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Igreja presbiteriana reduz tom contra esquerda, mas mantém brecha para punição

Getty Images/iStockphoto
Imagem: Getty Images/iStockphoto

Daniel Weterman

Brasília

29/07/2022 21h46

A Igreja Presbiteriana do Brasil (IPB) reduziu o tom contra fiéis de esquerda ao aprovar um documento oficial, nesta sexta-feira, 29, mas manteve uma brecha para punir líderes e membros. A instituição aprovou uma resolução condenando o "comunismo ateu e materialista" e rejeitou propostas que puniam "cristãos de esquerda ou progressistas" diante de críticas e dúvidas sobre o futuro de quem está na igreja e critica o presidente Jair Bolsonaro (PL).

O recuo ocorreu após a igreja fechar o cerco contra membros de esquerda e abrir os púlpitos para a campanha de reeleição de Bolsonaro, conforme o Estadão publicou no último dia 20. Na quinta-feira, 28, a reportagem revelou que a IPB afastou um presbítero do cargo após ele criticar o presidente da República e ser taxado de comunista, mostrando, que, antes mesmo de uma decisão oficial, esse tipo de punição virou realidade no atual governo.

A decisão oficializada pela Igreja Presbiteriana mantém uma brecha para punições, mas diminui a possibilidade de a perseguição interna se institucionalizar, de acordo com integrantes da instituição. Nos bastidores, pastores e fiéis críticos a Bolsonaro temiam que a igreja iniciasse uma verdadeira "inquisição" para forçar a saída de quem não se alinhasse ao pensamento dos pastores que comandam a denominação.

Ainda assim, quem for classificado como comunista pelos posicionamentos políticos poderá sofrer sanções. A brecha ocorre justamente em função da "incompatibilidade entre o comunismo ateu e materialista e a doutrina bíblica bem como os símbolos de fé da IPB" exposta no documento. Historicamente, a igreja já havia adotado esse posicionamento antes, mas o período eleitoral e o alinhamento da IPB com o governo Bolsonaro aumentaram as preocupações.

Se um pastor entender que o subordinado está com ideias "comunistas" ao se posicionar politicamente na igreja ou nas redes sociais, por exemplo, pode ser questionado. Foi o que aconteceu com o presbítero Flávio Macedo Pinheiro, da Igreja Presbiteriana em São Paulo. A igreja afastou Pinheiro do cargo no ano passado após o reverendo Ageu Magalhães formular uma denúncia taxando o presbítero de comunista e marxista por defender que mulheres não devem ser consideradas inferiores aos homens, falar em direitos da comunidade LGBT, de descriminalização do aborto e da maconha e divulgar um evento do PSOL sobre o pensamento do educador Paulo Freire.

"Ou você muda teu pensamento, abandonando as posições esquerdistas e todo o conteúdo marxista cultural que vem com elas, ou você deve, diante de Deus, renunciar ao Presbiterato. Esta relação está altamente incompatível", foi a mensagem enviada pelo reverendo ao presbítero por e-mail, em dezembro de 2019, após críticas a Bolsonaro. Um ano depois, o presbítero foi afastado do cargo. Ele teve a decisão revertida, mas o processo o levou a sair da congregação que frequentava há 19 anos e mudar para uma igreja de outro bairro.

A resolução foi aprovada pelo Supremo Concílio, órgão máximo de decisão da igreja, em uma reunião em Cuiabá que reuniu "figurões" presbiterianos e reelegeu o reverendo Roberto Brasileiro Silva no comando da IPB. Roberto Brasileiro é próximo ao presidente Bolsonaro e tem um filho, Gustavo Brasileiro, que ocupou um cargo de confiança no Ministério da Educação durante a gestão do ex-ministro Milton Ribeiro, preso no escândalo do gabinete paralelo, revelado pelo Estadão. Gustavo tentará ser eleito deputado estadual por Minas Gerais em outubro. Outros líderes influentes da IPB também já se mostraram alinhados com Bolsonaro, entre eles os reverendos Hernandes Dias Lopes, Augustus Nicodemus e Ageu Magalhães.

O documento da IPB reafirma "a incompatibilidade entre o comunismo ateu e materialista e a doutrina bíblica bem como os símbolos de fé da IPB". A proposta anterior era mais dura e poderia acabar até mesmo proibindo a filiação e a identificação de membros da igreja com partidos políticos. Entre as considerações para a mudança, o Supremo Concílio justificou que a igreja "tem mantido equidistância de radicalismo e que "não é finalidade da IPB manifestar-se sobre partidos políticos". O reverendo Osni Ferreira foi o relator da proposta e é o primeiro a assinar o documento aprovado. Conforme a reportagem revelou, ele defendeu a reeleição de Bolsonaro no meio de um culto da Igreja Presbiteriana Central de Londrina (IPB), no último dia 3.