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Diogo Schelp

Por que os petistas estão preocupados com demissão de Moro

Colunista do UOL

25/04/2020 13h51Atualizada em 25/04/2020 16h11

Bolsonaristas e petistas se uniram nos ataques ao ex-ministro da Justiça Sergio Moro. Em alguns pontos, até os argumentos são os mesmos. O fato de ele ter entregado ao Jornal Nacional mensagens de celular que desmentem o presidente Jair Bolsonaro, por exemplo, foi usado tanto por influenciadores bolsonaristas quanto por petistas para levantar a teoria de que haveria uma conspiração de Moro com a Rede Globo.

Entre os que se juntaram a esse coro está o porta-voz do PT no site The Intercept e uma cantora de MPB e seus seguidores. Um deles chegou a escrever que Bolsonaro pelo menos acertou em uma coisa em seu pronunciamento: que Moro conspira para derrubá-lo e que a edição do Jornal Nacional era uma prova disso.

Ora, mas tudo o que o PT queria não era justamente uma boa justificativa para tirar Bolsonaro do poder? Luiz Inácio Lula da Silva, o ex-presidiário líder do partido, não havia dado o aval para a adesão ao #ForaBolsonaro apenas dois dias antes da demissão do ministro?

Os adversários de Moro na esquerda querem fazer crer que estão preocupados com eventuais ilegalidades que ele possa ter cometido ao aceitar o cargo no Ministério e no exercício dele. Citam, por exemplo, o pedido de Moro para que sua família não ficasse desassistida caso algo de ruim acontecesse com ele por causa de sua luta contra o crime organizado. Fernando Haddad, o ex-candidato presidencial do PT, seguiu essa linha em artigo na Folha de S.Paulo — além, é claro, de insistir na inocência de Lula nos crimes pelos quais foi condenado.

No Twitter, a ex-presidente Dilma Rousseff também tratou de concluir, a partir do pronunciamento-bomba de Moro, que o ex-juiz da Lava Jato deveria pedir "desculpas ao povo brasileiro por todas as mentiras que contou sobre Lula".

Este colunista foi o primeiro a defender a renúncia de Moro logo que estourou, há quase um ano, o escândalo das mensagens trocadas com procuradores da Lava Jato. Mas aquele episódio não absolve Lula, que foi condenado em primeira, segunda e terceira instância. Também não apaga o gigantesco esquema de corrupção montado nos governos do PT.

(Para ajudar os petistas em seus ataques a Moro, neste sábado (25) Bolsonaro tratou de usar a expressão "Vaza Jato", como o episódio das mensagens de Moro ficou conhecido, ao lembrar que apoiou o ministro quando este precisou.)

O fato é que a indignação contra o pedido de pensão para a família, as críticas à atuação de Moro à frente do Ministério (algumas delas justificadas) e a teoria do complô com a Globo são apenas cortina de fumaça para o verdadeiro motivo pelo qual o ex-juiz está sob ataque das hostes petistas: fora do governo, ele atrapalha muito os planos do partido de voltar ao poder.

Não apenas pela popularidade, maior do que as de Bolsonaro e de Lula, que pode fazer dele uma candidato fortíssimo nas eleições presidenciais de 2022, mas também porque ele é visto, à esquerda e à direita, como o grande responsável pela derrocada do projeto de poder do PT.

Há aqui uma distorção de relação entre causa e efeito: o discurso petista atribui a Moro a culpa pela eleição de Bolsonaro. Errado. O que levou à eleição de Bolsonaro foi a corrupção desavergonhada nas gestões petistas.

O PT resistia em pedir o impeachment de Bolsonaro entre outros motivos porque, como estratégia eleitoral, era preferível deixá-lo "sangrar" politicamente até 2022. A inoperância do presidente em lidar com a pandemia e a inevitável crise econômica que se seguirá se encarregariam disso. Um governo menos histriônico na mão do general Hamilton Mourão não contribuiria para o caos que poderia beneficiar o PT.

A participação de Bolsonaro em uma manifestação com agenda golpista no domingo (19), contudo, forçou o PT a aderir à pressão pela saída do presidente.

As acusações contra Bolsonaro que vieram na esteira da demissão de Moro reforçam a causa #ForaBolsonaro, mas o PT está centrando fogo no mensageiro. Afinal, é ele a verdadeira ameaça ao projeto de poder do partido.