Carlos Madeiro

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Reportagem

Festa com som e bebida em piscina natural com peixe-boi é investigada em AL

A realização de uma festa nas piscinas naturais da praia do Marceneiro, em Passo do Camaragibe (AL), está sendo investigada pelo ICMBio (Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade), órgão gestor da APA (área de proteção ambiental) Costa dos Corais. O evento ocorreu na sexta-feira (4).

Segundo vídeos divulgados no Instagram, a festa reuniu pelo menos 30 pessoas. Entretanto, eventos do tipo são proibidos por lei no local, que compõe a rota ecológica dos Milagres, como é conhecido o roteiro turístico de três cidades do litoral norte alagoano.

Na região está uma área prioritária de conservação dos peixes-boi no país, animais ameaçados de extinção e reintroduzidos ao ambiente local há 30 anos. Além disso, a APA (com 120 km de extensão) foi criada para resguardar a segunda maior barreira de coral do mundo, entre Alagoas e Pernambuco. Por isso, a visitação tem áreas limitadas e é cercada de regras para proteção do ecossistema.

Segundo pessoas ouvidas pela reportagem, porém, festas do tipo são comuns na região.

Sobre a festa

Segundo Maila Aguiar, chefe do NGI (Núcleo de Gestão Integrada) Costa dos Corais, a realização do evento pode resultar em um auto de infração de até 10 mil reais para quem organizou a festa. No local, diz, são permitidas visitas de pessoas e embarcações (com alvará da prefeitura e autorização do ICMBio), "mas sem som, comida ou bebida".

"A equipe da APA Costa dos Corais já está investigando os responsáveis. Já foram identificados alguns, e eles serão autuados já que, pelo plano de manejo da unidade, não podem ocorrer esses eventos nas piscinas naturais, devido aos corais serem organismos frágeis", explica.

Praia do Marceneiro
Praia do Marceneiro Imagem: Governo de Alagoas

A coluna mandou mensagem para a pessoa que seria uma das responsáveis pela festa e postou o vídeo da festa, mas não obteve retorno até o momento. O espaço está aberto para manifestação. Pouco após o contato, os vídeos da festa foram apagados da rede.

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Peixe-boi

Além dos danos aos corais, a praia tem uma característica que festas do tipo são consideradas inadequadas: a presença de peixes-boi.

"Eles usam a região das piscinas, é habitat natural deles; e a poluição sonora tende a afugentar os animais de áreas que eles utilizam para alimentação. É comum observar eles em áreas próximas aos recifes se alimentando de algas ou capim-agulha", diz Iran Normande, biólogo e analista ambiental do ICMBio.

Aqui em Alagoas ocorre a população de peixes-bois em maior risco de extinção, pois estamos no extremo sul da distribuição e temos uma população pequena e isolada. Na biologia da conservação, estas populações têm maiores chances de serem extintas, pois tem baixa diversidade genética e poucos indivíduos, estando mais sujeitas a eventos estocásticos, como doenças.
Iran Normande

Peixe-boi no mar de Alagoas
Peixe-boi no mar de Alagoas Imagem: Associação Peixe Boi

Eventos são comuns

O problema, porém, vai além da festa de sexta. Segundo fontes locais ouvidas pelo UOL, eventos nessas piscinas são rotineiros.

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E não é difícil achar coisas do tipo: basta uma pesquisa nas redes sociais para ver que eventos são comuns, com casamentos até sendo realizados nas piscinas naturais da região.

Para o pesquisador Robson Santos, coordenador do Ecoa-Lab (Laboratório de Ecologia e Conservação no Antropoceno) da Ufal (Universidade Federal de Alagoas), a realização de eventos desse tipo se torna ainda mais grave por ser uma área federal destinada à preservação ambiental.

Essas unidades de conservação são desenhadas para regrar o uso daquele ambiente em áreas de uma importância maior. Isso acaba ferindo os próprios objetivos da unidade de conservação. Isso acaba promovendo uma pressão sobre a própria unidade porque as pessoas veem que é rentável do ponto de vista econômico, então ela está sempre movimentada.
Robson Santos

Para sinalizar o problema às autoridades, ele e outros cinco pesquisadores produziram uma nota técnica, em fevereiro, listando os problemas que esse tipo de danos que atividade causa, citando também o risco "à manutenção das atividades do próprio setor do turismo em médio e longo prazo e redução da procura do destino."

"Danos à biodiversidade das regiões recifais decorrentes da navegação, ancoragem, pisoteio e quantidade de turistas acima da capacidade do ambiente, causando não somente dano físico e biológico, mas também prejudicando o apelo estético dos recifes de coral para os turistas", cita um dos trechos da nota.

Costa dos Corais, maior área de preservação ambiental costeira do Brasil
Costa dos Corais, maior área de preservação ambiental costeira do Brasil Imagem: Fundação Toyota do Brasil
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Mais fiscalização

Segundo Maila Aguiar, as embarcações locais já sabem da proibição da realização de eventos com bebida e som no local. "Apesar do turista não saber, as embarcações estão cientes. Eles devem seguir as orientações do plano de manejo, mas infelizmente estão descumprindo",

Uma das prioridades de sua gestão na APA, diz, é coibir a realização desse tipo de evento ilegal. "Juntamente com o restante da equipe, estamos pensando em formas de controle maior."

"A equipe de fiscalização atua em média cerca de 200 dias ao ano com atividades em campo, mas mesmo assim é difícil monitorar toda a extensão da unidade de 120 km", diz Maila, que assumiu o cargo de chefia da APA em dezembro de 2024.

Reportagem

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

17 comentários

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Fernando Souza

Estive visitando a região em dez/24 e vi isso também. Na ocasião, iniciei minha visita às 07hs, então estava praticamente vazio e silencioso. Quando estava acabando, por volta de 10:30/11hs, já estava virando esse caos aí. Realmente lamentável 

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Jo o Paulo Uriartt da Rosa

Outra festa?? Esses dias já tinham falado de uma bagunça em área protegida.. Proíbe tudo e fim! Cadê a Marinha brasileira pra fiscalizar isso? Seria mais útil colocar corvetas armadas pela área do que ficar de devaneios com submarino nuclear... 

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Denise Helena de Moraes

Estão destruindo esse litoral ! Cheio de empreendimentos enormes e turismo desenfreado, daqui alguns anos vai ser um caos...

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