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"Que Deus os perdoe", disse o papa ao brindar com champanhe com os cardeais

Fernanda Calgaro

Do UOL, no Vaticano

14/03/2013 09h05

Depois de ser eleito papa, Francisco brindou com os demais cardeais eleitores durante o jantar e pediu ao Deus que os perdoasse por o terem escolhido como novo pontífice, segundo contaram os cardeais brasileiros dom Raymundo Damasceno e dom Odilo Scherer nesta quinta-feira (14).

A escolha de José Mario Bergoglio como pontífice causou surpresa em dom Raymundo. “Não preciso dizer que foi surpresa. Foi surpresa para todos nós”, disse ele, embora o cardeal Geraldo Majella, também presente à coletiva de imprensa nesta quinta, tenha dito que não se surpreendeu: "Para mim, não foi uma grande surpresa, no sentido que não pudesse ter o cardeal Bergoglio como possível candidato."

"Jesus disse que o vento sopra de onde ele quiser. E o vento sopra da Argentina agora", acrescentou dom Odilo. Os cardeais disseram ainda que a eleição de um jesuíta, "com coração franciscano", dá indicações de como a Igreja será conduzida daqui para frente.

“Não se fazem saltos mortais dentro da igreja, mas existe uma continuidade", ressalvou dom Odilo.

Sobre o perfil do papado de Franciso, dom Raymundo afirma que será marcado "por um grande ardor missionário, aberto aos cristãos mais distantes que precisavam revigorar a sua fé e aberto a outras religiões e culturas".

"Não estamos preocupados só com quantidade [de fiéis], mas com qualidade, de modo que as pessoas saibam dar a razão da sua fé", completou dom Geraldo. Os cardeais destacaram ainda a simplicidade do papa Francisco. Segundo eles, após a saudação que ele fez na sacada da basílica de São Pedro, ele rejeitou a limusine destinada ao papa e preferiu regressar à Casa Santa Marta, onde todos estavam hospedados, no ônibus com os demais cardeais.

"Como protocolo, ofereceram o carro oficial do papa, mas ele recusou e quis voltar como veio, no ônibus junto com os outros cardeais, não quis ir na limusine", afirmou dom Odilo.

Durante o jantar, o papa comentou que hoje, logo pela manhã, iria até a Casa Internacional do Clero, onde ficou hospedado antes do conclave, para pagar a conta da sua hospedagem.

Em seguida, ele foi até a Basílica de Santa Maria Maggiore, no centro de Roma, venerar um ícone da Virgem Maria, conhecida como Maria Salus Populi Romani.

"Foi a Virgem Maria que deu proteção ao povo romano durante a última guerra mundial para que a cidade não fosse bombardeada", explicou dom Raymundo. Ali na igreja, segundo o cardeal, o papa teria pedido que o local ficasse normalmente aberto ao público e disse que era um "peregrino como os outros peregrinos". No momento da sua visita, porém, apenas o papa, alguns cardeais e os padres da basílica estavam no interior da igreja.

Sobre o estilo do papa Francisco, dom Raymundo afirmou que cada um tem o seu. "O papa Bento 16 é um homem profundamente contemplativo da obra de Deus e, por isso, ele  nos ensinou muito. Se o João Paulo 2º atraía muito com a sua presença, o papa Bento 16 atraía para ser ouvido. E, realmente, a catequese que ele dava as quartas-feiras nas audiências gerais, muita gente ia para ouvi-lo. O papa Francisco é uma pessoa que mostra também que vai chamar a atenção. Chamou e vai continuar chamando pelo modo de ser seu", avaliou.

Dom Raymundo negou que os escândalos sexuais e as suspeitas de corrupção no Banco do Vaticano tivessem tido alguma influência no conclave. "Não pesaram. Acho que ninguém estava preocupado com isso, com a justiça, é claro [que estava preocupado], [mas] o papa deve ser alguém que defenda os pobres, os que são mais sofridos".

Rixa Brasil x Argentina

Em relação à rixa entre Brasil e Argentina, dom Raymundo Damasceno afirmou que ela se limita aos campos de futebol: "A disputa é mais no campo do futebol, entre o Maradona e o Pelé. No campo religioso, evidentemente que não há disputa, se trata da mesma Igreja."

