Com 7 regimes autoritários no Brics, China sai vitoriosa e Brasil em dilema
A ampliação do Brics é a consolidação do bloco como um dos atores centrais no cenário internacional e uma força real de questionamento das decisões unilaterais tomadas pelo G7. Com a expansão, o Brics cristaliza uma nova relação de forças no mundo.
Mas para diplomatas até mesmo de dentro do Itamaraty, a escolha dos novos membros colocará um dilema para o Brasil, suas estratégias de política externa e mesmo a agenda progressista de direitos humanos que está sendo desenvolvida.
A pergunta que se faz na chancelaria brasileira é simples: com qual credibilidade regimes autoritários como Irã, China, Etiópia, Rússia, Egito, Arábia Saudita ou Emirados vão entrar em debates sobre direitos humanos?
Como ficará a coordenação de posições do Brics em órgãos como o Conselho de Direitos Humanos da ONU? Até que ponto a nova aliança será usada para enterrar questionamentos legítimos de violações em um desses estados?
Na declaração final do bloco, aprovada nesta quinta-feira, diplomatas do Brasil conseguiram que o texto mencionasse explicitamente a defesa dos direitos humanos e da democracia.
Mas, entre os negociadores, não faltavam ironias: quais direitos? E para quem? E até que ponto aquilo não passou apenas de um gesto, sem consequências, para agradar a comunidade internacional e o próprio Brasil.
Com a expansão, a realidade é que de onze países, o Brics terá em sua rede sete regimes autoritários, frequentemente denunciados pela ONU por graves violações de direitos humanos.
Se o Brasil esperava contar com um equilíbrio a adesão de um país em profunda crise social, como a Argentina, não compensa o peso de sauditas ou iranianos.
Todos os indicadores são claros: a repressão contra a oposição é a regra entre sauditas, chineses, egípcios ou etíopes. Nos últimos anos, qualquer debate sobre a posição da mulher, igualdade de gênero ou questões LGBTQI+ sofre a oposição dura justamente desses governos. Em diversos aspectos de direitos humanos, as denúncias se acumulam contra esses líderes.
Num discurso feito nesta quinta-feira durante a cúpula do Brics, o secretário-geral da ONU, António Guterres, mandou um recado duro e direto ao bloco e seus novos membros: todos os direitos humanos devem ser respeitados, inclusive os políticos. Uma mensagem dura para locais onde as eleições são ficções e a prisão de dissidentes uma constante.
A expansão, portanto, é a vitória da China, que sai fortalecida com um bloco de países com valores muito mais próximos aos dela que de democracias.
Ao agir no palco internacional, Pequim poderá convocar o Brics a sair em defesa de suas posições, agora contando com o respaldo de um importante número de países.
Para Brasil, barganha era reconhecimento da China sobre necessidade de expandir Conselho da ONU
Para o governo do Brasil, a expansão pode servir como instrumento para manter seu sonho de adesão ao Conselho de Segurança da ONU. Na visão dos artífices da política externa brasileira, a China deu pela primeira vez um passo na direção do reconhecimento da adesão de novos membros do órgão máximo da ONU. "O gigante se mexeu", comemorou um diplomata.
Pequim resistia a qualquer referência à adesão da Índia, seu rival regional. Agora, na declaração final, foi mencionada a aspiração legítima" desses países por uma vaga no Conselho.
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JAMIL CHADE
Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente.
Quero receberAlém disso, a cúpula do Itamaraty também considera que o Brics jamais foi criado com o propósito de coordenar posições em temas sobre democracia e que a agenda da aliança não tem essa lógica.
Mas, mesmo assim, uma ala mais resistente no Itamaraty estima que, ao ceder ao "trator da China", a agenda de direitos humanos, democracia e igualdade de gênero do governo de Luiz Inácio Lula da Silva foi colocada numa encruzilhada e num dilema existencial. Caberá ao governo provar que a expansão não significará um desvio de seus princípios.
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