Wálter Maierovitch

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Opinião

A 'grilagem' de Israel na Cisjordânia ajuda Netanyahu a se manter no poder

Estava na cara que a política "grileira", expansionista e imperialista de matriz colonial do primeiro-ministro Benjamin Netanyahu na Cisjordânia iria levar, num momento de instabilidade, a um conflito grave, com risco de uma Terceira Intifada.

O que não estava na cara: os supremacistas israelenses do partido Otzma Yehudit (Poder Hebraico) e aliados aproveitam o conflito entre Israel e Hamas para expulsar, da região fértil para as áreas áridas, os colonos palestinos da Cisjordânia.

Como se nota, o ex-ministro bolsonarista Ricardo Salles não usou de originalidade na célebre reunião em que sugeriu a "abertura das porteiras" da Amazônia para um expansionismo predatório. Tudo de modo a aproveitar a "distração" da imprensa com outros temas.

À época, Salles usou de um vetusto método fascista, conhecido desde 23 de setembro de 1919, quando, na milanesa praça do Santo Sepulcro, Mussolini deu vida aos "fasci di combattimenti", pois a instabilidade gerava o caldo alimentador do fascismo.

Conflito na Cisjordânia

Os supremacistas israelenses, sob a liderança de Itamar Ben-Gvir, do partido radical direitista Poder Hebraico, estão em confronto com os colonos palestinos, que resistem, também armados, às provocações e à grilagem.

Os religiosos ortodoxos, sustentados pelo Estado de Israel, oferecem o suporte de fancaria aos do partido ultradireitista. Falam da Israel bíblica para sustentar a legitimidade das terras da Cisjordânia — que os professores de geografia e a imprensa europeia chamam de West Bank, ou seja, o oeste geográfico, a partir do rio Jordão.

Atenção: para aumentar o interesse dos israelenses e expandir os assentamentos, o governo de Netanyahu oferta casas, linha de crédito agrícola e baixos tributos.

Quando Israel ocupou parte da Cisjordânia — na histórica Guerra dos Seis Dias (1967) e ao reagir aos ataques das forças armadas de Egito, Jordânia e Síria —, foram instalados 40 assentamentos. Passados dez anos, o número subiu para 210.

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Hoje, são cerca de 630 mil israelenses assentados na região da Cisjordânia.

Não há razão para se gastar tinta para demonstrar a violação por parte de Israel à Convenção de Genebra de 49.

Basta ler o seu artigo 49, parágrafo 6º: "A potência ocupante não poderá proceder à deportação ou transferência de uma parte da sua população civil ao território ocupado".

Segundo estimativa das Nações Unidas, os colonos israelenses eram 5 mil no ano de 1967. No final dos anos 90, o número chegou a 55 mil.

Hoje, há cerca de 630 mil israelenses assentados na região da Cisjordânia.

O movimento grileiro

Gush Emunim é o grupo de ação responsável pelo expansionismo. Trata-se de um nome de fachada, de fantasia.

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Apoiados pelo partido Poder Hebraico, e com participação na linha de frente da grilagem do rabino Zvi Yehuda Kook, oráculo da tese da restauração da "Israel Bíblica", exploram a fragilidade da ANP (Autoridade Nacional Palestina), sediada em Ramallah — e corrompida para muitos líderes do Hamas.

A ANP sob a presidência do impopular Mahmoud Abbas, conhecido pelos palestinos como Abu Mazen, está economicamente quebrada. E os colonos palestinos não recebem proteção das forças de ordem palestinas.

Com os soldos atrasados, os policiais concentram as suas ações na repressão a membros do Hamas infiltrados na Cisjordânia.

No particular, os objetivos repressivos de Abbas e do partido Fatah coincidem com os de Israel, todos preocupados com o Hamas.

A estratégia do premiê de Israel

Netanyahu usa do fato consumado, ou seja, colonos israelenses assentados e bem instalados, para disfarçar a real política de anexação da área fértil, com água.

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É de clareza solar que Netanyahu — e basta atentar aos seus 15 anos de poder — não tem nenhum interesse na fórmula da ONU, repetida pelo acordo de Oslo de 1993, de "dois estados para dois povos".

O jornal israelense Haaretz, fundado em 1919 e de oposição a Netanyahu, destaca a provocação da ultradireita aos colonos palestinos. Alerta que eles estão tendo dificuldade para deixar as suas casas para a colheita da azeitona.

Atenção. Netanyahu é um populista de direita. Sabe-se que a ultradireita e os religiosos ortodoxos, nacionalistas, representam o fiel da balança no Parlamento de Israel. Em outras palavras, sem eles, Netanyahu não tem maioria para continuar como premiê.

Duas frentes de conflitos — em Gaza e na Cisjordânia — poderão esticar a permanência de Netanyahu no poder. Mas, para a imagem internacional de Israel, é o pior que poderá acontecer.

A Convenção de Genebra

Parte integrante do Direito das Gentes, conhecido também como Direito Internacional Público, a Convenção de Genebra de 1949 impõe deveres aos beligerantes.

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Israel tem, à luz do Direito das Gentes, deveres internacionais, pois foi o estado nacional vencedor na Guerra dos Seis Dias.

Em razão da guerra, Israel ocupou a atual Cisjordânia: alguns outros territórios já foram devolvidos, como o Sinai ao Egito.

O território não aceito de volta pela Jordânia diz respeito ao West Bank, denominado Cisjordânia — e não aceito pela Jordânia por considerá-lo território palestino, e não jordaniano.

A população atual da Cisjordânia gira em torno de 3,2 milhões de habitantes. A área é de 5.800 km², sem saída para o oceano e apenas banhada pelo mar Morto.

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Texto em que o autor apresenta e defende suas ideias e opiniões, a partir da interpretação de fatos e dados.

** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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