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CPI da Covid tem semana ainda mais nervosa com falas de Pazuello e Ernesto

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello é um dos depoentes mais esperados por senadores na CPI da Covid - EDU ANDRADE/FATOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello é um dos depoentes mais esperados por senadores na CPI da Covid Imagem: EDU ANDRADE/FATOPRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

Luciana Amaral e Hanrrikson de Andrade

Do UOL, em Brasília

16/05/2021 04h00

Após contar com xingamentos e até ameaça de prisão nos últimos dias, a CPI da Covid deve ter uma semana ainda mais nervosa com os depoimentos do ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e do ex-ministro das Relações Exteriores Ernesto Araújo.

A presença mais esperada e que causa maior apreensão no Planalto é a do general Pazuello, prevista para quarta-feira (19). Na sexta (14), Pazuello conseguiu no STF (Supremo Tribunal Federal) o direito de permanecer em silêncio, isto é, de não responder a perguntas que possam, de alguma forma, incriminá-lo. O ex-ministro está proibido, porém, de mentir sobre todos os demais questionamentos.

A decisão do ministro Ricardo Lewandowski foi em resposta a um habeas corpus pedido pela AGU (Advocacia-Geral da União). O Planalto busca proteger Pazuello por entender que sua eventual fala à CPI pode revelar elementos que levem à incriminação do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e de outros integrantes do governo por supostos erros no enfrentamento à pandemia.

O relatório final da CPI, sob responsabilidade de Renan Calheiros (MDB-AL), cada vez mais em rota de colisão com Bolsonaro, pode ser compartilhado com o Ministério Público Federal para que o órgão promova a responsabilização civil e criminal dos infratores. O documento precisa ser aprovado pelos membros da CPI, em que os governistas são minoria. Estes já cogitam elaborar um relatório paralelo.

No depoimento do ex-secretário de Comunicação Fabio Wajngarten, Renan pediu a prisão do depoente por entender que ele estava mentindo à CPI, o que não é permitido. Apesar de o pedido ter sido considerado exagerado até por parte de senadores de oposição e negado pelo presidente da comissão, Omar Aziz (PSD-AM), a possibilidade de o ato se repetir com Pazuello preocupou o Planalto.

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), afirmou que Pazuello, "lamentavelmente, se esconde atrás de um habeas corpus" e que a decisão do Supremo será respeitada. No entanto, ressaltou que seu depoimento não será o único meio pelo qual buscarão "a verdade".

Renan afirmou que a decisão de Lewandowski não atrapalha a investigação e que "interrogatório bom não busca confissões", mas, sim, "acusações sobre terceiros". "Com relação a ele, outros falarão."

Alessandro Vieira (Cidadania-SE), também membro da CPI, disse que a comissão deve proceder com o depoimento ressaltando os pontos que Pazuello "tem tanta necessidade de esconder" e buscar esclarecê-los por outras vias, como a quebra de sigilos.

Ainda que tenha o direito de não responder a todas as perguntas, Pazuello deverá ser duramente questionado por supostas omissões na compra de vacinas, pela distribuição de cloroquina —apesar de estudos não comprovarem a eficácia do remédio para o tratamento da covid-19— e pela crise aguda no Amazonas no início deste ano, em que faltou até oxigênio hospitalar para pacientes internados, por exemplo.

O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e o presidente Jair Bolsonaro - Evaristo Sá/AFP - Evaristo Sá/AFP
O ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello e o presidente Jair Bolsonaro
Imagem: Evaristo Sá/AFP

Pazuello foi o ministro da Saúde que mais tempo ficou no cargo no governo Bolsonaro —cerca de dez meses— e é visto por senadores independentes e oposicionistas como o mais subserviente ao presidente da República, com discurso de tom negacionista. Pazuello chegou a falar que "um manda, o outro obedece" após ser desautorizado publicamente por Bolsonaro na crise da compra da vacina CoronaVac.

Parte dos integrantes da CPI considera que a munição de senadores contra o governo aumentou com o depoimento de Wajngarten e do gerente-geral da Pfizer na América Latina, Carlos Murillo.

