Cúpula do Mercosul se contrapõe a Milei na agenda de direitos humanos
A estrutura e a sustentabilidade de políticas públicas de direitos humanos do Mercosul estão em risco diante do atual contexto político que vive o bloco, conforme revelou o relatório do Instituto de Políticas Públicas de Direitos Humanos (IPPDH) do Mercosul a que o UOL teve acesso.
Durante a 64ª Reunião do Bloco, que começou neste domingo e segue hoje, em Assunção, no Paraguai, o presidente Lula fez questão de ressaltar em sua apresentação a importância do IPPDH e a necessidade de que o bloco trabalhe para fortalecer o instituto e suas pautas sociais. "Afastar o Mercosul de suas bases sociais nos enfraquece. Apagar a palavra gênero, agrava a violência cotidiana sofrida por mulheres e meninas", disse Lula. O governo de Javier Milei abriu guerra contra a linguagem inclusiva, por exemplo, ao vetar o uso de gêneros neutros na administração pública.
Lula ainda defendeu o Instituto Social forte para combater a pobreza. "Um instituto de políticas públicas de direitos humanos deve dispor de recursos necessários para apoiar-nos na complexa tarefa de garantir direitos e dignidade", afirmou.
Na abertura da reunião de chefes de Estado hoje, o chanceler paraguaio, Ruben Ramirez Lezcano, também fez questão de frisar a importância das pautas sociais para o Mercosul, conduzidas pelo IPPDH. O governo do presidente Javier Milei tem diminuído ou mesmo impedido o funcionamento do Instituto, dificultando as contratações, conforme mostra o relatório a que o UOL teve acesso.
Durante o encontro entre os chanceleres dos países do bloco neste domingo, 7, o diplomata brasileiro Mauro Vieira fez questão de dar uma indireta à chanceler Diana Mondino, que representa Milei na reunião nesta segunda, sobre a importância de ampliar as atividades do IPPDH para promover os direitos humanos na região.
Travas para executar orçamento
Segundo fontes ouvidas pela coluna, a Argentina tem imposto algumas travas para a execução plena do orçamento definitivo que já foi aprovado pelos organismos competentes, sem demora e de forma eficiente, o que significaria avançar ao pleno cumprimento do que as máximas autoridades do Conselho do Mercado Comum haviam determinado como competências e funções do IPPDH.
O relatório aponta os estudos, pesquisas, cursos e ações que o IPPDH tem realizado, principalmente em pautas de gênero, saúde mental para crianças e adolescentes no pós pandemia e políticas públicas para pessoas com deficiência, entre outras ações fundamentais para a região. O ofício é uma clara posição em defesa dos trabalhos do Instituto e vai ao encontro do clima de tensão entre a diplomacia brasileira e argentina ontem, 7, durante a reunião dos chanceleres do bloco, em Assunção, um dia antes do encontro dos chefes de Estado.
A divergência no modo como Brasil e Argentina enxergam as políticas de direitos humanos ficou clara no dia de ontem, primeiro dia da Cúpula. O diplomata brasileiro, Mauro Vieira, defendeu a criação de um comitê de mulheres e comércio do Mercosul. Para Vieira, trata-se de um tema importante para as democracias dos países, as quais devem ser cada vez mais igualitárias.
A chanceler argentina, Diana Mondino, por sua vez, ignorou a temática social do bloco e não fez menção às políticas públicas de direitos humanos. O chanceler brasileiro Mauro Vieira também destacou a importância do IPPDH, cuja sede está em Buenos Aires e tem como nova diretora a brasileira Andressa Caldas, desde fevereiro de 2024.
Diana Mondino falou sobre o princípio de não agressão e liberdade, e discursou contra o terrorismo e contra o narcotráfico e o tráfico de armas. "Temos que trabalhar em conjunto nesses temas também. Para combater a pobreza, a livre empresa é uma grande ferramenta para combater a fome, que é o objetivo de todos os países", disse ela. "O processo de cooperação social é onde teremos intercâmbio voluntário. E acredito que o Mercosul nao pode ser um organismo desequilibrado, ao contrário. Tem que ser igual para todos", completou.
O relatório aponta que o atual contexto político coloca em risco a estrutura e a sustentabilidade do Instituto se não conseguir garantir suas políticas de direitos humanos, sofrendo com falta de contratação de pessoal para concursos públicos e cargos temporários. São fatores que "poderiam implicar numa paralisia institucional, afetando, em última instância, o fortalecimento dos direitos humanos na região.. essa situação poderia ameaçar as possibilidades de cumprir as funções do instituto".
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