Moraes ataca 'lobby e conivência de big techs' em tese para USP
Em tese para o concurso de professor titular da USP, o ministro Alexandre de Moraes, do Supremo Tribunal Federal, disseca o que chama de "novo populismo digital extremista", sem poupar críticas ferozes ao "lobby intenso" e à "conivência passiva" das grandes plataformas, as big techs.
"Os provedores das redes sociais e dos serviços de mensageria privada, buscando o lucro, nada fizeram para impedir sua própria instrumentalização", aponta ele. "Pelo contrário, beneficiaram-se dos discursos de ódio e antidemocráticos, inclusive, criando mecanismos de monetização, pois a substituição da 'razão' pela 'emoção' significou exponencial aumento de audiência e interações, com forte e crescente reflexo econômico."
O documento obtido pela coluna tem 298 páginas e foi apresentado nesta quarta-feira (28). Moraes é candidato único da cadeira. A banca para exame da tese deve ocorrer ainda no primeiro semestre de 2024.
Formado pela Faculdade de Direito da USP, também conhecida como São Francisco, ele é professor associado na instituição e busca agora ascender ao topo da carreira docente, que é a cadeira de professor titular. A banca que o examinará será composta pelo ex-ministro Celso Lafer, os professores titulares de direito Ana Paula Barcellos, da Universidade Estadual do Rio de Janeiro, Flávio Yarshell, da USP, que já foi juiz do Tribunal Regional Eleitoral de São Paulo, o espanhol Carlos Vidal e a cientista política Marta Arretche, também titular da USP.
O ministro escreve que "a criminosa instrumentalização das redes sociais e serviços de mensageria privada" levou a "uma verdadeira 'lavagem cerebral' em diversos segmentos da sociedade", com conclusões falsas, tendenciosas, induzindo e instigando o discurso de ódio, o antagonismo, a dissidência, o descrédito às instituições e a corrosão da democracia".
Segundo Moraes, o processo se estendeu por mais de uma década, "sem que as big techs se importassem com algo mais do que os lucros crescentes e exorbitantes e sem que o Legislativo providenciasse a necessária regulamentação existente para todos os demais meios de comunicação social".
No ano passado, o Congresso debateu um projeto de lei para combater fake news que tinha apoio de Moraes e do governo Lula. Parlamentares bolsonaristas aliados a representantes das big techs conseguiram impor sucessivas derrotas durante a tramitação, e o texto acabou rejeitado na Câmara dos Deputados. Novas versões foram elaboradas, mas ainda não foram pautadas.
Para Moraes, "a extensão, o nível e a complexidade de regulamentação legislativa estão sujeitos a intensos lobbies das big techs e poderosos interesses econômicos, escondidos sob o falso manto de que muitas restrições não seriam tecnicamente passíveis de implementação, o que não corresponde à verdade".
Após repassar alguns dos principais fatos da eleição de 2022 e a atuação do Tribunal Superior Eleitoral, que ele preside, Moraes faz um apelo pacifista na sua conclusão.
"A democracia somente se constrói, se solidifica, prospera e fortalece uma nação quando a discussão de ideias é mais importante que a imposição obtusa de obsessões, quando as ofensas e discriminações cedem lugar ao diálogo e temperança, quando o ódio perde seu lugar no coração das pessoas para a esperança, respeito e união", sustenta.
O ministro, conhecido pelo enfrentamento ao bolsonarismo, então cita Martin Luther King, o ícone norte-americano da luta antirracista, que embora tenha sido preso 29 vezes ao longo de sua vida, pregava e praticava o pacifismo para enfrentar a discriminação contra negros nos Estados Unidos e no mundo.
"A atividade política deve ser realizada sem ódio, sem discriminação e sem violência. A consequência do ódio e da violência é o 'vazio e a mágoa', como alertou Martin Luther King em seu famoso discurso 'O nascimento de uma nova nação', proferido em Montgomery, em abril de 1957, e festejando que 'a consequência da não violência é a criação de uma comunidade querida. A consequência da não violência é a redenção. A consequência da não violência é a reconciliação'", diz Alexandre de Moraes.
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