Topo

Josmar Jozino

REPORTAGEM

Texto que relata acontecimentos, baseado em fatos e dados observados ou verificados diretamente pelo jornalista ou obtidos pelo acesso a fontes jornalísticas reconhecidas e confiáveis.

Medo e isolamento: A rotina de Paulo Cupertino no cárcere em São Paulo

Paulo Cupertino Matias, acusado de ter matado o ator de "Chiquititas" Rafael Monteiro - Reprodução/Instagram
Paulo Cupertino Matias, acusado de ter matado o ator de "Chiquititas" Rafael Monteiro Imagem: Reprodução/Instagram

Colunista do UOL

01/07/2022 04h00Atualizada em 01/07/2022 15h35

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Há 24 dias Paulo Matias Cupertino, 51, não sabe o que é um banho de sol. Ele está isolado no setor de inclusão da Penitenciária 1 de Presidente Venceslau, unidade localizada no oeste do estado, a 608 km da capital paulista, destinada a presos que estão no castigo ou ameaçados de morte.

Cupertino chegou à P-1 de Venceslau no último dia 7. O preso é acusado de ter matado o ator de "Chiquititas" Rafael Miguel, 22, e os pais do rapaz, porque era contra o namoro da filha com a vítima. O crime aconteceu em 9 de junho de 2019, no bairro de Pedreira, zona sul paulistana.

Assim que deu entrada no presídio, Cupertino foi levado direto para a inclusão. Ele está em regime de observação. Não pode sair da cela individual nem receber visitas. Também não tem acesso a jornal, revista, rádio e televisão. Fica incomunicável a maior parte do tempo.

O xadrez tem 10 metros quadrados. No alto da parede há uma pequena janela de ferro chamada pelos prisioneiros de "ventana". A porta é de ferro maciço e no meio dela existe uma pequena abertura, chamada de "guichê", por onde são servidas as refeições.

A cama é de concreto e fica no lado esquerdo. O presídio fornece um colchão. No canto direito está instalado o banheiro com vaso sanitário. Fontes da Coordenadoria dos Presídios da Região Oeste disseram, na condição de anonimato, que na inclusão o banho é frio.

O silêncio no corredor sombrio é quebrado três vezes por dia. Primeiro, às 7h, quando é servido o café. Depois, às 11h, durante o almoço. O jantar é oferecido pontualmente às 16h. Após esse horário dificilmente se ouve uma voz no setor da inclusão.

O nome da morte

O medo ronda diariamente a cabeça de Cupertino. Tudo por causa de um vizinho indesejável. Na inclusão existem cinco celas, mas apenas três estão ocupadas. Em uma delas está recolhido Marcos Paulo da Silva, 44, o temido Lúcifer.

Apontado como o "nome da morte" no sistema prisional paulista, Lúcifer disse em audiência judicial ter matado 48 inimigos dentro dos presídios estaduais. Ele é fundador da "Irmandade de Resgate do Cerol Fininho", uma das nove facções criminosas violentas criadas nas prisões paulistas.

Nem mesmo os presídios federais quiseram custodiar Lúcifer. Ele passou pelas Penitenciárias Federais de Porto Velho (RO), Campo Grande (MS) e Catanduvas (PR), mas foi mandado de volta para o estado de São Paulo, após receber o diagnóstico de "transtorno de personalidade antissocial".

Em São Paulo, o prisioneiro matava e arrancava as vísceras das vítimas. Ele ganhou o apelido após tatuar no corpo a inscrição "Lúcifer meu protetor" e imagens de demônio, tridentes, caveira e símbolos nazistas, como divulgou com exclusividade esta coluna na edição de 22 de outubro de 2020.

Papel e caneta

Não há notícias ainda de que Lúcifer tenha feito ameaças a Cupertino. As fontes, no entanto, revelaram que o recém-chegado, assim que pisou na P-1 de Venceslau, foi avisado que ficaria na inclusão e recebeu orientação para redobrar a cautela com o vizinho, mesmo estando ambos isolados.

A escrita é um dos poucos passatempos de Cupertino no cárcere. A conversa com funcionários é proibida. Porém, em certa ocasião, no horário do almoço, o presidiário pediu papel e caneta vermelha para um agente penitenciário e foi prontamente atendido.

A triste rotina atrás das grades não é novidade para Paulo Cupertino. Afinal, ele é matriculado há décadas no sistema prisional. O número é 98.313, um dos mais antigos, já que as matrículas atuais ultrapassam e longe a casa de 1 milhão.

Nos anos 1990, Cupertino chegou a ficar preso. Foi processado por furto, roubo e vadiagem. O que ele não poderia imaginar, mesmo sabendo da rotina no cárcere, é que seria filmado ao chegar na P-1 de Presidente Venceslau e que as imagens, divulgadas por emissoras de TV do país, correriam o mundo.

A Defensoria Pública do Estado de São Paulo entrou com representação na Justiça pedindo a abertura de procedimento para investigar o vazamento das imagens. Segundo defensores públicos, a divulgação do vídeo foi um crime grave e implicou em potencial risco à integridade e à segurança do preso.

Os defensores agora solicitam à Justiça a transferência de Cupertino para um CDP (Centro de Detenção Provisória) de Guarulhos, na Grande São Paulo, ou para a Penitenciária 2 de Tremembé, no Vale do paraíba, destinada a autores de crimes de grande repercussão.