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Carlos Madeiro

REPORTAGEM

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Com verba cortada por Bolsonaro, análise de ossadas da vala de Perus para

Bolsonaro aponta para cartaz ironizando busca de restos mortais de vítimas da ditadura  - Reprodução/Facebook
Bolsonaro aponta para cartaz ironizando busca de restos mortais de vítimas da ditadura Imagem: Reprodução/Facebook

Colunista do UOL

31/03/2023 04h00Atualizada em 31/03/2023 16h28

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Os trabalhos de análise para identificação das ossadas encontradas na vala clandestina do cemitério de Perus, na zona oeste de São Paulo, estão parados desde julho de 2022, ainda no governo Jair Bolsonaro, por falta de verbas, e não têm previsão de retomada.

O que aconteceu

O local foi usado pela ditadura para sepultar corpos de forma clandestina. Ossadas não identificadas foram enterradas entre 1975 e 1976.

Com a descoberta da vala, em 1990, o material passou a ser estudado. Em 2014, o material foi enviado para análise na Unifesp (Universidade Federal de São Paulo)

Segundo o Caaf (Centro de Antropologia e Arqueologia Forense), os valores de 2021 e 2022 não foram repassados pelo governo federal. Com isso, as análises foram paralisadas em julho do ano passado

O diretor do Caaf, Edson Telles, afirma que está aguardando um posicionamento do novo governo. "Enquanto isso não ocorre, ficamos sem ação. Não há verba e técnicos para tocar os trabalhos"

Interrupção apenas na pandemia. Desde que os trabalhos começaram até julho do ano passado, as análises só haviam sido paradas entre março de 2020 e setembro de 2021.

Os trabalhos agora devem ir para o processo de reassociação —que é a individualização do conjunto de ossos que hoje estão misturados em cerca de 200 caixas.

Algumas das caixas têm centenas de ossos. Precisaremos tentar montar os que se encaixam e sequenciar o DNA da maioria para ver as compatibilidades e, ao final, comparar o DNA com os de familiares.
Edson Telles, Caaf

Se tiver recursos e pessoas em número adequado, Telles diz que essa etapa deve durar três anos, finalizando os trabalhos. Depois disso, as ossadas devem ser repassadas para a Prefeitura de São Paulo para um memorial.

Procurado pela coluna para saber se irá renovar o convênio, o Ministério dos Direitos Humanos e da Cidadania informou que já está em tratativas com o Caaf para que seja repactuado o acordo e que está estudando uma maneira de sanar o passivo de 2021 e 2022.

"Este é mais um esforço no sentido de reconstruir a política de direitos humanos no Brasil após o desmonte protagonizado nos últimos anos", disse a pasta.

Hoje existem apenas cinco ossadas identificadas:

Duas delas já no trabalho do Caaf, em 2018: Dimas Casemiro e Aluízio Palhano.

Outras foram identificadas ainda nos anos 1990 e 2000: Dênis Casemiro, Frederico Eduardo Mayr e Flávio Carvalho Molina.

Ao todo, o material reúne ossadas de 1.049 pessoas, fora as centenas de ossos misturados. "Neste bloco não sabemos ainda quantos indivíduos podem ser."

Há uma lista de 41 pessoas procuradas, que seguiu critérios como ter desaparecido em São Paulo ou com relatos de sua ida para São Paulo; ter o nome no livro do cemitério ou mesmo por solicitação de famílias

perus - L.C Leite/Folhapress - L.C Leite/Folhapress
04.set.1990 - Uma das mais de mil ossadas achadas numa vala comum clandestina no cemitério Dom Bosco, em Perus
Imagem: L.C Leite/Folhapress

Bolsonaro crítico

Bolsonaro sempre foi um crítico das ações que investigam detalhes sobre as mortes praticadas por militares durante a ditadura.

Em 2019, logo após tomar o poder, publicou um decreto encerrando o Grupo de Trabalho Perus, que era vinculado à Comissão de Mortos e Desaparecidos Políticos, do Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos.

Após passar quatro anos negando pedidos e rejeitando seguir com casos, a comissão também foi extinta no final de 2022.