MP pede que jurados condenem PMs do Carandiru a exemplo de Dirceu no julgamento do mensalão
O Ministério Público usou como exemplo a condenação do ex-chefe da Casa Civil José Dirceu como chefe do esquema do mensalão, em julgamento no STF (Supremo Tribunal Federal), ano passado, para pedir aos jurados do Carandiru que condenem os 26 policiais militares pela morte de 15 presos mesmo sem a individualização das condutas. O argumento foi utilizado na fase de réplica dos debates entre acusação e Promotoria, que antecedem a reunião em que os jurados dirão se os réus são culpados ou inocentes.
O dia a dia do júri
A defesa dos PMs afirma não ser possível condená-los pelo crime de homicídio qualificado por não se saber exatamente quais PMs mataram quais presos.
O promotor Márcio Friggi citou a condenação de Dirceu como mandante do esquema do mensalão no julgamento em que, de 37 réus julgados, 25 foram condenados. Os reús no caso foram condenados pela participação em um esquema de desvio de dinheiro público para a compra de apoio parlamentar no início do primeiro mandato de Luiz Inácio Lula da Silva (2003-2006).
Friggi destacou no telão trechos de pareceres dos ministros Ricardo Lewandovski e José Antonio Dias Toffoli, únicos que pediram a absolvição de Dirceu em meio a outros oito ministros do Supremo que aceitaram a acusação contra o ex-ministro no contexto de concurso de réus. Dirceu foi condenado a dez anos de prisão.
“Lá havia também vários réus. Esse argumento de que não se pode individualizar as condutas é batido, surrado”, disse Friggi. “No julgamento do mensalão foi a mesma coisa: os ministros Lewandovski e Dias Toffoli entenderam que não se deveria responsabilizar o ex-ministro como o mandante, os senhores [jurados] entendem que ele deveria ou não ser responsabilizado?”, indagou.
Antes, o promotor salientara que, se acusações de concurso de agentes para prática coletiva de crime não pudessem ser julgadas, “como condenaríamos bandidos que dão cobertura a outros que assaltam residência, por exemplo? É a mesma coisa”.
Além dos exemplos, o MP usou trechos de pareceres do STJ (Superior Tribunal de Justiça) e de ensaios sobre psicologia coletiva que tratam do assunto. “Não ouvimos a versão do preso porque gostamos do preso, mas porque a versão dele tem compatibilidade com a prova pericial. Os réus fizeram um jogral aqui com enxertos de mentira”, concluiu.
Depois da réplica da acusação, a advogada dos réus poderá pedir tempo equivalente –de duas horas –para tréplica. Só depois disso os jurados se reúnem para analisar os quatro itens da denúncia e proferir o veredito.
A previsão é que a sentença só seja anunciada na madrugada deste domingo (21).
Perfil dos réus
De acordo com o promotor, entre todos os 28 réus, apenas três não têm “mortes no currículo” --dois deles não faziam parte do batalhão da Rota e respondiam ao canil da Polícia Militar. Entre aqueles que mataram durante ações policiais, o recordista é Paulo Estevão de Melo que, segundo o promotor, tem 23 mortes registradas em sua carreira.
Perfil das vítimas
O perfil dos presos mortos no segundo pavimento do pavilhão 9 foi apresentado como o de homens novos, com idades abaixo dos 30 anos, de baixa renda, réus primários e, em alguns casos, com direito a sair da prisão ou sem condenação definitiva. O promotor citou os nomes de algumas vítimas e ressaltou o caso de Ronaldo Gaspariano, que estava há 40 dias na Casa de Detenção por ter assaltado um cobrador de ônibus portando uma faca. Ele teria dito, no momento do roubo, que os “2 mil cruzeiros levados, cerca de US$ 6 dólares na cotação da época, eram para o leite da criança”.
O livro “Rota 66 – a história da polícia que mata”, escrito pelo jornalista Caco Barcellos em 1992, também foi usado pelo promotor para descrever, de forma geral, qual seria o perfil “das vítimas da Rota”: homem jovem, pardo ou negro, de origem nordestina, morador da periferia, de baixa renda e baixa escolaridade.
“Não cabe à Polícia Militar resolver”
Após a exposição de réplica feita pelo promotor Márcio Friggi, a advogada de defesa, Ieda Ribeiro de Souza, aproveitou seu tempo de tréplica para apontar falhas no laudo de perícia feito no segundo pavimento do pavilhão 9, para reler partes dos processos, e para pedir aos jurados que absolvessem os policiais militares defendidos por ela. “Pelo estrito cumprimento de dever, a legítima defesa e principalmente a individualização das condutas”.
Pouco antes de concluir, Ieda classificou: “Se foi incompetência do governo ou da Polícia Civil, não cabe à Polícia Militar resolver. Está na mão de cada um dos senhores saber que polícia os senhores querem ver na rua.”
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