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Varíola dos macacos: Cientistas detectam primeiras mutações do vírus

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O avanço no número de casos da varíola dos macacos pelo mundo deu início a uma corrida de cientistas para entender o que está ocorrendo com o monkeypox, vírus causador da doença, para que ele tenha adquirido um maior poder de infecção entre humanos.
Cientistas portugueses publicaram ontem (23) uma nova análise genética no site especializado Virological, em que afirmam ter encontrado "divergência genética e primeiros sinais de microevolução". Isso indica que as primeiras mutações foram percebidas no vírus —que ajudam a velocidade inédita da disseminação atual.
Até o momento, no entanto, especialistas ainda consideram baixa a chance de uma transmissão descontrolada. Além disso, segundo a OMS (Organização Mundial de Saúde), as vacinas usadas durante o programa de erradicação da varíola ajudam a proteger contra a varíola dos macacos.
As mutações
Ao todo, segundo os pesquisadores, foram encontradas 50 alterações genéticas em relação ao vírus inicial da África Ocidental. Como ainda não se sabe o poder dessas mudanças, é preciso esperar o comportamento da disseminação da doença nos próximos dias para entender seu impacto.
"Para os padrões de um vírus, o genoma é enorme, são quase 200 mil nucleotídeos. Então esse número [50] não acende um alerta especial", diz o virologista Fernando Spilki, pesquisador na área de mutação viral. "São situações que até podem se revelar com importantes no curso das próximas semanas, mas ainda está tudo sendo avaliado conforme evoluem os fatos", afirma o especialista, que é professor da Universidade Feevale (RS) e integrante Câmara Técnica Temporária do MCTI (Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovações) para monitoramento do monkeypox.
Nesse início, em que a maioria dos casos pode estar relacionado a eventos isolados de transmissão, esses dados podem nos servir para entender como se dão as correntes de transmissão, de onde vem o vírus e como vai se distribuir nos países.
Fernando Spilki, virologista
Origem
Na semana passada, um outro estudo apontou que o vírus que está infectando pessoas na Europa hoje está mais relacionado a um vírus associado à exportação da varíola dos macacos da Nigéria para vários países em 2018 e 2019.
"Esse vírus que está na Europa pertence a esse clado [grupo de monkeypox] que é considerado menos virulento. São dois clados, e o mais virulento é o que está na bacia do Congo", aponta a virologista e especialista em poxvírus, Giliane Trindade.
As sequências do estudo publicado ontem foram obtidas de pacientes infectados em Portugal e coletadas de nove pacientes nos dias 15 e 17 de maio. "Já detectamos os primeiros sinais de microevolução dentro do cluster [grupo] do surto, ou seja, o surgimento de 7 SNPs [Mutações + inserções + deleções, diferenças] levando a três ramos descendentes", afirmam.
Entre as principais conclusões da análise está que o surto "provavelmente tem uma única origem".
Alta de casos
Enquanto os cientistas estudam, o número de casos só cresce pelo planeta. Ao todo, 16 países já informaram casos suspeitos ou confirmados.
Até as 18 horas de ontem, 168 casos foram confirmados por exame e outros 82 são suspeitos no mundo, entre eles o primeiro da América Latina, na Argentina.
A OMS (Organização Mundial de Saúde) espera que haja mais casos de varíola dos macacos identificados à medida que a vigilância se expande em países não endêmicos —onde a doença não está permanentemente presente. "Isso pode ajudar a afinar estratégias de controle", declarou a entidade em comunicado divulgado no domingo (24).
As evidências sugerem que correm maior risco aqueles que tiveram contato físico próximo com alguém infectado que manifeste sintomas da varíola, diz a organização. "A OMS também está trabalhando para fornecer orientações para proteger os profissionais de saúde da linha de frente e outros profissionais de saúde que possam estar em risco, como faxineiros." A entidade afirma que fornecerá mais recomendações técnicas nos próximos dias.
Transmissão e sintomas
O monkeypox é um vírus da mesma família do da varíola humana e foi descoberto ainda na década de 1950 em animais, principalmente primatas não humanos. "Mas também há monkeypox em outros roedores e mamíferos, que podem ser reservatórios desse vírus", diz a infectologista Vera Magalhães, professora da Doenças Tropicais da UFPE (Universidade Federal de Pernambuco).
A primeira evidência de transmissão em humanos desse vírus, conta, ocorreu em 1970, quando ainda havia a circulação da varíola no mundo. "Ela ocorreu na África e até hoje causa infecção humana no continente, principalmente em pessoas que tiveram contato com animais", relata.
Não é a primeira vez que ocorre um surto fora da África. Vera conta que, em 2003, cerca de 40 casos foram registrados em pessoas que tiveram contato com cães-da-padrarias que foram domesticados nos Estados Unidos. Por sua vez, esses animais tiveram contato com pequenos roedores importados da África.
Na África, a literatura fala que a doença mata 1 em cada 10 pessoas. Nos EUA temos dados mais otimistas, mas não temos essa estatística em número relevante. Ainda é difícil prever o que vai ocorrer exatamente."
Vera Magalhães, infectologista
Vera conta que a transmissão desse vírus, diferente do coronavírus, por exemplo, ocorre por gotículas respiratórias, mas não por aerossol. "Ou seja, é preciso de um contato mais íntimo. Ela é comum em veterinários e cuidadores de animais que têm contato com alguma secreção, ou quando levam um arranhão ou mordida."
Sobre sintomas, Vera Magalhães diz que não há muita diferença da varíola humana. "O período de incubação vai de cinco a 21 dias, e começa com febre, mialgia [dor muscular], cefaleia [dor de cabeça] —como qualquer infecção. De um a três dias, começa o rash macular [manchas na pele], depois vão virar pápulas [espinhas] e em seguida as vesículas [que evoluem para virarem feridas] bem características da varíola", relata.
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