Topo

Kennedy Alencar

OPINIÃO

Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

Putin age na Ucrânia como agiram Bush e Obama no Iraque, Líbia e Síria

Colunista do UOL

24/02/2022 13h28Atualizada em 24/02/2022 16h23

Receba os novos posts desta coluna no seu e-mail

Email inválido

Vladimir Putin age como George W. Bush e Barack Obama agiram no Iraque, Síria e Líbia. A Rússia usa a mesma desculpa dos EUA para atuar como polícia do mundo: o interesse nacional, no caso, a defesa do seu território contra uma ameaça externa (terroristas, como apontou Washington, ou um cerco da Otan, como argumenta Moscou).

Nesse contexto, há um alto grau de hipocrisia em jogar somente na conta de Putin a responsabilidade pela eclosão da guerra na Ucrânia. Autocrata, o presidente russo não é flor que se cheire.

O uso da força sempre deve ser condenado nas relações internacionais, mas as razões da guerra remontam a uma escalada de movimentos da Otan (Organização do Tratado do Atlântico Norte) tanto quanto a uma estratégia russa de afirmação geopolítica num século em que EUA e China replicam a bipolaridade pós-Segunda Guerra Mundial entre Washington e Moscou.

Nas últimas três décadas, mais de uma dezena de países se filiou à aliança militar ocidental, que foi criada em 1949 no contexto da Guerra Fria entre EUA e a então União Soviética.

Mapa Ucrania - Arte/ UOL - Arte/ UOL
Imagem: Arte/ UOL

A expansão da Otan no Leste Europeu sempre foi uma pedra no sapato da Rússia. Em 2014, com forte apoio dos EUA, houve uma revolução na Ucrânia que virou o jogo de poder interno: caiu um governo pró-Moscou e subiu ao poder um grupo interessado em se aproximar mais da União Europeia e ingressar na Otan. Seria muita ingenuidade imaginar que Putin assistiria a um ingresso da Ucrânia na Otan sem uma forte reação.

Quando invadiram o Iraque, Líbia e Síria, os Estados Unidos ignoraram a ONU (Organização das Nações Unidas). Ora, a Rússia, maior país em extensão territorial do planeta e uma potência nuclear, considera legítimo imitar os americanos e usar o porrete em vez da diplomacia nas relações internacionais.

Portanto, vilanizar Putin, como fazem parcelas da imprensa brasileira, americana e europeia, não vai ajudar ninguém a entender e/ou solucionar a crise na Ucrânia. Tampouco contribui retratar Putin como um novo Adolf Hitler. A bem da verdade, neonazistas existem e são bem aceitos na Ucrânia.

Uma solução que levasse a Ucrânia a ser militarmente neutra seria a ideal e a justa para a atual crise. A autodeterminação dos povos é um princípio do direito internacional que deve ser respeitado, mas os EUA e a Europa fazem jogo político com a Ucrânia da mesma forma que a Rússia. A autodeterminação dos povos sempre encontrou um limite na força das superpotências.

Em 1999, a Otan interveio no Kosovo para frear o exército sérvio. Com incentivo do governo Bill Clinton, houve uma rápida intervenção que levou Slobodan Milosevic à queda no ano seguinte. Com a Rússia, a conversa é outra. O poderio militar de Moscou não recomenda uma escalada bélica da parte da Otan.

Nos próximos dias, deveremos assistir a um avanço russo no território ucraniano e uma situação consumada. Putin deverá levar essa, como os EUA levaram em ações militares semelhantes. Não há mocinhos e vilões nesse conflito no Leste Europeu.