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Crise Climática

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Supremo pode frear parte da agenda antiambiental de Bolsonaro

Ministro Luiz Fux em sessão do STF - Carlos Moura/STF
Ministro Luiz Fux em sessão do STF Imagem: Carlos Moura/STF

Colaboração para o UOL, em São Paulo

31/03/2022 11h00

Esta é parte da versão online da edição desta quinta-feira (31/03) da newsletter Crise Climática, que discute questões envolvendo a emergência climática, como elas já afetam o mundo e quais são as previsões e soluções para o futuro. Para assinar o boletim e ter acesso ao conteúdo completo, clique aqui.

O STF (Supremo Tribunal Federal) pode impor uma derrota parcial à política antiambiental do presidente Jair Bolsonaro (PL) e do Congresso ao julgar de uma só vez sete ações que envolvem natureza e clima. A chamada "pauta verde" começou a ser julgada ontem (30) e é observada de perto por organizações socioambientais e movimentos indígenas.

Entre as demandas, estão ações apresentadas por partidos de oposição ao governo (PT, PSB, PDT, PSOL, PV, Rede e PCdoB). Eles denunciam atuações arbitrárias de órgãos ambientais federais, como o Ministério do Meio Ambiente, Ibama, Funai e ICMBio.

"Que o STF dê passos importantes para a garantia do direito fundamental ao meio ambiente ecologicamente equilibrado garantido na Constituição de 1988", comentou no twitter a deputada Joênia Wapichana (Rede-RR).

Duas ações entraram na pauta nesta quarta-feira. Uma delas é a ADF 760, que reivindica que o governo federal volte a executar a principal ferramenta para combater o desmatamento na Amazônia Legal: o PPCDAm (Plano de Ação para Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia).

Quando o plano foi criado, em 2004, o desmatamento na Amazônia apresentava os índices mais altos da história (27,8 mil km²/ano). Após a implementação desta política, o desmatamento caiu consideravelmente, sendo que em 2012 a taxa estava em 4,5 mil km²/ano. A meta para o ano de 2021 era estar abaixo de 3 mil km²/ano, mas desde 2016, o desmatamento da Amazônia cresce de maneira acelerada em vez de cair, registrando mais de 10 mil km²/ano no ano passado.

O ministro Bruno Bianco Leal, da Advocacia Geral da União, argumentou em sua sustentação oral que as ações minam a ação legítima do poder executivo federal e configurariam uma violação da separação entre os poderes.

"Não há que se cogitar qualquer violação de separação entre poderes" afirmou Maurício Guetta, consultor jurídico do Instituto Socioambiental em sua sustentação oral no STF, no qual participa na condição de amicus curiae. "O que se pede, em consonância com a jurisprudência deste tribunal, é que esta corte determine que as autoridades públicas federais implementem a política ambiental existente."

Guetta também destacou que multas e outras penalidades ambientais deixaram de ser aplicadas desde 2019, em descompasso com a atual legislação e com o próprio aumento da criminalidade ambiental no período. "Estamos destruindo nosso maior patrimônio, inclusive econômico. Os ciclos hidrológicos já estão sofrendo severos impactos", argumentou.

O jurista Luiz Henrique Eloy Amado Terena, representando a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB), afirmou em sua sustentação oral, também na condição de amicus curiae, que o PPCDam foi "a maior e mais eficiente política pública de Estado para a redução do desmatamento da Amazônia."

Para o advogado, o que está em risco é a defesa do patrimônio público. "Ainda que a Floresta [Amazônica] não seja a morada de todos os brasileiros, um dado é certo: sem ela não haverá vida na Terra como conhecemos hoje. Sua destruição impacta todos os brasileiros, sem exceção."

O Pará Terra Boa deu um resumo do que trata cada uma das sete ações da "pauta verde" do STF. O podcast O Assunto, da jornalista Renata Lo Prete, ouviu pesquisadores e ativistas sobre como a litigância climática pode ajudar a frear retrocessos ambientais no país. O jurista Caio Borges, do Instituto Clima e Sociedade, fez um fio com um balanço deste primeiro dia de julgamento.

Abril Indígena

A "pauta verde" do STF ocorre às vésperas do Acampamento Terra Livre, uma mobilização indígena que ocorre todos os anos desde 2004, sempre no mês de abril, com marchas em Brasília. O evento deu origem à APIB e foi criado como resposta ao famigerado "dia do índio". Este ano, o acampamento vai de 4 a 15 de abril e terá como tema a "retomada do Brasil", exigindo a volta dos processos de demarcação das Terras Indígenas ainda não reconhecidas pelo Estado brasileiro.