Para ele, essa disputa entre Brasil e Argentina é "folclore" e que, se houvesse alguma coisa do tipo, já foi superada. Dom Odilo acrescentou: "Como é que nós, brasileiros, chamamos os argentinos? De los hermanos. É isso aí, brincadeiras à parte, somos povos irmãos e sentimos assim aqui", brincou.

Dom Odilo nega mal estar com dom João Braz

Dom Odilo Scherer negou que tenha ocorrido um mal estar quando, durante as reuniões dos cardeais que antecederam o conclave, dom João Braz de Aviz pediu mais informações sobre o Banco Vaticano. Don Odilo teria defendido a Cúria Romana, conforme chegou a ser veiculado na imprensa italiana.

"Eu pergunto se eu de fato falei isso. De onde tiraram isso? Eu não falei isso. Não houve essa discussão", disse. 

Sobre o fato de ser cotado pela imprensa como um dos favoritos para ser o próximo papa, dom Odilo afirmou que a Igreja não é "só feita de cálculos humanos".

"As cotações prévias foram todas para o espaço. Mas, afinal, com que critérios foram feitos os cálculos?", disse. "Há que se aprender uma coisa: a Igreja não é só feita de cálculos humanos. Rezamos para que o Espírito Santo nos iluminasse."

Anúncio do novo papa

A Igreja Católica anunciou às 20h14 (16h14 de Brasília) desta quarta-feira (13) quem é seu novo papa: o cardeal jesuíta Jorge Mario Bergoglio, 76, da Argentina.

Ele foi o escolhido para suceder Bento 16 no conclave que começou na terça-feira (12) e terminou hoje, às 19h07 (15h07 de Brasília), quando a fumaça branca tomou a praça São Pedro, após cinco escrutínios.

O nome do novo papa foi revelado após o famoso "Annuntio vobis gaudium, habemus Papam" ("anuncio uma grande alegria: temos um papa"), feito pelo cardeal francês Jean-Louis Tauran. O nome papal escolhido pelo cardeal Bergoglio é Francisco.

No momento do anúncio, os fiéis que aguardavam na praça São Pedro ficaram eufóricos. Houve uma comoção geral e o sentimento em muitos era de surpresa.

Na Argentina, Bergoglio é conhecido pelo conservadorismo e pela batalha contra o kirchnerismo. O prelado também é reconhecido por ser um intenso defensor da ajuda aos pobres. O argentino costuma apoiar programas sociais e desafiar publicamente políticas de livre mercado.

A vida do papa Francisco

Nascimento17 de dezembro de 1936, em Buenos Aires
EducaçãoColégio Máximo San Jose, onde estudou filosofia e teologia
Sacerdócioem 13 de dezembro de 1969
Carreirafoi indicado como bispo auxiliar de Buenos Aires em 1992 e promovido a arcebispo em 1998
Cardinalatofoi nomeado cardeal por João Paulo 2º em 2001 com o título de São Roberto Belarmino
Outro cargoPresidente da Conferência dos Bispos da Argentina de 2005 a 2011

Bergoglio é considerado um ortodoxo conservador em assuntos relacionados à sexualidade, se opondo firmemente contra o aborto, o casamento entre pessoas do mesmo sexo e o uso de métodos contraceptivos.

Em 2010, entrou em controvérsia pública com a presidente Cristina Kirchener ao afirmar que a adoção feita por casais gays provocaria discriminação contra as crianças.

Em seu primeiro discurso, feito logo após o anúncio de seu nome, Francisco agredeceu ao acolhimento da comunidade de Roma e lembrou do papa emérito Bento 16, seu antecessor.

A escolha foi realizada por 115 cardeais, sendo cinco brasileiros: dom Raymundo Damasceno Assis, 76; dom Odilo Scherer, 63; dom Geraldo Majella Agnelo, 79; dom Cláudio Hummes, 78; e dom João Braz de Aviz, 64.

Estavam aptos a votar apenas os cardeais com menos de 80 anos. A presença deles, segundo o Vaticano, era obrigatória. No entanto, dois eleitores conseguiram a dispensa necessária para não participarem da votação, um por motivo de saúde (cardeal indonésio Julius Darmaatjadja) e outro por ter renunciado ao cargo (cardeal britânico Keith O'Brien). (Com Agência Brasil e AFP)