Topo

Jamil Chade

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Com recorde de mortes, Brasil vive indefinição sobre representação na OMS

4.mai.2020 - O cancheler basileiro, Ernesto Araujo, e o presidente Jair Bolsonaro - Ueslei Marcelino/Reuters
4.mai.2020 - O cancheler basileiro, Ernesto Araujo, e o presidente Jair Bolsonaro Imagem: Ueslei Marcelino/Reuters

Colunista do UOL

29/03/2021 04h00

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

No momento mais crítico da pandemia da covid-19 no Brasil, o governo vive uma indefinição em sua representação diplomática diante da OMS (Organização Mundial da Saúde), o epicentro da resposta global à crise sanitária. A situação, segundo negociadores tanto da OMS como do governo, enfraquecem a ação do Brasil para defender os interesses nacionais, negociar acesso às vacinas e apoiar uma resposta global contra a pandemia.

Na semana passada, a embaixadora que ocupava o cargo, Maria Nazareth Farani Azevedo, deixou o posto que ocupava durante quatro anos e foi transferida para o consulado em Nova Iorque, como estava previsto.

Mas a crise entre o chanceler Ernesto Araújo e o Senado agora impede que um novo chefe da missão seja designado. Por enquanto, o posto em Genebra o está sendo comandado pela embaixadora Maria Luisa Escorel, que já estava na cidade e tem o cargo oficial de "representante permanente alterna". Apesar de sua competência reconhecida dentro do Itamaraty, ela é considerada como "junior" para ocupar de maneira definitiva um posto chave na diplomacia. Além de representante na OMS, ela acumula o cargo de chefe da missão do Brasil junto à ONU, OIT e outros organismos internacionais com sede em Genebra.

Originalmente, o posto seria ocupado pelo embaixador Fabio Marzano, um aliado do chanceler Ernesto Araújo e considerado como uma das vozes mais importantes dentro do movimento ultraconservador no Itamaraty.

Em uma sabatina no começo do ano, porém, um desentendimento levou o Senado a vetar seu nome.

Ali, segundo observadores, já seria um sinal claro da insatisfação dos senadores em relação à condução da política externa do governo de Jair Bolsonaro.

Um novo nome teve de ser buscado dentro do Itamaraty e o escolhido foi o experiente diplomata Tovar Nunes, uma pessoa considerada como "de consenso" dentro da diplomacia e distante da ala ideológica que domina a formulação das estratégias políticas do país.

Mas seu nome teria de passar pelo Senado e, desde a humilhação que Ernesto Araújo sofreu na semana passada em uma audiência entre senadores, as sabatinas e votações foram colocaram em questão.

Senadores sugeriram suspender qualquer tipo de nomeação até que a situação na chancelaria seja resolvida.

Brasil enfraquecido em momento crítico

Para diplomatas, ainda que o Brasil continue com uma representante alterna, uma indefinição revela a fragilidade do Itamaraty num momento considerado como chave.

O posto, hoje, vive um momento de intensas negociações. Nas próximas semanas, a OMS submeterá à votação resoluções sobre o acesso à tecnologia e sobre vacinas.

Além disso, os atrasos em relação à distribuição de vacinas por meio da Covax são debatidos semanalmente, enquanto governos também se prepararam para iniciar uma ampla reforma da OMS.

Para maio também está previsto um exame sobre como cada país reagiu diante da pandemia e o Brasil estará no centro das atenções.

Enquanto o enfraquecimento é evidente, a disputa pelo cargo de Araújo é intenso dentro do governo. Dias depois de sair de Genebra, Maria Nazareth Farani Azevedo passou a aparecer nos meios diplomáticos e na imprensa com a tese de que teria sido ela a responsável por garantir a adesão do Brasil no Covax, a aliança mundial de vacinas. O gesto foi recebido dentro do Itamaraty como parte de sua própria campanha para eventualmente ocupar o cargo do chanceler Ernesto Araújo.

Em abril, quando o projeto mundial de vacinas foi lançado em Genebra, a missão representada por ela não estava presente. Segundo a coluna apurou, o envolvimento final do Brasil foi decidido fora do Itamaraty e em reuniões no Palácio do Planalto, com membros da presidência, Ministério da Saúde e o Itamaraty.