Jamil Chade

Jamil Chade

Siga nas redes
Só para assinantesAssine UOL
Opinião

Volto aos EUA para cobrir diretamente de NY as eleições em um país rachado

Desembarco hoje nos Estados Unidos. Pelos próximos meses e até 2025, esta coluna passará a ser escrita de Nova York, centro do poder, da criatividade, de desconcertantes contradições sociais, de diplomacia, de hipocrisia e de muita cultura.

Exatos 40 anos depois de minha primeira estadia nos EUA, volto para ser testemunha de um dos períodos mais fundamentais da história recente do país.

Uma encruzilhada de uma nação que ditou, nem sempre por instrumentos democráticos, as regras comportamentais, culturais, tecnológicas e econômicas para uma parcela da humanidade.

Venho para escutar, desconstruir clichês, tentar entender a complexidade de uma sociedade que passa, mais uma vez, por uma verdadeira batalha por sua alma. Uma potência sobre a qual paira a pergunta incômoda sobre sua decadência ou reinvenção.

Em novembro, um país rachado vai às urnas, sob a sombra de um complexo industrial da desinformação. Uma eleição marcada, entre outras coisas, por uma campanha que promete uma "deportação em massa" de pessoas que nunca foram de outra nação.

Não será a primeira vez que o país se olhará no espelho e terá de fazer perguntas difíceis. A história —e seus ecos— nos revelam a profundidade da opressão e desigualdade que mulheres, imigrantes, indígenas e afroamericanos escravizados viveram, antes de poderem ser considerados cidadãos.

Tampouco será a primeira vez que um grupo lutará por manter o que acredita ser o "American Way of Life".

Em 1948, por exemplo, o governador segregacionista da Carolina do Sul, Strom Thurmond, estava concorrendo à Presidência por um partido que lutava contra os direitos civis. Num discurso, ele alertou que o projeto de Harry Truman para proibir o linchamento e a discriminação na contratação de empregados "minaria o modo de vida americano". Foi ovacionado.

A história americana revela como profundas divisões, rancores e protestos moldaram esse país. Um Destino Manifesto que justificou um massacre de povos inteiros. Um país que, por séculos, construiu sua "grandeza" sob um apartheid explícito, transformado hoje em implícito.

Continua após a publicidade

Mas também um país da luta inspiradora por direitos. Um país de Martin Luther King e Rosa Parks, da genialidade de Nina Simone, Jasper Johns e tantos outros.

Nos próximos meses, o que está em jogo não é apenas a escolha de quem ocupará a Casa Branca. Mas o destino de políticas que podem afetar milhões de pessoas no Haiti, na Venezuela, na Palestina, na Ucrânia, em Cuba, no Sudão, na China e mesmo no Brasil.

Por giros inesperados da vida, será desse posto privilegiado de observação que também olharei para os desafios da ONU e sua burocratização da utopia. Uma entidade que, para muitos, está sob os escombros de Gaza.

O sistema multilateral criado em 1945 e com sede em Nova York já não é suficiente para dar respostas aos atuais desafios e para um mundo que viu seus eixos de poder migrarem. A pandemia acelerou a desconstrução de um mundo. Mas não há quem ouse decifrar o que virá em seu lugar.

A disputa pelo poder está em andamento em cada canto do planeta em ebulição. E esse movimento tem um capítulo fundamental aqui, nesta encruzilhada eleitoral e existencial nos EUA.

Welcome on board. A viagem promete ser fascinante.

Opinião

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL

Deixe seu comentário

Só para assinantes