Jamil Chade

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Brasileiros temem deportação nos EUA e se preparam para 'perder tudo'

No final de domingo, no norte de Manhattan, uma esquina era tomada por grupo de homens de gravata e bíblia na mão, chamando quem passava para um culto. Com uma caixa de som, um pastor pregava em espanhol, enquanto um segundo repetia em inglês e com o mesmo fervor o que o religioso dizia. "Se estás angustiado, entre em nosso templo. Jesus te acolhe", convocava.

A sala do culto, que um dia foi um cinema, estava lotada. Dominicanos, peruanos e equatorianos, além de colombianos, mexicanos e venezuelanos. Havia também um pequeno grupo de brasileiros.

Horas depois de o culto terminar, os EUA foram informados que Trump escolheu seu novo "czar da fronteira". Trata-se de Tom Homan. Ele já foi o responsável pelo Serviço de Imigração no primeiro governo Trump e causou uma polêmica por adotar uma estratégia de separar famílias e tirar crianças de seus pais.

Em sua nova função, Homan ganhou um mandato ainda maior. Além de fechar as fronteiras, será o responsável por iniciar a "maior deportação em massa" da história dos EUA e prometida por Trump durante toda a campanha presidencial.

As estimativas oficiais do governo americano indicam que existam mais de 4 milhões de mexicanos em situação irregular, 800 mil guatemaltecos e 700 mil salvadorenhos. No caso do Brasil, os dados apontam para a existência de 230 mil sem documentos ou visto.

Homan, em entrevistas, se apressou a dizer que não haverá "campo de concentração" para essas pessoas. Mas ele foi um dos colaboradores do Projeto 2025, criado pela ala ultra-radical dos republicanos e que deveria servir de programa de governo de Trump. Ainda que o então candidato insista que desconhecia a existência do projeto, 140 ex-conselheiros seus fizeram parte da iniciativa. Homan foi um deles.

Num dos comícios de Trump, o novo chefe das fronteiras anunciou: "Tenho uma mensagem aos milhões de estrangeiros ilegais que Joe Biden liberou em nosso país: podem começar a fazer suas malas".

Seu plano é o de intensificar batidas e operações em locais de trabalho para flagrar estrangeiros vivendo irregularmente no país.

E por isso mesmo a ofensiva desperta tanto medo. Ana Costa, uma brasileira de 62 anos, rezava para que seus parentes que estavam nos EUA não fossem deportados. "Tenho minha situação regularizada. Mas tenho três sobrinhos que estão sem papéis. Todos eles trabalham e estamos com muito medo", admitiu.

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Entre os imigrantes que vivem irregularmente, nenhum deles aceitou que a reportagem citasse seus nomes ou que fotos fossem feitas. "É muito arriscado", justificou um deles. Dois equatorianos revelaram que uma das estratégias que eles vêm adotando é a de pedir que seus respectivos patrões paguem por semana seus salários. "Estamos mandando tudo diretamente para Quito, não sabemos o dia de amanhã", lamentou um deles.

Rafael, um sergipano de 31 anos, também diz estar com medo. "Eu tenho dois empregos, mas não estou regularizado. É muita crueldade deportar quem está trabalhando", disse.

Segundo ele, a estratégia de sobrevivência é a de "não dar mole". Ou seja, pagar sempre a passagem de ônibus, não pular catraca, não se envolver em briga, estar em dia com todos os pagamentos de aluguel, não contrariar os vizinhos e evitar sair pela noite. "Não é o momento de chamar a atenção", contou.

Uma mulher que o acompanha completou: "temos de ser invisíveis".

Carlos, um mineiro que chegou há menos de três anos aos EUA, não disfarça seu ressentimento em relação aos brasileiros que votaram por Trump. "Conheço gente que chegou aqui de forma ilegal e deu um jeito de ser legalizado. Também conheço gente que forjou casamentos. Agora, votam por uma pessoa defende uma deportação", lamentou.

Para deixar o Brasil e conseguir entrar nos EUA, o mineiro vendeu tudo o que tinha e ainda fez dívidas com parentes. "Se eu for deportado, como farei para pagar?", questionou. "Estou me preparando para perder tudo o que tenho", disse.

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Pelos EUA, grupos de direitos humanos já começam a se organizar para sair em defesa de imigrantes. Uma delas é a American Civil Liberties Union, uma rede de 500 advogados que promete levar aos tribunais qualquer abuso que Trump possa cometer contra populações mais vulneráveis.

"A xenofobia e o racismo se tornariam as pedras fundamentais da política de imigração americana em um segundo governo Trump. É por isso que devemos começar a nos mobilizar com os governos locais e estaduais agora para proteger as comunidades de todo o país contra políticas extremas contra imigrantes", disse Naureen Shah, vice-diretora de assuntos governamentais da ACLU.

Na porta da igreja, ao final do culto, o medo já era evidente, apesar de Trump tomar posse apenas em dois meses. Numa rodinha de brasileiros, quando o tema da deportação surgiu, um deles interrompeu a conversa para alertar: "não vamos ficar falando disso na rua, gente".

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Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

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