" por Marco Aurélio.
Apesar de o plenário confirmar a decisão de Fux no episódio, o julgamento foi marcado por indiretas ao presidente da corte. "Melhor será que o tribunal seja supresso e haja só um presidente", criticou Gilmar Mendes durante o julgamento.
O clima voltou a esquentar com o resultado do julgamento que impediu a reeleição dos presidentes da Câmara e do Senado. O episódio acabou afastando ainda mais as alas garantista e punitivista do tribunal e intensificando a crise interna.
Fux foi o último a votar e definiu o resultado, contra a possibilidade de reeleição. A ala garantista se sentiu exposta com o posicionamento do presidente da corte, já que se imaginava que o resultado seria o oposto. O presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), já dava como certa sua reeleição e nem se preocupava em fazer um sucessor até o resultado do julgamento.
A partir do episódio, a ala garantista do tribunal não descarta tentar impor derrotas a Fux para minar o poder do presidente do STF dentro do tribunal. A recusa dos ministros em sair de férias durante o recesso faz parte dessa estratégia.
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