Na Amazônia, França quer garantir influência geopolítica na América do Sul
Nesta semana, quando o presidente da França, Emmanuel Macron, declarou que iria solicitar ao Brasil que seu país formasse parte do Tratado de Cooperação Amazônica, em razão de seu território incluir a Guiana Francesa, tanto o Itamaraty como ambientalistas viram a iniciativa como populismo e um esforço de contornar a decisão do chefe de Estado de não interromper suas férias para ir à Cúpula da Amazônia, realizada pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
Apesar da fala pública, diante de embaixadores, Macron não entrou em contato com o governo brasileiro para fazer a solicitação ou encaminhar algum tipo de negociação.
Se o gesto gerou um mal-estar e foi interpretado como a forma encontrada pelo francês para contornar uma crise interna com ambientalistas, estrategistas e diplomatas confirmam que a França quer garantir uma presença política na América do Sul e na Amazônia.
Hoje, esses analistas admitem que a Guiana Francesa é o território mais estratégico da França e da Europa, fora do Velho Continente.
Com 84 mil km², dos quais 95% são de florestas, a região está a uma distância de 7 .000 quilômetros de Paris — mas conta com mais de 740 quilômetros de fronteira com o Brasil.
FHC e Chirac
De fato, a busca por fazer parte das decisões regionais não é um esforço novo por parte dos franceses. No final dos anos 1990, quando os presidentes Fernando Henrique Cardoso e Jacques Chirac (morto em 2019) inauguraram uma nova era de cooperação entre os dois países, a participação da França no Tratado regional já estava sobre a mesa.
A proposta da França era a de promover um reaparelhamento da Polícia Federal no Brasil e uma aproximação na cooperação em segurança e defesa. Isso permitiria reforçar o combate ao crime organizado na fronteira entre o Amapá e a Guiana Francesa.
Mas a esperança de Paris era que, com esses acordos, fosse dado início a um processo que poderia levar a França a integrar o Tratado de Cooperação Amazônica, um instrumento criado ainda nos anos 1970 entre os países sul-americanos.
Chirac buscava até mesmo enquadrar a aproximação como parte de um simples "reencontro da família latina". Ignorando a diferença entre colônias e metrópoles, entre escravizados e senhores, Chirac insistia que Europa e América do Sul tinham "as mesmas raizes, os mesmos interesses, a mesma psicologia, a mesma visão do homem e a mesma cultura".
Essa adesão jamais ocorreu e a cooperação bilateral acabou avançando em outras áreas.
Clima, base espacial, presença militar
Para militares e estrategistas franceses, existem diferentes motivos para o interesse francês pela região e perder uma influência ou eventualmente o território teria um impacto irreparável em termos geopolíticos.
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JAMIL CHADE
Todo sábado, Jamil escreve sobre temas sociais para uma personalidade com base em sua carreira de correspondente.
Quero receberCom o debate climático dominando a agenda política internacional, a França quer usar o fato de controlar um território na Amazônia para justificar e chancelar sua posição no debate sobre o desmatamento.
Outro fator estratégico é Kourou, a base de lançamento de satélites e considerada como estratégica para assegurar uma vantagem competitiva para os europeus em programas espaciais. Com a concorrência chinesa nesse segmento, o Centro Espacial Kourou, na Guiana Francesa. se transformou num ativo de alto valor para Paris e para os europeus.
Também pesa o fato de que, a partir do território, a França consegue uma posição privilegiada tanto no Caribe como na América do Sul.
Não por acaso, a França mantém uma forte presença militar no local, que garante tanto a proteção do departamento, segurança de Kourou e preservam os interesses franceses na América do Sul.
Segundo militares, é em parte de Caiena, capital da Guiana, que os franceses captam informações e podem se antecipar a eventuais crises na região.
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