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Campanha de Romney gera orgulho entre os mórmons, que estão entre seus principais financiadores

John Willard Marriott, Lenore Romney, George Romney e Alice Marriott em evento político em 1965. Famílias como a Marriott, que controla uma das maiores companhias hoteleiras do mundo, formaram uma estrutura financeira essencial e uma rede de apoio para Mitt Romney em sua carreira política - Marriott International/The New York Times
John Willard Marriott, Lenore Romney, George Romney e Alice Marriott em evento político em 1965. Famílias como a Marriott, que controla uma das maiores companhias hoteleiras do mundo, formaram uma estrutura financeira essencial e uma rede de apoio para Mitt Romney em sua carreira política Imagem: Marriott International/The New York Times

Jim Rutenberg

Em Salt Lake City (EUA)

18/07/2012 06h00

Em meados dos anos 1800, famílias recém-convertidas de todos os Estados Unidos e Europa se reuniram na crescente cidade mórmon de Nauvoo, Illinois, para ajudar seu profeta, Joseph Smith, a construir uma Nova Jerusalém.

Logo expulsos por vizinhos antimórmons que mataram Smith e seu irmão Hyrum, as famílias rumaram para oeste a pé e a cavalo, sendo perseguidas por índios, pela cólera e até por tropas norte-americanas antes de se estabelecer com segurança em Utah.

Agora, mais de 150 anos depois, descendentes daquelas primeiras famílias do mormonismo estão se unindo num novo esforço: entregar a Casa Branca a Mitt Romney, cujo tataravô Miles Romney se estabeleceu ao lado de muitos de seus ancestrais em Nauvoo em 1841 e os acompanhou na tortuosa migração.

Essas famílias – Marriott, Rollinse e Gardner, para citar algumas – formaram uma estrutura financeira essencial e uma rede de apoio para Romney em todos os momentos importantes de sua carreira política. Começando pela corrida pelo Senado em 1994, passando pela iniciativa dos Jogos Olímpicos de Salt Lake City em 2002, que se tornou seu trampolim político, e continuando até sua primeira tentativa na política presidencial, eles sempre estiveram lá para abrir portas, fornecer dinheiro e angariar apoio.

A candidatura de Romney produziu grande orgulho entre muitos mórmons, conhecidos oficialmente como membros da Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Mas para este grupo central de famílias importantes da religião, as ligações com Romney são mais profundas. Eles compartilham com ele não só uma fé, mas também uma história dramática na qual subiram os degraus da sociedade norte-americana, começando como vilões forasteiros e, depois de se estabelecer o Oeste norte-americano, subindo para as alturas da riqueza e do sucesso em um período de quatro gerações.

Uma noção concreta desse apoio está nos registros do super PAC “Restaurando Nosso Futuro”, que trabalha para eleger Romney. Cerca de duas dúzias de famílias mórmons forneceram quase US$ 8 milhões do financiamento para o super PAC, cifra que as coloca ao lado de doadores de Wall Street e dos setores energético e imobiliário. Mórmons importantes, entre eles o fundador da JetBlue, David G. Neeleman, e o diretor executivo do Credit Suisse, estão em sua equipe de finanças.

Muitos dos principais apoiadores mórmons de Romney estão ligados a empresas com grandes interesses em Washington – fazendo lobby nas políticas de impostos, aviação e turismo, de acordo com arquivos federais – e têm algo a ganhar tendo um amigo na Casa Branca.

Mas vários desses doadores dizem que suas doações não têm nada a ver com seus interesses empresariais. E embora este seja um discurso comum entre os financiadores de ambos os partidos, neste caso a candidatura que eles estão apoiando representa algo maior uma vez que chama atenção para sua religião.

 

“Acho que para os mórmons, particularmente os mais conhecidos que já se sentem aceitos e admirados individualmente, isso parece uma chance de também ver a igreja, que eles amam, aceita e admirada institucionalmente”, disse Richard Eyre, mórmon e autor de best-seller que mora em Utah e é próximo da família de Romney.

Não é pouca coisa para os mórmons que não só um, mas dois fiéis foram considerados como possíveis candidatos à presidência este ano: Romney e o ex-governador Jon M. Huntsman Jr., de Utah.

A família de Huntsman – inclusive seu pai, que já foi um alto oficial leigo na Igreja Mórmom – esteve entre as que apoiaram Romney, até que Hunstman desenvolveu suas próprias aspirações nacionais. Mas Huntsman, menos envolvido na igreja que Romney, não conseguiu o mesmo apoio da rede mórmon.