E o que mais você precisa saber

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Estreito de Gerlache, na Antártica
Imagem: Eduardo Vessoni

Derretendo

Você leu nesta coluna que o aquecimento simultâneo dos dois polos do planeta em março, com uma anomalia de 40°C de aquecimento no platô antártico, chocou os mais experientes climatologistas. A NASA divulgou esta semana imagens de satélite registradas entre 9 de janeiro e 23 de março, quando uma massa de gelo do tamanho da cidade do Rio de Janeiro (1,2 mil km²) colapsou no leste da Antártica. Isto pode ser um indício de que o continente que concentra mais de 90% do gelo da Terra está chegando mais cedo do que o previsto a um tipping point, um ponto após o qual o degelo aumentaria exponencialmente.

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Imagem: Marcio Isensee e Sá/Repórter Brasil

O peão está vivo

Um trabalhador rural da Fazenda São Sebastião, no Maranhão, levou um tiro na nuca ao cobrar seu salário e sobreviveu. Na segunda-feira (28) a Polícia Federal foi à propriedade onde o crime ocorreu e resgatou outros três funcionários em condições análogas à escravidão. O latifúndio pertence à família de Samy Wilker Novaes Aguiar, que fornece carne ao frigorífico Fribal e arrenda terras à companhia Suzano Papel e Celulose - uma área superior a seis vezes o Parque do Ibirapuera, em São Paulo. Há indícios de que os trabalhadores estejam contaminados por agrotóxicos. A Repórter Brasil, parceira do UOL, deu a história com exclusividade.

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Microplástico
Imagem: Getty Images

Plástico nas veias

A imprensa global repercutiu o alcance sem precedentes da poluição plástica: ela está na corrente sanguínea humana. Uma pesquisa realizada na Holanda e publicada na quinta (24) analisou 22 pacientes adultos, e encontrou microplástico no sangue de 17 deles, com metade da amostra contaminada por plástico PET usado para engarrafar bebidas. Os impactos à saúde ainda são pouco conhecidos, mas os cientistas temem que as micropartículas se alojem em órgãos e danifiquem células. O UOL e o britânico The Guardian dão detalhes.

conta de luz - iStock - iStock
Imagem: iStock

Lá vem o lobby do gás

Assim que o Projeto de Lei 414, que pretende modernizar o setor elétrico, começou a ser debatido na Câmara, uma emenda para obrigar a construção de uma rede de gasodutos foi apresentada. A proposta, apelidada de Brasduto, é uma velha bandeira da indústria fóssil. Associações de consumidores e organizações ambientais emitiram uma nota contra este "jabuti", e alegam que ele desfigura o projeto e ajuda a manter o preço das tarifas lá em cima e a aumentar a dependência da importação de Gás Natural Liquefeito (GNL). Mais de 90% deste combustível usado em termelétricas é importado dos EUA, e o preço não para de subir.

E tem mais: O CanalEnergia divulgou que outra emenda ao PL 414 tenta abocanhar recursos destinados às atividades de pesquisa e desenvolvimento do setor elétrico.

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Presidente da COP26, Alok Sharma
Imagem: . Andrew Parsons/10 Downing Street/Handout via Reuters

Diplomacia climática

O presidente da última Conferência do Clima da ONU (COP26), Alok Sharma, visitou o Brasil esta semana. Ele teve encontros com autoridades federais, além de governadores e prefeitos, empresários e lideranças das organizações sociais. Na pauta se destacam a cooperação para energia renovável e as promessas de emissão zero líquida, os chamados "planos net-zero".

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Na sexta-feira (25), dois autoproclamados líderes climáticos - a União Europeia e os Estados Unidos - anunciaram a criação de uma força tarefa para reduzir a dependência da Europa em relação aos combustíveis fósseis russos. O que esta iniciativa significa para o clima? Spoiler: expansão da produção de combustíveis fósseis e um aumento abrupto das emissões lançadas na atmosfera. O Brasil também usa a guerra para justificar aumento na produção de petróleo que já tinha sido anunciado.

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Tradutor: Supremo pode frear parte da agenda antiambiental de Bolsonaro

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL