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Relator do caso Arthur do Val pede cassação de mandato após áudio sexista

O deputado Arthur do Val no plenário da Assembleia Legislativa de SP  - Divulgação/Alesp
O deputado Arthur do Val no plenário da Assembleia Legislativa de SP Imagem: Divulgação/Alesp

Leonardo Martins

Do UOL, em São Paulo

07/04/2022 04h00Atualizada em 07/04/2022 17h26

O deputado estadual Delegado Olim (PP-SP) defendeu a cassação do mandato do deputado estadual Arthur do Val (União Brasil-SP), em relatório enviado hoje (7) ao Conselho de Ética da Alesp (Assembleia Legislativa de São Paulo). Olim é relator no processo aberto depois do vazamento de áudios sexistas enviados por Do Val sobre mulheres ucranianas.

Em seu parecer, Olim rebateu alegações da defesa de Arthur e ressaltou que o ex-youtuber é "reincidente em faltas disciplinares". Agora, o relatório será lido e analisado pelos outros oito membros do colegiado em sessão na próxima terça-feira (12), a partir das 14h. Em nota, Do Val disse que recebe o relatório "com tranquilidade" e alegou que seus comentários "não constituem crime" (leia mais abaixo).

Nas gravações, o deputado, conhecido como Mamãe Falei, disse que as mulheres ucranianas "são fáceis porque são pobres". Ele reconhece as frases como "repulsivas" e "grotescas", mas a defesa alega que o parlamentar enviou os áudios a grupos privados, que estava licenciado do cargo e em outro país.

O resultado da votação do parecer será encaminhado ao plenário da Alesp. Os deputados estaduais poderão, então, rever ou não a decisão do Conselho de Ética. As punições previstas são:

  • advertência,
  • censura verbal ou escrita,
  • perda temporária do mandato ou perda de mandato.

Segundo a presidente do conselho, deputada Maria Lúcia Amary (PSDB) os deputados podem votar em consenso ou em separado.

O voto em separado é a possibilidade de outros parlamentares do Conselho de Ética pedirem uma revisão para diminuir ou aumentar a punição do acusado, apesar do posicionamento do relator.

Amary reafirmou a tendência pela extinção do mandato de Do Val. "Existe uma tendência [de que Arthur seja cassado], mas não posso confirmar pois não conversei com os deputados", disse ao UOL.

'Medida disciplinar de perda do mandato'

Em seu relatório, Olim chamou a ação de Arthur do Val de "flagrantemente atentatórias ao decoro parlamentar".

"Assim, sem mais digressões, estando evidenciada a gravidade das condutas do representado, flagrantemente atentatórias ao decoro parlamentar, conclui-se este parecer com a proposta —que não pretende ser exaustiva, mas pode e deve ser completada pelos nobres pares —de que, tramitado por completo o feito, pelas razões que encerra e pelas disposições emanadas nos dispositivos legais invocados, seja aplicada ao Deputado Arthur Moledo do Val a medida disciplinar de perda do mandato", escreveu o parlamentar do PP em sua conclusão.

Delegado Olim ressaltou o que chamou de prejuízo à imagem da própria assembleia com as falas de Arthur.

Superado este ponto, clama-se por uma exemplar e máxima punição por terem sido lançadas máculas por toda esta Casa de Leis e devido ao fato de o proceder do representado ter enodoado [sinônimo de 'manchado'] ao maior parlamento da América Latina, que teve assim seu nome e sua reputação envolvida diretamente em atos de um de seus membros."
Relatório apresentado pelo deputado Delegado Olim

O fato de Arthur do Val já ter contabilizado duas advertências anteriores, do mesmo Conselho de Ética, também foi lembrado por Olim. "Os critérios de apenamento devem, em nosso parecer, serem agravados pela circunstância de que o representado é reincidente em faltas disciplinares", diz um trecho do relatório.

Arthur do Val chegou a pedir judicialmente ao Conselho de Ética, na última terça-feira (5), que fosse realizada uma perícia nos áudios vazados —para identificar se houve edição ou alteração.

A solicitação foi negada. Além do próprio parlamentar, a sua ex-namorada, Giulia Blagitz, prestou depoimento ao Conselho de Ética nesta semana e confirmou que os áudios eram de Mamãe Falei.

Hoje, a defesa de Do Val entrou com ação judicial no Tribunal de Justiça de São Paulo pedindo a paralisação do processo até que seja feita uma perícia dos áudios. O caso ainda não foi analisado.

