Wálter Maierovitch

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Opinião

Jeitinho de Lula para receber Putin traz risco de crime de responsabilidade

Lula tem interesse em receber o sanguinário presidente russo Vladimir Putin na reunião do G20, no mês de novembro próximo, na cidade do Rio de Janeiro.

Putin, por sua vez, precisa voltar a ter "brilhareco" internacional e faz de tudo para estar presente ao encontro do G20. Até para poder voltar a justificar a invasão da Ucrânia, por violar a soberania, garantida pela carta constitucional da ONU.

O complicador para Lula decorre de o Brasil —-pelo Tratado de Roma de 1978, reconhecido constitucionalmente e aprovado pelo Congresso Nacional — estar sujeito à jurisdição do TPI (Tribunal Penal Internacional), que determinou a prisão cautelar de Putin.

O motivo da custódia cautelar: crimes de guerra, com crianças ucranianas sequestradas pelas forças russas. As crianças foram retiradas à força do território ucraniano e continuam como reféns.

Numa espécie de jeitinho brasileiro, Lula buscou parecer de departamento burocrático das Nações Unidas a respeito de imunidade para chefes de Estado poderem comparecer a encontros internacionais. Não foi mencionado o nome de Putin, mas nem precisava. Lula já havia deixado claro que quer o russo no no G20.

A respeito de suspensão de ordem do TPI, bem como concessão de imunidade, não existe ainda nada de concreto nas Nações Unidas.

Putin, por cautela, não tem comparecido aos encontros em países sob jurisdição do TPI: a China não está. E órgãos burocráticos da ONU não podem conceder imunidades, no caso, restringindo o alcance de decisões de um Tribunal Internacional.

Em encontros internacionais, alguns ditadores africanos com mandados de prisão expedidos pelo TPI compareceram e até posaram para fotografias oficiais. Pela baixa representatividade, eram ignorados. Com Putin, evidentemente, não vai dar para passar despercebido nem virar fantasma.

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Protesto na Polônia contra a guerra na Ucrânia, no aniversário de dois anos da invasão russa
Protesto na Polônia contra a guerra na Ucrânia, no aniversário de dois anos da invasão russa Imagem: Kacper Pempel - 24.fev.24/Reuters

Crime e impeachment

O certo é que Lula não poderá descumprir ordem do TPI. Seria, num exemplo alargado, o mesmo que descumprir ordem do STF (Supremo Tribunal Federal).

Em 18 de julho de 1998 e no final da Conferência das Nações Unidas, em sessão plenária, os estados-membros, por 120 votos a favor e 7 contrários, aprovaram a instituição do TPI, com sede em Haia e constituído por 18 juízes.

Atenção: o Brasil, representado pelo governo do presidente Fernando Henrique Cardoso, subscreveu o Tratado de Roma, naquele histórico dia.

Votaram contra e, portanto, não estão sujeitos à jurisdição os seguintes Estados: EUA, Israel, China, Índia, Filipinas, Turquia e Sri Lanka.

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O TPI conta com um independente Ministério Público que opinou favoravelmente à decretação da prisão cautelar de Putin.

Por evidente, Lula, como chefe de Estado e de governo, não têm poderes para cassar nem descumprir decisão do TPI. Caso conceda uma imunidade a Putin, incorrerá em crime de responsabilidade e ficará sujeito a impeachment.

Porta dos Fundos

A lembrar: no Tratado de Roma existe a possibilidade de o Estado-membro da ONU pedir a suspensão da jurisdição do TPI por sete anos. Isso se dá pela invocação da cláusula "opting out".

Até agora nenhum país invocou tal cláusula, embora a Rússia de Putin tenha alegado haver feito a comunicação e se sentir, segundo a sua chancelaria, totalmente desligada do TPI.

O TPI não aceitou a comunicação russa, até porque ela foi posterior ao decreto de prisão internacional de Putin.

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Lula em evento no Palácio do Planalto
Lula em evento no Palácio do Planalto Imagem: Pedro Ladeira - 28.mar.24/Folhapress

Lula e a arte de Procusto

Na mitologia grega, o ladrão Procusto roubava nas estradas de Ática, no início da noite. Ele levava as suas vítimas para um leito. Se a vítima fosse maior, cortava os seus membros e a cabeça até acomodar o corpo no leito da morte.

Caso a vítima fosse menor, era esticada e estraçalhada até as peças do seu corpo preencherem o referido leito da morte de Procusto, também conhecido por Damastes.

Com efeito. Nem com artes de Procusto, o presidente Lula poderá, no território brasileiro sob jurisdição do TPI, deixar de cumprir o mandado internacional de prisão cautelar de Putin

Opinião

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** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do UOL.

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