Embora o Ministério da Saúde estivesse conversando desde maio do ano passado com a Pfizer, ambos confirmaram que a farmacêutica enviou uma carta pedindo celeridade nas negociações e se colocando à disposição do governo. Ela ficou dois meses sem resposta.

O documento foi endereçado ao presidente Jair Bolsonaro, ao vice Hamilton Mourão (PRTB), a três ministros —incluindo Pazuello— e ao embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Nestor Forster.

O CEO da Pfizer também mostrou que o governo federal ignorou três ofertas de vacinas da farmacêutica em agosto e não aceitou outras duas em novembro e mais uma em fevereiro.

Para a oposição, a gestão de Pazuello foi omissa enquanto integrantes do governo estimulavam o "tratamento precoce" contra a covid-19 com medicamentos de eficácia ainda duvidosa contra a doença. Governistas defendem que a União lutou contra cláusulas "leoninas" e foi cautelosa em não comprar a vacina sem aprovação da Anvisa (Agência Nacional de Vigilância Sanitária).

Para parte de senadores independentes e de oposição, Pazuello já vinha tentando evitar falar à CPI. Originalmente, seu depoimento estava previsto para 5 de maio. No entanto, a fala foi adiada após ele alegar ter tido contato com pessoas com a covid-19.

Os senadores preferiram não realizar um depoimento virtual e remarcaram a fala para a próxima quarta —quando a suposta quarentena de Pazuello terá completado 14 dias.

Suposta porque, no último dia 6, Pazuello recebeu pessoalmente o ministro da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, em Brasília. O ministro foi escalado como um dos principais articuladores para programar a estratégia de defesa do governo na Comissão Parlamentar de Inquérito.

O Exército também teme que Pazuello manche a imagem dos militares, especialmente por ainda ser da ativa. Há inclusive uma expectativa quanto à roupa de Pazuello na CPI: se utilizará farda, para tentar passar uma imagem de força como general, ou terno comum, para responder por suas atitudes ao menos "vestido como civil".

CPI ainda ouvirá Ernesto e "capitã cloroquina"

Antes mesmo de Pazuello, na terça (18), Ernesto Araújo deve ser duramente questionado e criticado por senadores na CPI. Ele não conta com a simpatia nem dos governistas, mas não deve ser exageradamente alvejado por estes para que a ação não respingue no Planalto.

Após ser duramente criticado por senadores em audiência, a situação de Ernesto Araújo à frente do Itamaraty ficou insustentável e ele foi substituído - José Cruz/Agência Brasil  - José Cruz/Agência Brasil
Após ser duramente criticado por senadores em audiência, a situação de Ernesto Araújo à frente do Itamaraty ficou insustentável e ele foi substituído
Imagem: José Cruz/Agência Brasil

Ao longo da pandemia, Ernesto fez críticas à China enquanto o Brasil dependia de um bom relacionamento com o país asiático para a chegada de insumos e vacinas. Na avaliação de grande parte dos senadores, Ernesto não acionou o Itamaraty como deveria para pedir ajuda a outros países. A diplomacia sob sua gestão, como um todo, foi severamente contestada, até dentro do ministério.

Reportagem da Folha de S.Paulo mostrou que, mesmo após alertas sobre a cloroquina, Ernesto mobilizou o Itamaraty para garantir o fornecimento do medicamento ao Brasil. Outro fato criticado por políticos foi a viagem de Ernesto e comitiva a Israel para conhecer detalhes de uma vacina em teste e de spray nasal contra a covid-19. A visita foi estimada em ao menos R$ 400 mil, como revelou o UOL, e não resultou em nenhum acordo.

Por fim, a CPI recebe na quinta (20) a secretária de Gestão do Trabalho e da Educação na Saúde do Ministério da Saúde, Mayra Pinheiro, também conhecida como "capitã cloroquina", pela defesa veemente que faz do remédio.

Quando o sistema de saúde do Amazonas estava prestes a entrar em colapso, Mayra visitou o estado em comitiva e já pressionou pelo uso de medicamentos de eficácia não comprovada contra a covid-19.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.