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Armas, CPI e terras indígenas serão prova de fogo para Mendonça no STF

Mendonça fala em sabatina para após ser indicado para ser ministro do STF - Edilson Rodrigues/ABR
Mendonça fala em sabatina para após ser indicado para ser ministro do STF Imagem: Edilson Rodrigues/ABR

Rafael Neves

Do UOL, em Brasília

03/12/2021 04h00Atualizada em 03/12/2021 11h07

Aprovado pelo Senado para assumir uma vaga no STF (Supremo Tribunal Federal), o novo ministro André Mendonça deverá participar de julgamentos na Corte que tratarão de temas caros ao governo e à oposição. Entre eles estão os decretos do presidente Jair Bolsonaro (PL) que facilitam o acesso a armas, a CPI da Covid e o marco temporal das terras indígenas.

Durante a sabatina na quarta (1º), o ex-ministro da Justiça disse que sua "única submissão" será à Constituição. O segundo indicado pelo presidente para uma vaga no STF se esquivou de comentar estes e outros assuntos com a justificativa de que poderia ter que julgá-los no STF, futuramente, e que não deveria entrar em detalhes sob o risco de ter que se declarar impedido.

Além de atuar nestes casos, Mendonça assumirá, após tomar posse em 16 de dezembro, a relatoria de cerca de mil processos que eram conduzidos por seu antecessor na Corte, o ex-ministro Marco Aurélio Mello, que se aposentou em julho. Um destes casos é um recurso do partido Patriota contra a decisão do Supremo que proibiu, em novembro de 2019, a prisão após condenação em segunda instância.

Mendonça foi questionado na quarta-feira sobre o assunto, por vários senadores na CCJ (Comissão de Constituição e Justiça). Em resposta, disse considerar que o STF não deveria reabrir esta discussão até que o Congresso tome uma decisão sobre o tema.

"Entendo que a questão está submetida ao Congresso Nacional, cabendo a este deliberar sobre o tema", afirmou logo em seu pronunciamento inicial, antes das perguntas dos senadores. Para ele, o STF só deve reanalisar o assunto "após eventual pronunciamento modificativo por parte do Poder Legislativo sobre a matéria e caso o Judiciário seja provocado a fazê-lo".

Ao longo da sabatina, Mendonça foi questionado sobre o tema pelos senadores Lasier Martins (Podemos-RS), Esperidião Amin (PP-SC) e Eduardo Braga (MDB-AM). O ex-advogado-geral da União explicou que defendeu a prisão em segunda instância, à época do julgamento do STF, mas que não deseja retomar a discussão pela via do tribunal.

"Sobre a questão da segunda instância, senador Eduardo Braga, reafirmo: se voltar ao Supremo a rediscussão sem uma alteração inovadora, concreta, por parte do Congresso Nacional, não será da minha parte ou não terá da minha parte consonância dentro desse contexto", disse.

Desde antes da decisão do Supremo, há dois anos, já havia propostas legislativas para deixar explícita, na Constituição, a possibilidade de execução da pena antes do esgotamento de recursos de uma ação. Na Câmara, uma PEC (Proposta de Emenda à Constituição) que trata do assunto seria votada no último dia 1º na comissão que analisa o tema, mas a discussão acabou adiada.

André Mendonça diz que

Decretos das armas

Pastor da Igreja Presbiteriana e considerado por Bolsonaro "extremamente evangélico", Mendonça deverá ter que participar, no ano que vem, da retomada de um julgamento que discute os decretos de Bolsonaro que facilitam o acesso a armas no país. Parte destas regras está suspensa por decisão da ministra Rosa Weber, mas a análise definitiva ainda depende do plenário do Supremo.

Em setembro, o caso foi levado a julgamento virtual. Quando o placar já estava em 3 votos a 0 para que os dispositivos fossem declarados inconstitucionais, o ministro Nunes Marques pediu vista do processo e interrompeu a discussão. Quando o processo for retomado no ano que vem, Mendonça terá que se posicionar.

Na sabatina, a senadora Eliziane Gama (Cidadania-MA), relatora da indicação, ligou a circulação de armas no país a casos de feminicídio e perguntou a posição do ex-ministro de Bolsonaro a respeito. "É bom lembrar que nós tivemos vários decretos apresentados pelo Presidente da República esvaziando o Estatuto do Desarmamento, o que nós entendemos como um retrocesso", acrescentou a congressista.

Em resposta, Mendonça afirmou que é preciso debater "quais os limites" para a posse e o porte de armas, mas não comentou dos decretos presidenciais. "Eu não posso me manifestar sobre a exatidão da possibilidade ou não ou da constitucionalidade ou não do tratamento que foi dado pelos decretos e por atos também legislativos que tratam da matéria", afirmou.

CPI e terras indígenas

Outro tema sobre o qual Mendonça evitou entrar em detalhes foram as conclusões da CPI da Covid, que foi lembrada na sabatina por Eliziane Gama e também por Rogério Carvalho (PT-SE). Os crimes apontados no relatório final que envolvem pessoas com foro privilegiado no STF são alvo de apuração PGR (Procuradoria-geral da República), e Mendonça poderá ter que tomar decisões sobre o tema.

Aos senadores na CPI ele afirmou que não poderia comentar o conteúdo das investigações, mas prometeu que dará tratamento sério às investigações.

Posso garantir a Vossas Excelências meu compromisso de apuração e tratamento adequado do resultado dos trabalhos da CPI"
André Mendonça, que vai assumir a 11ª cadeira do STF

Mendonça também deverá tomar parte no julgamento sobre o marco temporal das Terras Indígenas, que define se os povos originários podem reivindicar terras que já não estavam ocupadas por eles à época da Constituição. O tema foi discutido em setembro no plenário do STF, mas o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos.

No mês seguinte, Moraes liberou o processo para julgamento, mas uma nova sessão para tratar do tema ainda não foi agendada. No momento da interrupção, o placar do julgamento era de 1 a 1, na disputa que opõe ruralistas e defensores dos povos indígenas.

Aos senadores, Mendonça recorreu outra vez ao argumento de que não poderia analisar o caso antes de ser chamado a julgá-lo. "Eu não poderia me manifestar sob pena de estar impedido, o que não me impede de dizer do meu total compromisso com o respeito à dignidade humana, à cultura e aos valores das comunidades indígenas do nosso país", disse.