Corte anuncia hoje se condena país por violações a quilombolas de Alcântara
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A CIDH (Corte Interamericana de Direitos Humanos) anuncia na tarde desta quinta-feira (13) a sua decisão sobre a denúncia de violações a comunidades quilombolas do governo brasileiro para construção do CLA (Centro de Lançamento de Alcântara), no Maranhão.
A denúncia é de 2001, mas apesar de mais de duas décadas se passarem, o território segue sem título de propriedade coletiva dado aos povos tradicionais.
A ação na CIDH que —é um braço da OEA (Organização dos Estados Americanos)— foi movida por 152 comunidades quilombolas, que assinam a denúncia com entidades. O Brasil é um dos 20 países da região que reconhecem a competência da corte em impor sanções.
As comunidades do município já foram certificadas pela Fundação Cultural Palmares em 2004 e identificadas e delimitadas pelo Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária) em 2008. Desde então, o processo de titulação está pronto para assinatura do Executivo federal.
Em síntese, a ação pede que o governo faça a titulação do território quilombola e que o governo realize um "procedimento culturalmente adequado de consulta e consentimento prévio, livre e informado" sobre a área a ser delimitada.
Também requer a fixação de indenização por danos materiais e imateriais às comunidades afetadas, além da proibição de novos deslocamentos forçados de comunidades quilombolas e a criação de um fundo de desenvolvimento comunitário.
"É um caso emblemático da luta quilombola no país e é a primeira vez que o Brasil poderá ser condenado em um tribunal internacional por crimes contra comunidades quilombolas. Estamos com muita expectativa que o Brasil seja condenado", conta Danilo Serejo, quilombola de Alcântara, cientista político e um dos peticionários do caso na CIDH.

Brasil reconhece parte
A denúncia na CIDH é assinada ainda por MABE (Movimento dos Atingidos para Base de Alcântara), Justiça Global, Sociedade Maranhense de Direitos Humanos, Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado do Maranhão, Sindicato dos Trabalhadores e Trabalhadoras Rurais de Alcântara e DPU (Defensoria Pública da União) —que entrou no caso em 2017.
Além delas, a Associação do Território Quilombola de Alcântara e o Movimento das Mulheres de Alcântara entraram no processo já quando ele estava na CIDH.
Durante a audiência de instrução do caso, realizada em abril de 2023 em Santiago (Chile), o governo brasileiro reconheceu pela primeira vez parte das violações às comunidades e fez um pedido de desculpas por meio de uma declaração pública da AGU (Advocacia-Geral da União).
Houve violação estatal ao direito de propriedade nesse caso porque o Brasil não promoveu a titulação do território tradicionalmente ocupado pelas comunidades até o momento. Houve também violação à proteção judicial em decorrência da demora processual e da ineficiência das instâncias judiciais e administrativas para permitir às comunidades quilombolas de Alcântara o exercício do direito à propriedade coletiva das terras por elas ocupadas. O processo de titulação desses territórios, embora complexo e multifásico, tardou demasiadamente e até hoje não ultimou os trâmites necessários à efetiva titulação territorial.
Pedido de desculpas da AGU

À época, o governo também anunciou a criação de um GTI (Grupo de Trabalho Interministerial) para avaliar a titulação do território. Em janeiro de 2024, a coluna de Jamil Chade contou que quatro entidades quilombolas romperam com o governo Lula nas negociações sobre a titulação por alegarem terem sido excluídas do mecanismo de consultas.
Em julho de 2024, a OIT (Organização Internacional do Trabalho) recomendou que o Brasil titule o território das comunidades quilombolas —a primeira vez que a entidade decidiu sobre o caso de comunidades afrodescendentes no mundo.
Após os estudos, o governo apresentou resultados e firmou acordo com quilombolas em setembro do ano passado. Na ocasião, o presidente Lula foi ao local e anunciou que iria titular de uma área de 78.105 hectares como território quilombola. Foram publicadas portarias de reconhecimento a 21 comunidades quilombolas, além de 11 decretos de interesse social.
As organizações, porém, alegaram que o acordo é "temerário, já que pode fragilizar o processo em curso de deliberação da CIDH."
O governo brasileiro não ofereceu condições justas e equilibradas para o debate e não disponibilizou estudos técnicos e científicos para subsidiar a tomada de decisão, bem como não foi apresentado o planejamento das ações pretendidas.
Justiça Global, ONG que é uma das peticionárias da ação no CIDH

Sobre o projeto
O CLA foi criado em 1983, durante a ditadura militar. Entre 1986 e 1988, foram desapropriadas 312 famílias de 32 povoados de suas terras, sem nenhum estudo de impacto sociocultural e ambiental ou processos de consulta e consentimento prévios.
Os afetados foram realocados para sete agrovilas, mas a ONG Justiça Global alega que elas sofreram uma "alteração dos costumes e práticas e são até os dias atuais privadas de condições adequadas de vida, com a falta de saneamento básico e de políticas públicas de educação, transporte e saúde, de liberdade perante o território e de organização social."
Segundo comunicado da Justiça Global, o governo brasileiro teve "diversas oportunidades de reparar as violações, mas não o fez."
As famílias expulsas de seus territórios enfrentam até hoje os impactos nos sistemas alimentares e de renda. A terra das agrovilas não têm tamanho ou qualidade para agricultura e cultivo de alimentos fundamentais.
Comunicado Justiça Global

Município mais quilombola do país
Alcântara é um município com 18 mil pessoas, segundo o Censo 2022 do IBGE, e concentra a maior população quilombola do país: quase 85% das pessoas vivem nas comunidades.
A região foi uma das primeiras do Brasil a receber negros escravizados da África —às vésperas da independência em 1822, o Maranhão tinha o maior percentual de pessoas escravizadas do Império: em torno de 55%.
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