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Jamil Chade

REPORTAGEM

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Lula e Biden montam ofensiva contra extremismo e refundam relação bilateral

9.fev.2023 - O presidente Lula e sua esposa, Janja, chegam a Washington - Reprodução/Twitter/Lula
9.fev.2023 - O presidente Lula e sua esposa, Janja, chegam a Washington Imagem: Reprodução/Twitter/Lula

Colunista do UOL, em Washington

10/02/2023 04h00

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Com sinalizações sobre um acordo para o financiamento do combate ao desmatamento e um compromisso político de defesa da democracia, os presidentes Luiz Inácio Lula da Silva e Joe Biden se reúnem nesta sexta-feira (10) em Washington pela primeira vez de forma presencial.

A reunião marcará um esforço dos dois países para virar a página da Era Bolsonaro, enterrar o negacionismo e dar uma resposta à ameaça de enfraquecimento das instituições democráticas.

Diplomatas de ambos os lados também destacam que a meta é dar o pontapé inicial para refundar a relação bilateral entre as duas maiores economias das Américas e montar uma ofensiva contra a extrema direita.

Serão retomados mais de dez mecanismos de cooperação bilateral sobre temas como combate ao racismo, promoção de direitos humanos ou comércio que estavam congelados nos últimos anos.

Lula ainda convidará Biden para visitar o Brasil em 2024, para marcar os 200 anos da relação bilateral. Lula desembarcou na capital americana nesta quinta-feira e, segundo fontes que viajaram no avião com o presidente, a delegação usou parte do trajeto para ler a tradução do discurso de Biden para o Congresso americano, no início da semana.

A comitiva ficou satisfeita em ver um tom progressista em diversos temas, incluindo questões trabalhistas, de direitos humanos e outras bandeiras. O espaço relativamente pequeno dado por Biden para Rússia e China, no discurso, foi interpretado como um sinal de que a ala mais dura do governo poderia estar perdendo espaço.

Democracia e ofensiva contra a extrema direita

Com Biden e Lula vivendo a ameaça da extrema direita em seus respectivos países, um dos compromissos que deve ser anunciado é uma ofensiva para proteger as instituições democráticas, lutar contra a desinformação e mesmo lidar com o papel das redes sociais.

Para observadores americanos, o gesto de Biden de alertar os militares brasileiros de que não haveria respaldo a um eventual golpe de estado no país foi fundamental para minar um eventual esforço de parte das Forças Armadas para apoiar aventuras autoritárias do bolsonarismo.

Biden ainda falou em duas ocasiões com Lula, inclusive depois dos ataques de 8 de janeiro contra as instituições em Brasília. Agora, o foco será o de mandar uma mensagem de que haverá uma aliança entre as democracias contra essas ameaças.

América Latina: campo de disputa

Lula ainda vai sinalizar para Biden sobre a necessidade de proteger o restante da América Latina da ameaça da extrema direita, apontando para novos atores que surgem em Chile, Colômbia ou Argentina. O recado é de que Washington e os novos movimentos de centro esquerda contam com os mesmos adversários: as forças autoritárias, antidemocráticas e negacionistas da extrema direita. "Essa é uma realidade dos EUA, do Brasil, do Chile, Argentina ou Colômbia", destacou um negociador.

No governo brasileiro, o esforço será o de mostrar aos americanos que a nova esquerda latino-americana quer uma boa relação com Washington.

Mas a equipe de Lula também falará com os assessores e diplomatas de Biden sobre o que consideram ser um erro: a estratégia americana para a Venezuela de Nicolás Maduro. O Itamaraty vai dizer que, se a Casa Branca insistir no isolamento de Caracas, estará facilitando o desembarque no país da influência chinesa e russa.

Para o Brasil, o foco deve ser a eleição na Venezuela em 2024 e permitir que o governo de Maduro aceite condições adequadas para a participação de diferentes partidos e com regras justas. Para isso, portanto, o caminho não pode ser um aumento da pressão, e sim uma distensão nos mesmos moldes que Barack Obama fez com Cuba.

O Itamaraty também já sinalizou que, se convidado, está disposto a participar de um processo de diálogo entre Maduro e a oposição venezuelana.

Clima como instrumento de aproximação

O encontro ainda resultará no anúncio de um compromisso dos americanos para financiar o combate ao desmatamento no Brasil, seguindo as mesmas linhas de Noruega e Alemanha. O volume de recursos ainda seria limitado. Mas representaria um primeiro gesto de confiança e de aproximação entre os dois países.

Marina Silva, que participa da comitiva, já sinalizou que quer recursos estrangeiros para reconstruir os órgãos de estado minados pelos bolsonarismo e compensar a queda de orçamento para 2023.

Mas ainda existem dificuldades para permitir que os americanos possam participar de uma maneira mais ampla do Fundo Amazônia. Enquanto o sistema está focado na redução do desmatamento, o governo de Biden quer ampliar sua participação em esforços sobre clima e tecnologia.

Os dois governos vão instruir seus ministros a montar um plano de cooperação bilateral nesse sentido.