Durante toda a campanha de Hunstman nas primárias, parte de sua equipe relatou ter recebido um sinal sutil, porém claro: este era o ano de Romney.

  • George Tames/The New York Times

    George Romney, pai do republicano Mitt Romney, em foto de janeiro de 1964; quatro anos depois, ele se tornaria o primeiro mórmon a tentar uma corrida presidencial – mas o indicado do Partido Republicano foi Richard Nixon

Agora como presumível nomeado republicano, a base de apoio de Romney está se ampliando consistentemente. Como disse o seu diretor nacional de finanças, Spencer Zwick, que é mórmon: “Agora estamos começando nossa coalizão católica para Romney, temos um diretor de fundos que é judeu – a única forma de uma campanha se transformar numa causa é se estender para diferentes grupos.”

Empresarial e pessoal

Em entrevistas, vários dos apoiadores de Romney disseram temer que a atenção ao apoio financeiro que ele recebeu das outras famílias antigas da religião pudesse ressuscitar antigos preconceitos e acusações de clã que perseguiram seus ancestrais. Para muitos, seu apoio nasce de sua admiração pessoal por Romney, bem como dos valores e experiências compartilhados com ele, quer seja nos negócios, na Universidade Brigham Young ou como altos oficiais da igreja.

“Obviamente, há um ligação mórmon aqui”, diz Kevin Rollins, ex-consultor administrativo da Bain & Company e ex-diretor executivo da fabricante de computadores Dell, que doou US$ 375 mil para o “Restaurando Nosso Futuro”. “Mas isso diz muito mais respeito à sua competência como administrador. Você não conquista posições de liderança se fizer besteiras”, disse ele.

Rollins conheceu Romney quando este último administrava a firma privada Bain, e agora tem a “presidência” dos mórmons em Boston que antes era de Romney.

Bill Marriott, que doou US$ 1 milhão para o “Restaurando Nosso Futuro”, disse que fez isso por amizade. Romney leva o nome do pai de Marriott, John Willard Marriott, que era grande amigo do pai de Romney, George Romney. (O primeiro nome de Romney é Willard; Mitt é seu nome do meio.)

Os pais de Romney e Marriott tinham uma ligação com Utah, onde suas famílias se estabeleceram depois de jornadas por toda a fronteira norte-americana com Brigham Young, o profeta mórmon que é comparado a Moisés pelos fiéis da religião.

Mas Bill Marriott, cuja família transformou uma única loja da A&W Root Beer numa das maiores companhias hoteleiras do mundo, disse que não deixou passar o fato de que a nomeação de Romney é um grande momento para seus colegas mórmons.

“É uma grande história, e queremos que o mundo saiba sobre nossa religião”, disse Marriott, que recentemente renunciou ao cargo de diretor executivo de sua companhia. “Nós de fato sentimos que estamos saindo da obscuridade.”

Entre a documentação dos vagões que fizeram a turbulenta jornada com Young e depois ajudaram a estabelecer Utah estavam nomes que hoje preenchem os arquivos de campanha de Romney e os grupos políticos que o apoiam.

A história da família Marriott relata que dois membros da família morreram de cólera enquanto passavam por St. Louis em sua jornada para o oeste. “O sacrifício das pessoas que morreram ao longo do caminho foram incríveis”, disse Marriott numa entrevista. Uma história da família de Romney relata “incômodos” por parte de oficiais federais que mostraram um “espírito de ódio e ganância”.

Naqueles tempos difíceis, os primeiros assentados mórmons passaram a depender muito uns dos outros, às vezes atraindo suspeitas de seus vizinhos que não eram mórmons.

“Você sabe, há um sentimento – e eu não levaria isso longe demais – historicamente de que os mórmons apanhavam e eram empurrados para cá e para lá, e através desse processo eles de fato se uniram”, disse Rollins, cujos ancestrais estiveram em Nauvoo. “Agora somos parte do mundo, e queremos viver e trabalhar e concorrer e fazer o que pudermos ao lado de todo mundo.”

O momento olímpico

Tanto foi assim que Romney escreveu sobre o orgulho que Gordon B. Hinckley, então presidente da Igreja Mórmon, sentiu na cerimônia de abertura em seu livro sobre sua liderança nos Jogos Olímpicos de Salt Lake City em 2002, “Turnaround”.

“Ao longo de um século e meio antes, seu predecessor Brigham Young e milhares de viajantes cansados e pobres entraram nesse mesmo vale”, escreveu Romney. “Agora, seus descendentes e vizinhos recebem o mundo em sua casa nas montanhas.”

