Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.
Com Lula e Bolsonaro, os aloprados têm vez
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1.
Em 25 de setembro de 2006, um ano após o estouro do mensalão e a seis dias da eleição presidencial, Lula tentou se descolar do que chamou de "bando de aloprados" do PT.
Valdebran Carlos Padilha e Gedimar Pereira Passos, ligados ao partido, haviam sido presos pela Polícia Federal no dia 15, com 1,7 milhão de reais, em um hotel de São Paulo. O dinheiro seria usado para comprar o chamado "dossiê Vedoin", oferecido pelo empresário, também alvo de mandado de prisão, Luiz Antônio Vedoin, dono da Planam, empresa que comandou a máfia dos sanguessugas.
O dossiê teria provas da relação - o que não se confirmaria nas investigações do caso - de José Serra e Geraldo Alckmin com o esquema de desvio de dinheiro público para a compra de ambulâncias superfaturadas. Os tucanos disputavam o governo paulista e a presidência da República com os petistas Aloizio Mercadante e Lula, respectivamente.
"No caso do pessoal que cuidava da pseudo-inteligência de minha campanha nem fui eu que escolhi. Quem escolheu foi o presidente do partido, que era o coordenador da campanha eleitoral", declarou Lula, responsabilizando Ricardo Berzoini. "Não quero saber apenas de onde veio o dinheiro, quero saber quem é que montou essa engenharia política para essa barbárie que foi feita, quero saber quem é o engenheiro que arquitetou uma loucura dessas, porque se um bando de aloprados resolveram (sic) comprar um dossiê é porque alguém vendeu para eles que esse dossiê deve ter coisas do arco-da-velha."
Ministro da Previdência no primeiro mandato, Berzoini não quis contrariar o então candidato à reeleição: "Se o presidente Lula falou, está falado." Em seguida, também tentou se descolar, alegando ter sido "responsável pela contratação das pessoas, mas não por seus atos". Por precaução, foi afastado do comando oficial da campanha lulista.
Apesar do escândalo e da vitória de Serra sobre Mercadante, Lula derrotou Alckmin, foi reeleito e, quatro anos depois, fez a sucessora, também reeleita, Dilma Rousseff, em cujo segundo mandato Berzoini voltou a ser ministro, dessa vez das Comunicações.
A reportagem "Berzoini assume e já cita projeto de censura da imprensa", publicada no site de Veja em janeiro de 2015, mostrava a iniciativa do "fiel escudeiro" de Lula, com "raízes no sindicalismo bancário" e ligado às "alas mais radicais do partido", para fazer avançar o que o PT chamava de "regulação econômica da mídia". Comentei a matéria na ocasião, comparando o projeto petista à censura imposta pela ditadura chinesa (sim, bolsonaristas, eu já a repudiava anos antes de virar moda entre reacionários antivacina).
Em 2022, agora com Alckmin de vice na chapa, Lula voltou a defender a "regulação da mídia" em sua campanha e, apesar de estar à frente de Jair Bolsonaro nas pesquisas, nenhum petista tem sido mais aloprado que ele, que ainda repercutiu a propaganda de Vladimir Putin contra a Ucrânia em plena invasão russa, conclamou sindicalistas a incomodarem a família de parlamentares em suas próprias casas, demonizou como "escravocratas" os defensores da reforma trabalhista que acabou com o imposto sindical da sua companheirada, xingou de "escravista" a elite, declarou que a classe média ostenta um padrão acima do necessário, passou pano para ladrões de celular e deu a entender que não considera policial gente, único caso em que veio a pedir desculpas.
2.
Já Bolsonaro não precisa se descolar de correligionários presos pela PF, porque, quando delegados miram qualquer pessoa ligada ao presidente, eles são removidos das funções pela cúpula bolsonarista da corporação, antes que prisões sejam decretadas.
Em 6 de abril de 2021, fiz um comentário no rádio que rendeu o vídeo intitulado "Bolsonaro troca comando da PF após filho 04 virar alvo". Em 12 de maio de 2022, veio a consequência do que apontei na raiz: "Delegado da PF despenca do cargo após investigar Jair Renan", informou o Estadão.
O presidente, porém, não tem controle sobre o ministro Alexandre de Moraes, do STF, que, de vez em quando, manda prender um ou outro bolsonarista de fora da família. Oito meses depois do ato de 7 de setembro em que prometeu não mais cumprir decisões judiciais de Moraes e a cinco meses da eleição presidencial, Bolsonaro tentou se descolar dos reacionários aloprados que tanto atiçou e blinda.
"Você tem que ter pena do cara que levanta faixa do AI-5. Não existe isso. Tem que ter pena dessas pessoas que não querem aprender."
O presidente teve tanta pena que concedeu a Graça a Daniel Silveira, que, entre outras barbaridades, defendeu o AI-5, "aquele que", depois do "contragolpe militar" à "manobra comunista", "cassou 3 ministros da Suprema Corte". "Vocês deveriam ter sido destituídos do posto de vocês", disse o deputado bolsonarista.
Outros três reacionários foram presos, a pedido da PGR, às vésperas do 7 de setembro, porque fizeram as incitações e ameaças de tiro, morte, eliminação, caça e invasão que mostrei no artigo "A bolha bolsonarista e o crepúsculo de Bolsonaro".
Em atos bolsonaristas, ainda se tornaram comuns as faixas em defesa de fechamento do Congresso e do STF, intervenção militar com Bolsonaro no poder e, em referência a exatamente isso, "Eu autorizo, presidente". Isto sem falar na defesa de teses jurídicas sobre o (falso) "poder moderador" das Forças Armadas pelo jurista cuja filha ganhou cargo no governo, que ainda emprega cinco integrantes do instituto fundado por ele.
"Só um psicopata ou imbecil para dizer que os movimentos de 7 de setembro e 1º de maio são atos que atentam contra a democracia. Quem diz isso é psicopata ou imbecil", disse o mesmo presidente que se compadeceu da turma pró-AI-5.
Ao tentar se descolar dela, Bolsonaro tenta colar seus xingamentos a quem ouse descrever o teor antidemocrático de faixas e discursos presentes nos atos. Na disputa pelo eleitor moderado, é uma reação à narrativa lulista da frente ampla pela democracia contra o presidente golpista.
Fumaças à parte, com um ou com outro, os aloprados têm vez.
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