Nem Lula, nem Tarcísio: políticos precisam se acostumar com autonomia do BC
A lei da autonomia do Banco Central foi aprovada em 10 de fevereiro de 2021. É recente para a experiência democrática, mas já tem mais de três anos. Os políticos, no entanto, demonstram extrema dificuldade para se acostumar com ela.
No dia em que se inicia mais uma reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), o presidente Luiz Inácio Lula da Silva reclamou que o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas, tem mais influência do que ele sobre o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, e, na sua visão, na política de juros do país.
"É preciso saber a quem o Campos Neto está submetido", disse Lula.
O presidente está se antecipando à decisão do Copom, que vai ser tomada amanhã, e que, provavelmente, não será do seu agrado. A maioria dos consultores e dos economistas acredita que o comitê vai interromper o ciclo de queda de juros e Lula já achou o seu culpado, como discutimos aqui na coluna ontem.
O presidente está aproveitando um erro de Campos Neto, que participou de um jantar oferecido em homenagem a ele pelo governador Tarcísio de Freitas no Palácio dos Bandeirantes.
O evento se tornou político, já que Tarcísio é cotado para ser candidato à Presidência em 2026, e Campos Neto poderia ser seu ministro da Fazenda. Ou então ir para o governo de São Paulo quando sair do Banco Central em dezembro.
Já diz o ditado que "à mulher de César não basta ser honesta, tem que parecer honesta". Vale lembrar, no entanto, que Campos Neto subiu os juros durante o ano em que Jair Bolsonaro tentava se reeleger.
Lula também comparou Campos Neto a Sergio Moro. Afinal, o ex-juiz deixou a toga para se tornar ministro da Justiça de Bolsonaro - um erro político que arranhou ainda mais a credibilidade da Operação Lava Jato.
O que Lula não diz, no entanto, são os motivos pelos quais o mercado acredita que os juros vão parar de cair. Da mesma forma que não falava da corrupção na Petrobras quando criticava Moro.
Os juros vão interromper o ciclo de queda por conta do cenário externo desfavorável, com taxas mais altas nos Estados Unidos, que atraem capital para lá. Mas, principalmente, por causa da falta de credibilidade das políticas fiscal e monetária do país.
O arcabouço fiscal do ministro da Fazenda, Fernando Haddad, está em xeque porque o governo Lula nunca quis cortar gastos. O mercado se deu conta que não dá mais só para aumentar receitas. O dólar está nas alturas. Na segunda-feira, o presidente finalmente deu aval para a ministra do Planejamento, Simone Tebet, apresentar um cardápio de corte de gastos.
Mas é mais fácil achar culpados do que assumir a responsabilidade. O BC hoje tem autonomia e toma decisões de maneira autônoma. Os políticos - e até os presidentes da República - vão ter que se acostumar com isso.
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