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Familiares revivem dor e lamentam novas mortes na Amazônia: 'Até quando?'
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O assassinato do indigenista Bruno Pereira e do jornalista Dom Phillips levou o país de volta às manchetes internacionais por mais um crime bárbaro contra quem defendia a Amazônia.
A coluna lembra agora algumas das principais mortes emblemáticas e massacres ocorridos na região. Em conversas com a reportagem, familiares também lamentaram as mortes confirmadas ontem.
Um fato que une todas essas mortes é que ameaças foram feitas antes dos crimes, sem que o estado tivesse capacidade de evitá-los.
Chico, o primeiro a chocar o mundo
A primeira morte que chocou o mundo —e que viria a ser um ponto de partida para certa mudança de pensamento ambiental no país— foi a do seringueiro e ambientalista Francisco Alves Mendes Filho, o Chico Mendes. Ele foi morto em em Xapuri (AC), em 22 de dezembro de 1988.
Defensor da floresta, Mendes foi alvo de inúmeras ameaças de morte por causa de sua luta ambiental antes de ser assassinado.
Em 22 de dezembro, quando estava em sua pequena casa, foi atingido com tiros de escopeta por Darci Alves, que agiu em conluio com seu pai, Darly Alves, um conhecido grileiro de terras da região. Eles foram condenados a 19 anos de prisão.
"Eles me acertaram", disse Chico, após ser alvejado no quintal da residência.
Após sua morte, foi fundada a Reserva Extrativista Chico Mendes (Resex), em 1990, que tem 970 mil hectares e se tornou uma referência em proteção ambiental com uso consciente da floresta até hoje.
A morte de Dom Phillips e Bruno Pereira abalou a família Mendes mais de três décadas após a morte de Chico.
O que mais temíamos aconteceu. Eu consigo mensurar a dor das esposas e familiares nesse momento, e asseguro que essa dor será eterna. O que eu não consigo compreender é: até quando vamos presenciar assassinatos brutais de pessoas que lutam pela defesa de direitos fundamentais, que lutam por nossas florestas?
Elenira Mendes, filha de Chico Mendes
Dorothy deixou legado
Em 12 de fevereiro de 2005, outra morte levou o país ao noticiário internacional: a da missionária norte-americana Dorothy Stang, em Anapu (PA).
Pioneira em implantar um conceito de sustentabilidade na região, ela criou os PDS (Projetos de Desenvolvimento Sustentável), que davam renda às famílias pobres que preservassem a Amazônia.
A ação fez Dorothy ser jurada de morte —e conviver com essas ameaças por ao menos cinco anos, até que levou seis tiros na cabeça no assentamento Esperança quando ia a uma reunião. Cinco pessoas foram acusadas pelo crime e tiveram punições (algumas bem tardias).
A região onde Dorothy vivia ainda é alvo de conflitos intensos e mortes. Em 2015, o UOL denunciou que Anapu, onde Dorothy atuava, vivia havia ainda um intenso conflito, com sete mortes e uma lista de pelo menos 30 pessoas marcadas para morrer.
Zé e Maria: assassino ainda foragido
Em 24 de maio de 2011, foi a vez do casal de castanheiros e ambientalistas José Cláudio Ribeiro e Maria do Espírito Santo tombarem após uma emboscada em Nova Ipixuna (PA), onde moravam na zona rural.
A morte do casal teve grande repercussão especialmente porque meses antes, em novembro de 2010, José Cláudio deu uma palestra em que disse ser ameaçado e viver com uma "arma apontada para a cabeça".
A irmã de José Cláudio, Claudelice Santos, lembra que o casal pediu ajuda a autoridades por conta das ameaças, mas não conseguiu impedir a sua morte.
"Na época chegaram a escrever uma carta para Marina Silva, que era ministra do Meio Ambiente na época", conta.
Após a morte, ela e familiares criaram o Instituto Zé Claudio e Maria para pedir justiça ao caso.
O mandante do crime, José Rodrigues Moreira, foi condenado a 60 anos de prisão em 2016, mas está foragido desde então.
Minha sensação, com a morte de Bruno e Dom, é de estar num loop eterno de tragédias anunciadas, com muitas vidas destruídas, além das vidas assassinadas. Os que ficam também perdem um pouco de si
Claudelice Santos, irmã de José Claudio
Dois massacres pela polícia
Além dessas tragédias, pelo menos duas chacinas ocorreram, praticadas por políciais (ambas no Pará).
Em 17 de abril de 1996, 21 trabalhadores foram mortos (19 no local e dois no hospital) em uma ação policial na curva do "S" da rodovia PA-150, naquele que ficou conhecido como massacre de Eldorado dos Carajás.
A ação da PM contou 155 policiais, que receberam ordens do governador Almir Gabriel (à época do PSDB) para desobstruir a rodovia. Já o grupo de sem-terra era composto por 1.100 trabalhadores rurais. Nenhum policial ficou ferido.
"Eles atiravam e xingavam, chamavam a gente de vagabundo, diziam que iam nos matar. A gente ouvia os tiros e, ao mesmo tempo, os gritos de dor dos baleados", contou ao UOL Raimundo dos Santos Gouveia, sobrevivente do massacre, na data em que completou 25 anos, em 2021.
O coronel Mário Colares Pantoja, que comandava o 4º Batalhão de Polícia Militar, em Marabá (PA), pegou a 228 anos de prisão. O major José Maria Pereira de Oliveira, que chefiava a companhia independente da PM do Pará, pegou 158 anos.
Os dois conseguiram habeas corpus e só foram presos dez anos após a condenação, em 2012. Em 2018, alegando problemas de saúde, conseguiram cumprir pena em casa com tornozeleira eletrônica.
Outra tragédia ocorreu novamente pelas polícias do Pará, que mataram dez trabalhadores durante um cumprimento de mandados de busca e apreensão na fazenda Santa Luzia, em Pau D'Arco (PA), no dia 24 de maio de 2017.
Investigações apontaram que não houve reação dos camponeses, como alegaram os policiais, e que muitas das mortes ocorreram com tiros à queima-roupa e caracterizaram execução.
Ao todo, 16 policiais foram indiciados pelas mortes, que não tiveram mandantes identificados no inquérito enviado à Justiça
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