Argentina: protesto que uniu aposentados e torcidas terminou com 53 feridos
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Um protesto violento em Buenos Aires contra a perda de direitos de idosos e o declínio no valor das aposentadorias ontem resultou na prisão de 124 pessoas e deixou 53 feridos, sendo um em estado grave, segundo o jornal argentino La Nacion.
O que aconteceu
A manifestação de aposentados foi apoiada também por torcidas organizadas de futebol. O protesto foi convocado por sindicatos e organizações sociais e tomou as ruas na tarde de ontem em Buenos Aires.
Atos públicos dos aposentados ocorrem todas as quartas-feiras há anos. Eles exigem atualização do valor das aposentadorias, o restabelecimento da cobertura dos custos com medicamentos e a continuação da moratória previdenciária, que termina no final de março e permite que pessoas se aposentem sem ter cumprido os 30 anos de contribuição.
Nos últimos meses, a polícia passou a reprimir esses atos com gás lacrimogêneo e violência física contra os idosos. O protesto desta quarta-feira teve o número de participantes multiplicado exponencialmente, com a adesão de torcidas organizadas de cerca de 30 times de futebol.

Manifestantes e policiais entraram em confronto no meio da tarde. A polícia utilizou balas de borracha, gás lacrimogêneo e canhões de água contra os manifestantes, que atiraram pedras das calçadas, fogos de artifício e bombas de efeito moral.
Uma viatura policial e uma motocicleta foram incendiadas pelos manifestantes. Outros sete veículos da Secretaria de Segurança de Buenos Aires foram vandalizados.

Uma aposentada de 87 anos, identificada como Beatriz Bianco, ficou gravemente ferida após bater a cabeça no chão. Ela caiu após ser empurrada por um policial.
Pablo Grillo, fotógrafo de 35 anos, trabalhava na cobertura do fato quando foi atingido na cabeça por um cartucho de gás lacrimogêneo. Grillo foi operado com urgência na noite de quarta-feira. Ele está internado na UTI e seu estado de saúde é grave.

O chefe de Gabinete da Argentina, Guillermo Francos, afirmou que o caso do fotógrafo foi "um acidente não previsto". "São as consequências lamentáveis de um episódio violento como o que esse grupo gerou ontem nos arredores do Congresso e depois levou até a Praça de Maio."
Durante a madrugada, a justiça de Buenos Aires liberou 114 dos 124 manifestantes presos. A juíza Karina Andrade afirmou que as prisões "afetam direitos constitucionais fundamentais, como o direito ao protesto, à manifestação em democracia e à liberdade de expressão", de acordo com um documento a que o Clarín teve acesso.
Entre os 53 feridos estão manifestantes, agentes de segurança e trabalhadores. O governo de Buenos Aires estimou um prejuízo de cerca de 275 milhões de pesos (R$ 1,5 milhão).
Governo fala em espécie de 'golpe de Estado'
O chefe de Gabinete afirmou que os manifestantes quiseram realizar uma "espécie de golpe de Estado" contra o governo do presidente Javier Milei. "Eles não encontram brechas, então têm a ideia original de colocar torcidas organizadas para defender os direitos dos aposentados. Isso gerou os distúrbios que todos vimos ontem, a utilização da violência como instrumento e, a partir do que foi gerado com essa violência e a resposta das forças de segurança, essa marcha ao grito de 'que todos se vão'."

Francos também afirmou que esse tipo de manifestação sempre será reprimido "de maneira adequada". "Porque as manifestações seguem um protocolo, não podem usar armas, começar a jogar pedras destruindo tudo e deixando um rastro de danos na cidade para realizar um protesto. Tivemos mais de um ano de tranquilidade nos espaços públicos e nas ruas, e não vamos permitir que isso mude", disse.
Aumento da pobreza gera revolta
Apesar do governo Milei ter reduzido a inflação de 221,4% em 2023 para 117,8% em 2024, suas políticas resultaram na perda de 200 mil empregos, paralisação de obras públicas e aumento das taxas de pobreza e pobreza extrema. A política de Milei de liberar os preços dobrou o custo dos medicamentos e serviços essenciais em um ano.
Quase 60% dos aposentados recebem a pensão mínima, equivalente a cerca de R$ 1.970. No ano passado, o governo congelou um bônus de aproximadamente R$ 406 para os aposentados.
"Eles estão acabando com os aposentados, os doentes, aqueles que não têm remédios, todos nós", gritava um dos manifestantes. "Não é que não haja dinheiro. Há uma decisão política de abandonar nossos idosos", disse Martín Lousteau, senador da União Cívica Radical, em sua conta no X.
"Temos que nos unir e sair às ruas para defender nossos direitos e nossa soberania", afirmou Patricia Mendía, de 60 anos. Ela estava acompanhada de sua mãe, de 84, e seguia em marcha até a Praça de Maio, onde fica a Casa Rosada, sede do governo argentino.
"Acredito que o povo está acordando, após tudo o que esse governo maldito está fazendo", disse Cristina Delgado, de 85 anos e que recebe uma aposentadoria mínima. "É muito injusto porque temos o direito à manifestação, os jovens e nós que viemos nos manifestar a vida toda. Eu passei por quatro ditaduras, mas isso aqui é pior, porque é na democracia."
(Com DW, Reuters e AFP)
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