'Arthur do Val não tem dúvida'

Em nota divulgada após a entrega do relatório, Arthur do Val não falou sobre a perícia do áudio. Disse ter recebido o documento que pede sua cassação com "tranquilidade" e que "não tem dúvidas de que seus pares se convencerão de que o erro cometido por ele —pelo qual já pediu desculpas— não deve ser punido com o mandato".

"Os comentários que foram alvo da representação no Conselho de Ética, ainda que indevidos, não constituem crime e não foram feitos durante a atividade parlamentar, já que Arthur do Val estava de licença do mandato", diz o texto.

Arthur do Val não tem dúvida de que o Parlamento irá respeitar a vontade de 500 mil paulistas que o elegeram para o mandato que ele exerce com dedicação e honestidade."
Nota divulgada por Arthur do Val

Desde que o processo começou, Arthur do Val e aliados políticos se movimentam na Alesp para convencer os parlamentares a não cassarem seu mandato. O argumento, utilizado também na defesa judicial entregue ao Conselho de Ética, é que a cassação é uma punição "exagerada, desproporcional e ilegal".

O advogado Paulo Henrique Franco Bueno admite que as afirmações do deputado foram "repulsivas e repugnantes", mas não "suficientemente graves" para justificar a cassação do mandato.

Na primeira defesa entregue ao Conselho de Ética, assinada por Bueno, a defesa afirma que as mensagens foram enviadas num grupo privado do WhatsApp e vazadas sem o consentimento de Arthur do Val. O advogado alega ainda que as falas não são referentes à atuação dele enquanto parlamentar e que Do Val estava licenciado do cargo na ocasião —e em outro país.

Críticas de outras parlamentares

A indicação de Olim para relator de um caso que analisa frases sexistas contra mulheres foi criticada por deputadas do colegiado, que esperavam a nomeação de uma mulher.

Não é a primeira vez que Olim é relator de um caso envolvendo Arthur do Val. Em outubro de 2019, segundo confirmou o Conselho de Ética, o ex-policial civil analisou uma acusação de quebra de decoro parlamentar contra Mamãe Falei, que xingou outros parlamentares de "vagabundos" no plenário da Alesp.

Nessa ação, Olim pediu arquivamento do caso contra do Val, mas os deputados do conselho conseguiram aprovar uma advertência —punição mais branda.

Ontem (6), Olim não quis falar sobre seu posicionamento sobre o caso mais recente. "Nunca tive problema com ele [Arthur do Val]. A maioria pode não gostar [do colega]. Dei minha opinião, não se muda. Vou fazer como delegado de polícia que sempre fui e sempre trabalhei", afirmou ao UOL.

13.nov.2019 - Delegado Olim durante manifestação no plenário da Alesp - Divulgação/Alesp - Divulgação/Alesp
13.nov.2019 - Delegado Olim durante manifestação no plenário da Alesp
Imagem: Divulgação/Alesp

Em 5 de março deste ano, Olim criticou as falas de Arthur do Val em suas redes sociais.

"Quero manifestar meu veemente repúdio e indignação, como Deputado Estadual, como membro da Comissão de Ética e Direitos Humanos da Alesp e como cidadão brasileiro, às graves declarações do deputado Arthur Do Val divulgadas pela imprensa", escreveu.

Quando ainda era cotado para ser relator do caso, o parlamentar disse que o caso de Do Val é mais "chocante" que o caso de Fernando Cury —que, em dezembro de 2020, foi filmado apalpando a deputada Isa Penna (PSOL) no plenário da Alesp.

Questionado sobre críticas de parlamentares à sua indicação, Olim disse que há colegas que "falam demais". "Eles querem falar para aparecer. Que esperem o voto e, depois, se acharem necessário, façam voto em separado", alegou.

No último dia 26 de março, Olin disse ter sido alvo, ao lado de outro delegado da polícia, de uma tentativa de assalto, na qual o suspeito acabou morto na Avenida Angélica, no centro de São Paulo.Olim e a Secretaria Estadual da Segurança Pública não afirmaram quem efetuou o disparo. "Veio de olho em cima do relógio. Já era. Mais um a menos. Ladrão a menos", afirmou o deputado em vídeo gravado no local.

O único caso de cassação analisado pelo Conselho de Ética ocorreu em 1999, segundo o próprio colegiado. O então deputado Hanna Garib teve seu mandato extinto depois de ser acusado de envolvimento em esquemas de corrupção na administração da cidade de São Paulo.