Carlos Madeiro

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CNJ vê indício de uso político de juiz que virou pré-candidato bolsonarista

O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) abriu um processo administrativo disciplinar para investigar a conduta do juiz Luiz Rocha e indícios de uso da magistratura com interesse pessoal político-partidário.

Após 30 anos atuando no judiciário pernambucano, ele se aposentou no final do ano passado, imediatamente se filiou ao PP e agora é pré-candidato à Prefeitura de Camaragibe (no Grande Recife), onde tenta conquistar o voto do bolsonarismo na cidade.

Luiz Rocha pediu oficialmente a aposentadoria em 28 de novembro de 2023 e, três dias depois, estava aposentado. Ele era juiz da 7ª Vara da Fazenda Pública do Recife. Ao UOL, ele negou irregularidades em suas ações e diz acreditar que será inocentado pelo CNJ (veja mais abaixo).

Para a corregedoria do CNJ, o problema não é a entrada na política, mas o uso da toga para autopromoção com interesse político.

Nas redes sociais e no programa de rádio que comanda todas as quartas, Luiz Rocha se intitula como "o juiz do povo". Ele se tornou conhecido pelas ações que faz fora do âmbito institucional, usando ações de justiça.

Em novembro do ano passado, por exemplo, ele apresentou em suas redes sociais um caminhão-baú com sua foto estampada e slogan "o juiz do povo", que seria a unidade móvel do projeto "Justiça para todos", criado por ele em 2007.

Corregedor cobra investigação

Luiz Rocha foi denunciado no CNJ no final do ano passado e passou a ter suas ações analisadas. Na sessão pública do último dia 11, o corregedor nacional de Justiça, ministro Luís Felipe Salomão, afirmou que via "todos elementos" indiciários e apresentou voto a favor da abertura de um processo administrativo disciplinar, o que ocorreu de forma unânime.

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Em âmbito administrativo, o processo pode levar Luiz a mudar o status da aposentadoria de voluntária para compulsória. Em termos financeiros, nada mudaria; mas uma punição colegiada o tornaria inelegível.

Em um voto duro, Salomão defendeu a apuração do juiz porque os "fatos aconteceram durante o exercício da magistratura, e persistiram dias depois, quando ele entrou na política."

Os fatos são graves por conta da utilização da toga para atividade político-partidária. A meu ver pode acarretar em uma sanção grave.
Luís Felipe Salomão

Para convencer os pares, o corregedor levou imagens postadas por Luiz Rocha em suas redes sociais no exercício da magistratura. "As fotografias falam por si, dispensam a leitura do caso."

Chamou a atenção do corregedor que as ações que dizia ser sociais não eram feitas de forma institucional, mas sim pessoal.

A circunstância de um ter um projeto que leva seu nome e ostenta sua imagem pessoal não parece estar conforme a ética requerida a todo e qualquer magistrado.
Luís Felipe Salomão

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Imagem usada no WhatsApp aberto ao público do juiz Luiz Rocha
Imagem usada no WhatsApp aberto ao público do juiz Luiz Rocha Imagem: Reprodução

Citou que ele se intitulava "juiz do povo" e dava entrevistas explicando causas judiciais durante o exercício da magistratura enquanto "preparava caminho individual para sua carreira política."

Não compete ao magistrado fazer consultorias a quem quer que seja, que pode incutir em uma suspeição ou impedimento [de julgar casos]. As mencionadas entrevistas não se tratam de manifestações em obras técnicas ou magistério.
Luís Felipe Salomão

Luiz Rocha nega irregularidades

Procurado pela coluna, Luiz Rocha afirmou que "o voto do ministro representa a posição dele, não do colegiado" e disse estar confiante de que não será punido.

Questionado sobre os argumentos apresentados pelo corregedor, ele falou que não iria "comentar o entendimento do ministro." "Como disse, são deduções pessoais do corregedor nacional e que têm o meu respeito."

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O relator e o plenário, na sua amplitude e no exame dos fatos com mais profundidade, inclusive documental e testemunhal, poderá ter outra leitura e conclusão. Hoje não tenho porque me defender.
Luiz Rocha

Ele também questionou o entendimento de que teria feito autopromoção com viés político na sua carreira.

Estou lhe atendendo como sempre atendi a imprensa, ao longo de meus 30 anos de carreira. Se isso foi superexposição ou autopromoção, o plenário do CNJ saberá. Respeitei o meu cargo e a toga toda a minha vida funcional. Quando me aposentei, eu adquiri liberdade para realizar escolhas; mesmo aquelas que eram tecnicamente vedadas aos magistrados.
Luiz Rocha

Ligação com a extrema-direita

Bolsonaro e juiz aposentado em setembro de 2021
Bolsonaro e juiz aposentado em setembro de 2021 Imagem: Associação Nacional para Defesa da Magistratura/Divulgação

Luiz Rocha era o presidente da Associação Nacional para Defesa da Magistratura (criada por ele), e em setembro de 2021 foi até o Comando Militar do Nordeste, no Recife, para falar com o então presidente Jair Bolsonaro. Na ocasião, diz que pediu "um olhar para a magistratura de carreira".

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A foto foi institucional, mas após deixar o cargo Luiz passou a se declarar como um político alinhado à extrema-direita brasileira e tenta fisgar o voto do bolsonarismo em outubro.

Em abril deste ano, por exemplo, postou um vídeo com imagens feitas ainda quando exercia a magistratura com nomes expoentes da extrema-direita brasileira. A ideia seria deixar claro que ele seria um bolsonarista raiz na disputa de outubro na cidade --já que há outros nomes na pré-disputa que se alinham na mesma ideia.

No vídeo, ele diz ser "conservador com origem e história ao longo dos anos".

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