STF decide que autoridades podem pedir dados diretamente a big techs
O plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu hoje (23) que autoridades brasileiras podem requisitar diretamente dados a plataformas digitais com sede no exterior para abastecer investigações criminais.
A medida deve contribuir para as apurações dos atos golpistas de 8 de janeiro e já estava sendo utilizada pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral) nas eleições do ano passado.
Os ministros retomaram e concluíram o julgamento da ação movida pela Assespro (Federação das Associações das Empresas de Tecnologia da Informação), que questionava se as requisições de dados deveriam seguir, necessariamente, os procedimentos previstos no Acordo de Assistência Judiciária em Matéria Penal, o MLAT, na sigla em inglês.
O acordo tratava da obtenção de conteúdo de comunicação privada que estivesse em provedores de internet sediados fora do Brasil. Neste cenário, as solicitações do Judiciário deveriam passar pelo Ministério da Justiça - um trâmite considerado mais longo e demorado para obter informações.
O ministro Gilmar Mendes, relator da ação, já havia votado para permitir a solicitação direta para além do acordo de cooperação previsto no MLAT e foi acompanhado, no mérito, por Nunes Marques e André Mendonça.
Alexandre de Moraes, relator das investigações sobre o ataque golpista de 8 de janeiro, retomou a discussão, acompanhando o relator.
Moraes afirmou que, hoje, a requisição direta contribui para a obtenção de provas pela Justiça em um momento em que usuários podem deletar ou excluir publicações rapidamente.
O ministro ainda relembrou o episódio envolvendo o Telegram. Após ignorar sucessivamente pedidos da Justiça brasileira, a plataforma só passou a dialogar depois de uma decisão de Moraes suspender o funcionamento do aplicativo no país.
"Se fossemos seguir somente o procedimento de cartas rogatórias eu diria que estaríamos esperando até hoje [uma resposta]. O Telegram começou na Rússia, migrou para a Europa, hoje a sede é em Dubai. E até então não tinha representação no território nacional", disse Moraes. "Nem sempre o procedimento de cartas rogatórias e o MLAT é eficiente".
Moraes apontou ainda a cooperação direta entre as plataformas de redes sociais e o TSE durante as eleições para a retirada de conteúdos falsos. Durante o pleito, os prazos para a remoção desse tipo de publicação chegou a apenas uma hora — e foram seguidos pela plataformas.
É possível essa cooperação direta que auxilie a Justiça brasileira a poder produzir provas e responsabilizar aqueles que devem ser responsabilizados"
Alexandre de Moraes, ministro do STF
O ministro também criticou a difusão de desinformação nas plataformas, especialmente durante os atos golpistas de 8 de janeiro. Para Moraes, se trataram de "mentiras sórdidas" mas que contaminaram parcela da população.
"Nós tivemos, lamentavelmente, uma parlamentar que afirmou e postou que havia morrido uma pessoa na Polícia Federal, após a prisão ocorrida no dia 9 de janeiro. Há todo um mecanismo de produção de ódio e ilícitos", disse. "Isso chegou ao top 5 das notícias no Twitter, e 24h depois retirou e falou: 'me enganei'. Só que isso já contaminou. E hoje, se nós formos nas redes, várias pessoas ainda acreditam que uma senhora morreu na Polícia Federal".
Além de Moraes, acompanharam Gilmar Mendes os ministros Edson Fachin, Luiz Fux, Cármen Lúcia, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski e a presidente do STF, Rosa Weber. O ministro Luís Roberto Barroso se declarou impedido e não participou do julgamento.
O julgamento era acompanhado de perto pelas plataformas de redes sociais. O Facebook Brasil, por exemplo, disse nos autos que passou a receber diversas "ordens de autoridades brasileiras" para o fornecimento de dados de forma direta, sem seguir o trâmite do MLAT.
A filial alegava que só prestava serviços de publicidade no país, e que o fornecimento dos dados deveria ser solicitado por acordo de cooperação com a sede, nos Estados Unidos.
A manifestação foi feita após decisão de Moraes ao multar a filial por não cumprir o bloqueio global dos perfis de 12 apoiadores do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Para José Luiz Nunes, pesquisador do Centro de Tecnologia e Sociedade (CTS) da FGV Direito Rio, a decisão do STF é benéfica ao dar mais celeridade na obtenção de provas e dados ao permitir a requisição direta por autoridades. Segundo Nunes, a requisição direta já estava sendo utilizada
"Isso é benéfico se a gente comparar com a outra opção, que é o Judiciário depender de cooperação internacional, um procedimento muito burocrático e demorado", afirmou. "[A requisição direta] é mais célere e efetiva, pois garante que vai ser possível produzir provas em um número maior de casos".
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