Os Jogos Olímpicos foram um grande evento para a igreja, uma chance de mostrar ao mundo aonde tinham chegado seus fiéis. Eles também foram um grande evento para Romney, que foi recrutado para assumir os Jogos depois que eles ficaram atolados num grande escândalo.

Embora Romney tenha nascido e tenha sido criado em grande parte em Michigan, seu pai era querido em Utah, tendo passado parte da infância lá e se tornado, em 1968, o primeiro mórmon a concorrer à presidência na era moderna. Romney fez suas próprias conexões fortes durante seu tempo como estudante da Universidade Brigham Young. Seus laços se fortaleceram quando ele se tornou um oficial da hierarquia da igreja em Massachusetts.

Entre os que primeiro sugeriram que ele chefiasse os Jogos Olímpicos estavam Robert H. Garff e Kem C. Gardner, ambos com laços ancestrais com aqueles dias de pioneiros. Garff era presidente do Comitê Organizador de Salt Lake City, e seu pai e o pai de Romney haviam frequentado o segundo grau juntos. Gardner era oficial da igreja em Massachusetts na mesma época que Romney.

Com Gardner e o diretor de marketing da campanha olímpica de Utah, Don Stirling, Romney conseguiu levantar dezenas de milhões de dólares de outras famílias mórmons com raízes pioneiras: os Eccles, cujos ancestrais foram importantes industrialistas e banqueiros; Jon M. Huntsman Sr., o magnata bilionário dos químicos que compartilha um parente pioneiro com Romney, o missionário da era Smith Parley Pratt; e os fundadores do Nu Skin, Steven J. Lund e Blake M. Roney.

Romney recebeu um amplo apoio dos mórmons em Utah durante seu fracasso na disputa pelo Senado em 1994 contra o senador Edward M. Kennedy. Mas o sucesso dos Jogos Olímpicos levou esse apoio a outro nível.

“Acho que teria havido um apoio enorme para ele em Utah de qualquer forma, mas os Jogos Olímpicos deram uma espécie de vazão para isso”, disse Eyre, que trabalhou na campanha presidencial de George Romney.

Quando concorreu ao governo de Massachusetts depois dos Jogos Olímpicos, Romney pareceu hesitante em depender muito de sua rede de Utah, por conta de uma sensação entre seus auxiliares de que Kennedy havia usado suas ligações mórmons contra ele.

Mas ele levou dois altos auxiliares de seu trabalho nos Jogos Olímpicos com ele para Boston quando conquistou o cargo. Stirling, seu diretor financeiro concentrado em Utah, e Zwick, cujo pai é oficial sênior da igreja, W. Craig Zwick. (Numa entrevista para uma publicação da igreja há vários anos, o Zwick mais velho disse que seus ancestrais maternos eram “da época da história da Igreja com Hyrum” Smith.)

E depois da metade do mandato de Romney, os dois deixaram o governo para entrar para sua incipiente campanha presidencial, rapidamente buscando doações de sua rede de apoiadores mórmons, bem como dos outros círculos de que participava.

Utah logo emergiu como uma das principais bases doadoras de Romney, com Roney, Gardner, Spence Eccles e Huntsman Sr. atuando em sua equipe de finanças nacional.

Este ano, com Zwick na campanha de Romney, Stirling está trabalhando no “Restaurando Nosso Futuro”.

O super PAC forneceu um novo meio para doações grandes. Então, companhias ligadas a Lund doaram US$ 2 milhões; os Marriott forneceram US$ 2 milhões, Rollins deu US$ 100 mil, Gardner US$ 50 mil e membros da família Eccles deram US$ 40 mil, segundo os registros.

Há também novos nomes, incluindo Jeremy Andrus, diretor-executivo da Skull Candy, que deu US$ 50 mil. A família Andrus faz parte da história mórmon desde Joseph Smith. Registros mantidos online pela sociedade histórica Washington County, Utah, mostram que um ancestral, Milo Andrus, comprou uma casa de Miles P. Romney, bisavô de Romney, em 1879.

Eyre disse que a principal atração de Romney para a maioria dos mórmons são seus “valores em comum” com ele, não sua “religião em comum”. Mas ainda assim ele descreveu uma “vertigem” em relação a suas perspectivas.

“É como um arco em que os passos para a compreensão e a inclusão foram tão pequenos por tanto tempo – injustamente pequenos, porque os arcos de outros grupos pareciam andar mais rápido”, disse ele. “E agora de repente há esta grande chance de que o arco se concluirá de forma bem rápida e bastante poderosa.”

(Lisa Schwartz contribuiu com a pesquisa)