Crise profunda na Boeing: CEO anuncia saída em meio a problemas no ar e nos negócios

A fabricante de aviões norte-americana Boeing, em crise após apresentar vários problemas de segurança nos seus aparelhos, anunciou nesta segunda-feira (25) a saída no final do ano do seu CEO Dave Calhoun, assim como de outros executivos.

"O mundo está observando e sei que vamos superar este momento para sermos uma empresa melhor", escreveu Calhoun em uma carta aos funcionários na qual afirmou que "segurança e qualidade são o que colocamos antes de tudo".

No mês passado, as autoridades dos Estados Unidos deram à Boeing um prazo de 90 dias para apresentar um plano de controle de qualidade.

A FAA (Agência Federal de Aviação Civil) dos Estados Unidos observou que a empresa deve "se comprometer com uma melhoria verdadeira e profunda".

Calhoun permanecerá no comando até o final de 2024, disse a empresa em seu comunicado à imprensa. Stan Deal, diretor da divisão de aviação comercial, é substituído com efeito imediato por Stephanie Pope, atual diretora operacional do grupo.

O presidente do conselho, Larry Kellner, também disse que não planeja buscar a reeleição na assembleia-geral anual do grupo, segundo o comunicado.

Kellner ocupava esse cargo desde o final de 2019.

O conselho de administração escolheu Steve Mollenkopf, membro do conselho executivo da Boeing e ex-chefe da fabricante de chips Qualcomm, para sucedê-lo. Como tal, Mollenkopf será responsável por encontrar um novo CEO para a empresa.

A fabricante de aeronaves está em plena crise, após um acidente ocorrido no início de janeiro com um avião modelo 737 MAX 9 da Alaska Airlines, no qual uma porta da cabine se soltou em pleno voo.

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Além do acidente técnico a bordo de tal voo, já foram relatados problemas de produção ao longo de 2023, assim como uma série de incidentes em 2024.

Relembre os episódios que levaram a crise na Boeing

Episódio mais recente com a Latam

Esta semana, autoridades da Nova Zelândia passaram a investigar o que levou um Boeing 787 da Latam a perder altitude abruptamente durante um voo entre Sidney e Auckland.

A Comissão de Investigação de Acidentes de Transportes da Nova Zelândia informou que vai analisar a caixa-preta do avião com a gravação dos registros da cabine de comando. O incidente, no voo com 263 passageiros a bordo, deixou 50 pessoas feridas.

Autoridades chilenas abriram uma investigação sobre o caso, uma vez que o incidente ocorreu no espaço aéreo internacional e a Latam tem sede no Chile. Após a escala em Auckland, o voo prosseguiria até Santiago.

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Ex-funcionário achado morto

Um ex-funcionário da Boeing foi encontrado morto nos Estados Unidos nesta semana, dias após prestar depoimento sobre possíveis falhas nas aeronaves da companhia. A polícia investiga o caso.

John Barnett, 62, foi encontrado morto em Charleston, no estado norte-americano da Carolina do Sul, no último sábado (9). Ele foi gerente de qualidade da Boeing, onde trabalhou por 32 anos até se aposentar, em 2017.Aparentemente, Barnett atirou em si próprio, segundo o gabinete do legista do condado de Charleston.

Em 2019, Barnett disse que a Boeing instalou deliberadamente peças defeituosas no sistema do 787 Dreamliner. A denúncia foi publicada pela BBC e pelo New York Times, e se transformou em uma batalha judicial. A empresa nega as acusações.

A saga do 737 MAX

Em 2018 e 2019, dois acidentes em um intervalo de seis meses com aeronaves Boeing 737 MAX 8 mataram todos os 346 passageiros e tripulantes, o que gerou uma crise na empresa e desencadeou os maiores prejuízos financeiros da história da companhia.

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O primeiro acidente ocorreu em outubro de 2018, em um voo da Lion Air saído de Jacarta, na Indonésia, que caiu no mar minutos após a decolagem. O segundo acidente, em março de 2019, ocorreu imediatamente após a decolagem em Joanesburgo, na África do Sul, em um voo operado pela Ethiopian Airlines.

Em 2020, um relatório do Congresso dos Estados Unidos apontou "falhas de design e uma cultura de acobertamento" na companhia, bem como falhas por parte da Administração Federal de Aviação (FAA).

Porta do avião se solta em pleno voo

Este ano, o modelo 737 MAX voltou aos holofotes, e de forma negativa. Em 5 de janeiro de 2024, uma peça da fuselagem de um Boeing 737 MAX da Alaska Airlines se desprendeu e fez com que uma das portas da aeronave se abrisse em pleno voo nos Estados Unidos, forçando os pilotos a realizarem um pouso de emergência. O acidente, que não teve vítimas, levou à suspensão por três semanas do modelo 737 Max 9 pela FAA. A medida afetou mais de 170 aviões.

Uma reportagem do jornal The New York Times divulgada nesta segunda-feira (11/03) revelou que, durante uma investigação após o incidente sobre o processo de produção do Boeing 737 MAX, a FAA realizou 89 auditorias, com 33 reprovações.

