Tortura é prática sistemática nas prisões de São Paulo, diz órgão federal
A tortura é uma prática sistemática nas prisões de São Paulo, afirma relatório divulgado hoje pelo MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), órgão ligado ao Ministério dos Direitos Humanos e Cidadania.
Os peritos apontam que nas unidades prisionais paulistas ocorrem espancamento de presos e uso excessivo de armas não letais.
O relatório afirma também que há violência psicológica e confinamento frequente em instituições psiquiátricas e centro socioeducativos do estado de São Paulo.
As violações de direitos humanos foram identificadas em inspeções realizadas em seis prisões, duas unidades socioeducativas e três centros de saúde mental.
As visitas do MNPCT ocorreram em outubro de 2023, em sete cidades paulistas.
Dados do Censo 2022 informavam que a população carcerária de São Paulo era de cerca de 153.000 pessoas.
Os presos em São Paulo representavam 32% de todas pessoas que vivem em prisões no país, de acordo com o IBGE.
Massacre do Carandiru
O relatório é divulgado na véspera do 32º aniversário do massacre de Carandiru, quando 111 presos foram chacinado por policiais militares durante uma rebelião.
Entre as práticas mais graves, destacadas pelos peritos do Mecanismo Nacional, chamam a atenção "a existência de celas escuras e insalubres na Penitenciária de Venceslau I e a atuação do Grupo de Intervenção Rápida (GIR), responsável por procedimentos em unidades de regime disciplinar diferenciado, como a Penitenciária de Venceslau II, sem qualquer objetivo de ressocialização."
As unidades de Venceslau abrigam presos considerados líderes da facção criminosa PCC (Primeiro Comando da Capital).
Estudiosos afirmam que uma das consequências do massacre do Carandiru foi justamente a criação do PCC, em 31 de agosto de 1993, na Casa de Custódia de Taubaté.
Na penitenciária feminina de Tupi Paulista e no CDP Franco da Rocha, as inspeções apontaram "desassistência material e de saúde, além de situações de violência moral contra gestantes e mulheres com bebês aprisionadas em condições degradantes."
Já no sistema socioeducativo, "foi identificada a precariedade das instalações, a falta de atividades educativas adequadas e o uso de metodologias punitivas que podem caracterizar bullying institucional, além da presença inadequada de agentes socioeducativos masculinos nas unidades femininas".
As visitas foram feitas na Fundação Casa Chiquinha Gonzaga e São Paulo, ambas na capital paulista.
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Após a publicação desta reportagem, a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária) afirmou que os dados divulgados pelo MNPCT "não contemplam as reformas estruturais implementadas nas unidades mencionadas. As reformas foram entregues entre dezembro do ano passado e abril deste ano."
Ainda de acordo com o orgão estadual "Com foco na ressocialização da pessoa privada de liberdade, os presídios citados possuem programas de alfabetização e capacitação profissional em parceria com igrejas, órgãos do terceiro setor, órgãos de educação pública e a Fundação "Prof. Dr. Manoel Pedro Pimentel" - Funap."
A SAP declarou ainda, em sua nota enviada à coluna que a alimentação fornecida aos presos "segue o cardápio padrão elaborado por nutricionistas e inspecionados por servidores capacitados em cada presídio."
"Todas as unidades prisionais femininas possuem estrutura para acolhimentos de gestantes e bebês e distribuem kits de higiene pessoal e íntima, que são repostos conforme necessidade."
Sobre a atuação do GIR, a secretaria afirmou que o grupo atua "com agentes capacitados para o uso de equipamentos não letais e a adoção de protocolos conforme convenções internacionais de Direitos Humanos, atua para conter motins e preservar a integridade física de pessoas presas e servidores nos presídios".
Por fim, a SAP diz "disponibilizar canais para recebimento de denúncias, caso identificado eventual desvio, que podem ser feitas, sob sigilo, à Ouvidoria e à Corregedoria".
Recomendações do MNPCT
O MNPCT é composto por 11 peritos independentes. Eles fazem inspeções em centros de detenção, estabelecimentos penais, hospitais psiquiátricos, abrigos de pessoa idosa, instituições socioeducativas ou centros militares de detenção disciplinar.
O relatório do órgão foi enviado para as autoridades competentes. O documento apresentou 231 recomendações para o sistema prisional, 63 para o sistema socioeducativo e 47 para a
política de saúde mental.
Entre outras recomendações, o MNPCT sugere "o aumento do orçamento para manutenção das unidades prisionais e a garantia dos direitos das pessoas presas, a proibição de revistas vexatórias e a obrigatoriedade do uso de câmeras corporais nas intervenções policiais."
"Para as unidades socioeducativas, recomenda-se o cumprimento da Resolução 225/2021, que proíbe a custódia de meninas por agentes masculinos, e a implementação de mais atividades de socialização".
Resposta da Fundação Casa
Procurada pela coluna, a Fundação Casa enviou a seguinte nota abaixo:
"A Fundação CASA esclarece que está em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) e o Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase). As práticas mencionadas não refletem suas diretrizes operacionais, e a Fundação não tolera qualquer forma de metodologia punitiva ou bullying institucional.
A gestão atual prioriza o atendimento humanizado em seus 97 centros socioeducativos, incluindo os Casas Chiquinha Gonzaga e São Paulo, com equipes multidisciplinares dedicadas à reintegração social e ao respeito aos direitos dos jovens, sem a utilização de práticas punitivas. A presença de agentes socioeducativos masculinos em unidades femininas é restrita a situações necessárias, priorizando agentes femininas para garantir a privacidade e dignidade das adolescentes.
As unidades passam por avaliações constantes para garantir ambientes adequados e seguros, como também recebem visitas de correição do sistema de Justiça para acompanhamento e fiscalização do desenvolvimento da medida socioeducativa. Os adolescentes em cumprimento de medidas socioeducativas tem acesso a diversas atividades educativas como escolarização formal, oficinas profissionalizantes, ações esportivas, culturais, entre outras, em conformidade com as diretrizes do ECA.
A Fundação CASA reafirma seu compromisso com a melhoria contínua e a transparência na gestão dos serviços socioeducativos."
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