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Mancha de óleo no Nordeste ameaça tartarugas, aves e peixe-boi

Tartaruga encontrada na praia da Redinha, em Natal, que está no Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da UERN, em Mossoró (RN) - Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da UERN
Tartaruga encontrada na praia da Redinha, em Natal, que está no Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da UERN, em Mossoró (RN) Imagem: Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da UERN

Michelle Ferret e Marina Cardoso, especiais para o Estado

Natal

09/10/2019 12h12

O espalhamento de óleo no litoral do Nordeste ameaça tartarugas, aves e o peixe-boi marinho, o mamífero dos oceanos mais ameaçado de extinção do Brasil. Segundo especialistas, o petróleo cru pode afetar a digestão dos animais e o desenvolvimento de algas, essenciais para a cadeia alimentar dessas espécies. Além disso, alertam, há possíveis riscos para a saúde humana.

O vazamento do óleo já atinge 138 localidades, nos nove estados da região. "Sem dúvida é o maior desastre ambiental no litoral do Nordeste do Brasil", afirma Flávio Lima, coordenador geral do Projeto Cetáceos da Costa Branca da Universidade Estadual de Rio Grande do Norte (UERN).

Ele e sua equipe estão envolvidos no atendimento de animais contaminados pelo óleo, cuja origem é atribuída à Venezuela, segundo análises feitas pela Petrobras.

Até o momento, em todo o Nordeste, 16 tartarugas-marinhas, espécie ameaçada de extinção, foram contaminadas pela substância. Por isso, em Sergipe, o Projeto Tamar deixou de lançar 800 tartarugas no oceano.

"A morte das tartarugas é apenas a parte mais imediata das consequências do vazamento", avalia Lima. Só dois animais encontrados seguem com vida.

Uma tartaruga-marinha que está no Centro de Descontaminação de Fauna Oleada da UERN, em Mossoró, único local no Nordeste que oferece estrutura completa para a recuperação dos animais resgatados com óleo. A outra aguarda estabilização do quadro para ser transferida para a unidade.

O material observado é denso, com odor forte característico e se espalha em borrões pelas praias e areias. O petróleo cru é perigoso e agressivo para a saúde humana e animal, por ser composto de uma mistura complexa de componentes orgânicos e 70% de hidrocarbonetos.

Segundo a pesquisadora Liana Mendes, da ONG Oceânica, vinculada à UERN, ainda que o óleo tenha um tempo de vida relativamente curto no ambiente aquático, a fração derramada é altamente tóxica para os organismos.

"Como efeito, ele pode afetar na digestão dos mamíferos, resultando em debilidade na ingestão de nutrientes, o que pode levar à morte", explica. "Outro desdobramento na cadeia ecossistêmica é que o óleo pode afetar o crescimento e produção de algas e algumas outras espécies que são fundamentais para a vida marítima", complementa.

A pesquisadora lembra que outra substância perigosa no petróleo cru é o benzeno, associado ao carcinogênico. Essa substância pode ocasionar a diminuição dos glóbulos brancos em humanos. "Com isso, as pessoas ficam susceptíveis a infecções", afirma.

Filhos voltam do mar 'cheio de piche'

Moradoras da praia de Santa Rita (RN), um dos locais afetados, Rejane Silveira e Zélia Lopes disseram que, no último fim de semana, seus filhos, de 10 e 12 anos, voltaram do mar "cheios de piche". "Ficamos muito assustadas e colocamos eles no banho. Tinha 'graxa preta' em todo lugar, no cabelo, nas orelhas e conseguimos retirar com óleo de cozinha", diz Rejane.

O "bugueiro" Francisco Sales, que faz passeios pelo litoral nas praias da Redinha e de Santa Rita, também relatou ter visto vários banhistas com óleo no corpo.

"Tem dias que aparece mais, outros menos. E o que mais entristece é ver as tartarugas com óleo, morrendo. Além disso, prejudica o passeio com os turistas, o movimento ao redor. É a primeira vez que vejo isso acontecer", lamenta.

Procedimentos

Para alertar a população, o Instituto de Defesa do Meio Ambiente em Natal (Idema), juntamente com o projeto Tamar, elaborou material educativo com os procedimentos que devem ser tomados em caso de contato com o óleo ou tiver conhecimento de um animal contaminado.

É preciso evitar o contato com o óleo e, caso aconteça, colocar gelo no local ou retirar com óleo de cozinha. Caso a pessoa tenha reação alérgica, procurar urgentemente atendimento médico.

Segundo o diretor-geral do Idema, Leonlene Aguiar, todos os municípios estão orientados para a coleta feita pela limpeza urbana, de forma adequada, com pá, luvas e sem utilização de máquinas.