Segundo o jornal, a FAA encontrou "múltiplos casos" nos quais a Boeing e seus fornecedores fracassaram ao cumprir exigências de controle de qualidade. As auditorias na Boeing também examinam a produção de diferentes partes dos 737 MAX, como as asas e uma série de outros sistemas.

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O NYT relatou que muitos dos problemas encontrados pelos auditores dizem respeito ao não cumprimento de "processos aprovados de fabricação, procedimento ou instrução", enquanto outros se referem a problemas com a documentação do controle de qualidade da empresa.

A investigação da FAA constatou que a Boeing foi reprovada em uma verificação sobre o componente chamado plug door, que resultou no incidente com o 737 MAX da Alaska Airlines.

Falhas na empresa fornecedora

A empresa fornecedora Spirit AeroSystems, que produz a fuselagem do 737 MAX, foi aprovada em apenas seis das 13 auditorias realizadas. Outra investigação na empresa, centrada no plug door, relatou ter encontrado cinco defeitos e acrescentou que a empresa foi reprovada em um teste de instalação desse componente.

A auditoria elevou as preocupações em relação aos técnicos que realizam esse trabalho e concluiu que a Spirit "fracassou em determinar o conhecimento necessário para a operação desses processos". Outras auditorias, nas quais a empresa também fracassou, envolviam uma porta de carga e a instalação das janelas da cabine.

Este não foi o primeiro caso de problemas gerados pela Spirit AeroSystems junto à Boeing.

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No início de fevereiro, revelou-se a descoberta de falhas em duas perfurações na fuselagem de aeronaves 737 MAX, que teriam sido realizadas fora dos padrões determinados pela empresa, segundo informou a própria Boeing.

No ano passado, a entrega dos 737 teve que ser suspensa também por falhas em centenas perfurações na fuselagem - mais precisamente, no anteparo de pressão traseira, barreira que sela a cauda da aeronave.

Antes, no início de 2023, a Spirit também foi responsabilizada por problemas na cauda de quase 170 novas aeronaves 737 MAX, especificamente na conexão entre a fuselagem e o estabilizador vertical.

Inquérito no Departamento de Justiça

O secretário americano dos Transportes, Pete Buttigieg, disse esperar que a Boeing colabore totalmente com as investigações abertas pelo Departamento de Justiça dos EUA e pelo Conselho Nacional de Segurança nos Transportes (NTSB).

Enquanto a Boeing é alvo de múltiplas investigações, Buttigieg disse que a empresa precisa passar por mudanças profundas no que diz respeito à qualidade de seu processo de fabricação e em questões de segurança.

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No final de semana, o diário americano Wall Street Journal relatou que o Departamento de Justiça deu início a uma investigação criminal sobre o incidente com o avião da Alaska Airlines, após a Boeing informar ao Congresso que não conseguiu encontrar um registro relevante detalhando seu trabalho no painel que se soltou da aeronave.

A Boeing comentou os inquéritos das agências governamentais de maneira bastante sucinta através de uma nota: "Continuaremos a cooperar totalmente e de maneira transparente com todas as investigações e auditorias do governo, enquanto adotamos medidas compreensivas para melhorar a segurança e a qualidade".

A Alaska Airlines também disse colaborar com a investigações.

Acordo jurídico sob questão

O Departamento de Justiça informou anteriormente que realizava a revisão de um acordo de 2021 sobre uma acusação criminal federal contra a empresa, relacionada aos dois acidentes fatais com aeronaves 737 MAX.

Sob esse acordo, a Boeing se comprometeu a pagar mais de US$ 2,5 bilhões (R$ 13 bilhões), na maior parte, em forma de compensação para seus clientes. Por sua vez, o Departamento de Justiça concordou em retirar a acusação de que a Boeing fraudou a FAA ao omitir informações relevantes para a aprovação do Max.

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Não ficou claro, porém, se a nova investigação criminal relatada pelo Wall Street Journal estaria relacionada à revisão do acordo de 2021 ou a um caso separado.

O acordo foi criticado como sendo muito leniente com a Boeing e por ter sido fechado sem que as famílias das 346 vítimas fossem consultadas.

Outros problemas em aeronaves da Boieng

Mas não é somente o 737 MAX que está envolvido em incidentes aéreos: outras aeronaves da Boeing também apresentaram problemas. Em 13 de janeiro deste ano, um Boeing 737-800 operado pela companhia aérea japonesa All Nippon Airways teve que retornar à pista de decolagem no Japão após uma rachadura ser descoberta na janela da cabine do piloto em pleno voo.

O voo comercial NH1182 tinha partido de Sapporo-New Chitose (CTS), em Hokkaido, com destino a Toyama (TOY), em Honshu, a uma hora e meia de viagem. Segundo a companhia, a rachadura comprometeu apenas a camada mais externa da janela, a primeira de quatro, e todos os 59 passageiros e seis tripulantes saíram ilesos.

A All Nippon Airways, disse que a rachadura não "afetou o controle do voo ou pressurização [da cabine]".

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