Portugal deveria se desculpar e confrontar seu passado na escravidão, diz presidente
Por Catarina Demony
LISBOA (Reuters) - O presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, disse nesta terça-feira que seu país deveria se desculpar e assumir a responsabilidade por seu papel no comércio transatlântico de escravos, na primeira vez que um líder português sugere tal pedido de desculpas.
Do século 15 ao 19, 6 milhões de africanos foram sequestrados e transportados à força através do Oceano Atlântico por navios portugueses e vendidos como escravos, principalmente para o Brasil.
Mas até agora Portugal raramente comentou sobre seu passado e pouco é ensinado sobre seu papel na escravidão nas escolas.
Em vez disso, a era colonial do país, que viu países como Angola, Moçambique, Brasil, Cabo Verde, Timor-Leste, bem como partes da Índia sujeitas ao domínio português, é frequentemente vista como uma fonte de orgulho pela maioria dos portugueses.
Falando na comemoração anual em Portugal da revolução dos "cravos" de 1974, que derrubou a ditadura do país, Rebelo de Sousa disse que o país deveria ir além de apenas um pedido de desculpas, embora não tenha oferecido nenhum detalhe.
"Pedir desculpas às vezes é a coisa mais fácil de fazer: você pede desculpas, vira as costas e o trabalho está feito", disse ele, acrescentando que o país deve "assumir a responsabilidade" por seu passado para construir um futuro melhor.
Paula Cardoso, fundadora da plataforma online Afrolink para profissionais negros em Portugal, disse que as observações de Rebelo de Sousa foram "simbólicas", mas importantes, pois trouxeram a questão à tona.
"(Mas) eu gostaria de ouvir algo mais concreto do presidente", disse Cardoso à Reuters. "Para ter algum impacto, essas reflexões... devem ser acompanhadas de medidas e compromissos."
Reparações e políticas públicas para combater as desigualdades causadas pelo passado de Portugal são essenciais, disse Cardoso.
Rebelo de Sousa fez as declarações depois que o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que esteve em Portugal em sua primeira visita à Europa desde que assumiu o cargo, se dirigiu ao Parlamento português.
O presidente português disse que a colonização do Brasil também teve fatores positivos, como a difusão da língua e da cultura portuguesa.
"(Mas) do lado ruim, a exploração dos povos indígenas... escravidão, o sacrifício dos interesses do Brasil e dos brasileiros", disse ele.
O ministro dos Direitos Humanos do Brasil, Silvio Almeida, disse que Rebelo de Sousa deu um passo "extremamente positivo".
"Nós continuamos sofrendo no Brasil os reflexos de uma herança da escravidão", disse Almeida em um comunicado. "Reconhecer a exploração dos milhões de escravizados durante mais de 300 anos, é um passo para caminharmos em relação a uma sociedade menos desigual."
O principal grupo de direitos humanos da Europa disse anteriormente que Portugal tinha que fazer mais para enfrentar seu passado colonial e seu papel no comércio transatlântico de escravos, a fim de ajudar a combater o racismo e a discriminação hoje.
(Reportagem de Catarina Demony)
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